# A Rede Social

Caloni, 2010-12-03 mostra cinema movies [up] [copy]

O objetivo de Fincher, assim como em Clube da Luta, é destrinchar situações e pensamentos da sociedade moderna. Dessa vez, ele usou uma história real e contemporânea para falar sobre a digitalização de nossas amizades, e nada como usar como exemplo a história do próprio criador da maior rede social de todos os tempos: o Facebook, atualmente com mais de 500 milhões de participantes.

Ninguém como ele para compilar uma narrativa tão tensa e envolvente em uma história que é simples, mas que contém elementos de puro romance, ou pelo menos foram romantizados para o sucesso da narrativa como um todo.

Com o uso de um elenco afiado, a ação se desenrola com diálogos rápidos e, muitas vezes, descartáveis.

O diálogo inicial representa a rapidez com que temas são discutidos, muitas vezes mais de um ao mesmo tempo, e com que rapidez esses mesmos temas são trocados, um sinal dos devaneios típicos de quem usa a tecnologia no dia-a-dia.

Ele não percebe que seu amigo descobre que ele terminou com a namorada pois estava blogando desesperadamente naquela noite em que desenvolvia o Facematch.

Há um paralelo inicial entre dois cenários: o quarto dos hackers criando o Facematch e o prédio da irmandade exclusiva onde está ocorrendo uma das festas vip.

Esse paralelo também é usado durante todo o filme para ressaltar os pontos da história com o processo (processo aqui significa o jurídico) em desenvolvimento.

Adotando uma posição imparcial, mesmo que a maior parte do tempo seja focada na história do criador do saite, fica claro que o objetivo não é determinar quem está com a razão, mas sim em demonstrar como as relações sociais podem ser frágeis.

A situação da fama chega a ser tão ridícula que o próprio fato deles serem os criadores de um saite que permite que as pessoas se relacionem aparentemente vira um motivo para que eles tenham um ou mais fãs.

O tom do processo também tem seus momentos ridículos, como o detalhe de um trote envolvendo uma galinha ter ido parar nos autos de defesa .


# Megamente

Caloni, 2010-12-03 cinema movies [up] [copy]

Uma troca de papéis eficiente que faz repensar a dicotomia do bem contra o mal, ainda mais que hoje em dia, em que mais pessoas se livram das superstições antigas (religiões) que pregam essa dicotomia como algo inerente à existência, o filme transporta essa realidade para uma animação leve, mas que esconde algum drama mais complexo, quase que existencial.

Mas mais do que uma crise interna sobre um auto-aclamado vilão, o filme discute até mesmo a necessidade dos dois lados para que exista esse conflito eterno e a vida tenha mais graça para ambos os lados, e diferente de Meu Malvado Favorito, isso fica mais visível quando até mesmo o relacionamento herói-mocinha se converge para o lado do mal.

A caricatura de Marlon Brando é óbvia, engraçada e necessária em um filme que trata do caráter dos super-heróis e dos vilões, e não deixa de ser divertido que quem exatamente se disfarça dessa caricatura de mentor é o próprio Megamente, representante máximo da vilania.


# O Garoto de Liverpool

Caloni, 2010-12-03 cinema movies [up] [copy]

Na primeira cena temos apenas o primeiro acorde de "A Hard Day's Night", que nunca irá se completar, pois Nowhere Boy narra apenas a história do Beatle antes de efetivamente formar o grupo. Várias referências ao mundo Beatleniano, como Strawberry Fields, Walrus. Uma viagem em torno do relacionamento entre John Lennon e sua mãe, e o que levou com que sua personalidade fosse como é. Quer dizer, essa pelo menos é a teoria do filme de Sam Taylor-Johnson.


# Skyline - A Invasão

Caloni, 2010-12-03 cinema movies [up] [copy]

As histórias são profundas o suficiente para nos preocuparmos um pouquinho com o destino dos personagens (rapaz com acordo promissor com melhor amigo e sua mulher grávida, o amigo rico que é gente boa e sua esposa fiel e paciente, e a agente do amigo rico, o que faz com que ela seja a primeira a ser esmagada e nem nos darmos conta) e joviais o suficiente para não sentirmos muito pela perda de cada um deles (ou pelo menos por muito tempo).

Os efeitos, por sua vez, aparentemete limitados, são revelados na medida certa em que a situação se complica, e aos poucos a ameaça vai ocupando o seu posto de causador da história.

A trilha sonora impressiona em alguns momentos por estar nitidamente acima de tudo isso,conseguindo na maioria das vezes dramatizar sem ferir. O fraco do longa fica por conta do elenco limitado com papeis limitados, mas se assim não fosse nao teríamos o DNA de Independence Day, que, perto desse, vira um clássico.

Se os efeitos são eficazes justamente por serem descobertos aos poucos, o mesmo pode se dizer da própria história, que se fosse revelada de supetão soaria boba e superficial (além de figurar na categoria de obras de George Romero, com seus ETs e zumbis).


# Tron: Uma Odisséia Eletrônica

Caloni, 2010-12-04 cinema movies [up] [copy]

Mesmo assistindo hoje, 28 anos depois, Tron ainda parece um filme dedicado principalmente a vender vídeo-games.

Com sua narrativa inserida dentro de um ambiente de computação gráfica que reproduz na imaginação o que aconteceria dentro de um computador, e uma premissa bobinha de um protagonista injustiçado que tenta conseguir a prova que seu jogo foi copiado por um magnata dos game, a história possui bons momentos de ação, e chega a impressionar que esses bons momentos são feitos dentro de um ambiente hoje com sofríveis efeitos especiais.

De qualquer forma, o uso de preto e branco para a face dos participantes daquela simulação computacional, que de vez em quando é ofuscado como uma imagem de televisão que falha, é acertada, pois dá a exata impressão da instabilidade daquele mundo, onde blocos se formam e se "desformam" com uma velocidade impressionante.

Por outro lado, o próprio design de arte do ambiente "real" onde a primeira metade da história passa também remete para a construção de blocos e figuras geométricas. Não é à toa que o protagonista acessa o Master Control de cima de uma construção de tubos brancos que lembram alguma arte abstrata, ou que os corredores do império do mal são diagonais com tons de cinza. Até a cidade, no final do filme, se assemelha aos mesmos circuitos de computadores, em uma passagem rápida de tempo com os carros circulando.

Se houver alguma tentativa de traçar um paralelo entre os programas que são mostrados dentro do sistema e os seres humanos que lá estão fora, isso ficou bem óbvio.


# Enterrado vivo

Caloni, 2010-12-10 cinema movies [up] [copy]

O trabalho final em cima de um filme de um cenário só evoca uma trilha de suspense dos anos 60, além de ter seu design gráfico lembrando pequenos caixões que vão descendo a tela.

O início é óbvio: ouvimos apenas o som ofegante de uma pessoa, com a tela completamente escura, pelo tempo suficiente para não soar enfadonho. Diferente do protagonista, a câmera pode se mover à vontade, mas apenas dentro do limite do próprio caixão, o que contribui para a claustrofobia do espectador. Claramente com o intuito de conseguir variar o bastante para não tornar aborrecido um filme desses, a câmera por vezes se utiliza de ângulos inusitados, zooms diferentes, chegando a um travelling circular em volta do corpo do sujeito, passando atrás dos seus pés.

O final é apelativo, e igualmente óbvio. Ainda assim, a linguagem inovadora do seu criador merece créditos extras. As vantagens de produzir conteúdo independente.


# Tetro

Caloni, 2010-12-10 cinema movies [up] [copy]

O aspecto teatral do longa já é exibido em sua introdução, numa espécie de pôster suspenso, além do próprio P&B, evocando seu tom artístico e expressivo ao contar a história da família Tetrocini. A introdução é mais do que efetiva, pois em parcas quatro cenas já sabemos tudo que precisamos saber para aos poucos ir desvendando a relação passada da família do ponto de vista dos irmãos.

Com enquadramentos efetivos, em que não é necessário fazer o corte excessivo de diálogos. O P&B é límpido, dando a impressão de vazio, ao mesmo tempo de imensidão. Os acidentes são marca registrada da família, em que uma das mães morre em um acidente de carro e a outra fica em coma. Quando Benni reencontra o irmão, ele está com a perna engessada, e o próprio Benni ainda irá sofrer um acidente de carro.

O último trabalho de Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão) conclui sempre com uma música leve e contemplativa, e é mais uma vez seu tom teatral que transforma Tetro em uma conquista pelos diálogos e pelo artístico; nunca pelo seu universo ou personagens.


# A Sétima Alma

Caloni, 2010-12-14 cinema movies [up] [copy]

Aquela velha maldição que atordoa as pessoas de um vilarejo.

Esse terror dirigido/escrito por Wes Craven (A Hora do Pesadelo, Pânico, Além da Imaginação, etc, etc, etc) parte de uma maldição lançada sobre um grupo de garotos que nasceram no mesmo dia em que um serial killer de uma pequena cidade parou de realizar seus crimes. Com uma premissa bestinha típica de filmes adolescentes do gênero, Craven delineia um trabalho muitas vezes tenso e outras vezes clichê. Há uma ótima dinâmica entre irmãos e algumas reviravoltas especialmente inspiradas e sem as ressalvas de trabalhos similares que precisam diminuir a censura. Mesmo assim, a sensação do filme quando termina é de mais do mesmo, pois não há muitos momentos marcantes.

Talvez um filme para rever com calma depois de alguns anos.


# Aparecida: O Milagre

Caloni, 2010-12-19 cinema movies [up] [copy]

Tizuka Yamasaki está acostumada a realizar trabalhos "globais" como O Noviço Rebelde, Xuxa Requebra e... arght! Lua de Cristal. Seus quatro roteiristas, incluindo Paulo Halm e Carlos Gregório, desenvolvem histórias como Pequeno Dicionário Amoroso, Guerra de Canudos e arght! Se Eu Fosse Você (1 e 2!). Aparecida, A Revanche Católic... quer dizer, O Milagre, é um filme maniqueísta (como deve ser) e cafona (como esperado), mas inesperadamente bem conduzido, que tenta desviar ao máximo da narrativa vergonhosamente novelística e se focar na mensagem mais importante do projeto: milagres são possíveis e é por isso que nunca devemos desistir da vida.

A trilha sonora, especialmente a de abertura e de fechamento (Ave Maria), são um grande ponto a favor, pois a despeito de ser usado em duas de três produções atuais, nessa em específico participa de uma forma folclórica na história, contemplativa. Indo pelo mesmo caminho, as imagens da Basílica de São Pedro são evocativas de uma época mais ingênua, além de servir de ótimo gancho turístico. Não se pode dizer o mesmo do playback do filme, que está em péssimas condições, parecendo uma dublagem do som dos próprios atores, além da interpretação do filho de Marcos.


# A Ilha dos Mortos

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Em uma introdução ultra-rápida em off temos o cenário e o resumo do que irá acontecer durante o filme inteiro, em uma síntese cuja forma também será usada por toda a história, mostrando a segurança de Romero em estabelecer as ligações primordiais e avançar ideologicamente em pontos mais aprofundados do tema "mortos-vivos".

Notamos que a voz em off, do protagonista, é onisciente, pois ele narra sobre o patriarca de uma família que mora numa ilha governada e rivalizada por duas famílias tradicionais, mas faz isso antes mesmo de conhecer o sujeito. Por outro lado, nessa primeira "invasão" à ilha, vemos esse patriarca com outros olhos, como uma pessoa enlouquecida, coisa que esqueceremos depois, quando o vermos mais pra frente no filme.

A trilha sonora, típica de terror e filmes fantásticos, segue precisamente as cenas de espanto, assim como os closes, zooms e outros artifícios forjados para dar a impressão certeira de um representante digno da categoria trash; e até poderia ser, se o pano de fundo e a narrativa não fossem extremamente eficientes e vermos que tudo aquilo já faz parte daquele mundo criado por Romero, um gigante nessas alegorias.

Essas duas famílias rivalizam exatamente o que fazer com os mortos-vivos. A primeira família acha que devemos matar a todos, e matam novamente os mortos. A segunda acredita que devemos manter os mortos presos até acharmos uma solução para o dilema deles quererem comer os humanos vivos. Esses lados convivem na ilha, e tudo é mostrado com um certo tom épico e bíblico no começo, como se existisse uma filosofia profunda e bem articulada de ambos os lados.

Por outro lado, a moral é logo deflagrada como algo ultrapassado. Com uma lésbica se masturbando na frente de homens de um exército desertor, e outras cenas ainda mais chocantes e hilárias, somos enviados a um universo de humanos, sim, mas que se comportam de maneira um pouco menos equilibrada.

"Tempos nojentos geram pessoas nojentas". Essa frase, dita pelo componente mais jovem do grupo, parece sintetizar bem sobre o que o filme tenta falar. O ser humano aqui não é valorizado; nem os vivos, e nem depois de mortos. No mundo de Romero, apenas o ambiente dá conta de criar uma pseudo-moral que será usada pelos habitantes daquele mundo medonho em que as pessoas dão tiros umas nas outras como uma coisa normal, e onde, apesar de não parecer valer mais nada, o dinheiro ainda é cobiçado como um grande tesouro.

Existem cenas absurdas que fazem rir ao mesmo tempo que participamos de cenas nojentas. Quando o protagonista joga uma granada em uma casa, por exemplo, vemos o recorte exato do que ele quis nos mostrar sendo aberto pela "granada", de forma que o ambiente se transforma, mais uma vez, a la trash, para que ele tenha também uma função: tornar aquela realidade absurda o suficiente para não levarmos tão a sério, mas verossímil ainda para podermos nos concentrar na linha de raciocínio que as pessoas ainda vivas no filme tentam usar para viver.

Outra cena absurda: entregando a dinamite na mão de um morto-vivo, e voltando a fechar a porta, quando na próxima cena vemos o morto analisando o que acabou de ganhar, cujo pavio é consumido e no timing exato tudo explode e os corpos voam.

Aliás, o timing das cenas é completamente dominado, uma vez que cenário e mortos-vivos contribuem ativamente para a "montagem" dos quadros, em uma sucessão de tiros e ataques que são tão bem orquestrados que divertem pelo simples fato de acontecerem, e não nos sentimos enojados ou entediados, porque nos interessamos pela inventividade e criatividade das cenas (além delas serem muito engraçadas).

O filme, assim, se torna extremamente divertido e cativante, sem se tornar ruim (apesar de seguir a linha trash). Mas isso só é possível graças à nossa inserção nesse contexto fantasioso desde o começo, como é explicado na introdução e fortalecido nas cenas posteriores.

Os mortos, por exemplo, estão sempre disponíveis para aparecerem como alvos das armas mais bizarras e criativas já criadas para matar um morto (como uma salsicha em um garfo).

Em outros momentos vemos a tensão de uma cena crescer exponencialmente, como quando o garoto vai buscar água para acordar o capitão que acabou de desmaiar.

Seriam as irmãs gêmeas um deus ex-machina? Provavelmente não, pois essa parte da descrição inicial pode muito bem ter sido propositadamente deixado de lado.

Os zumbis de Romero são sempre muito divertidos, previsíveis e orquestrados. Ele se sente sempre à vontade para fazer as cenas mais batidas, só que com um ar de sofisticação que dificilmente outros diretores conseguem, como, por exemplo, quando o patriarca usa uma morta-viva como escudo para se aproximar do inimigo.

Nas cenas finais temos mais exemplos dessa inventividade com uma chuva de maneiras diferentes e criativas de como os zumbis vão morrendo.

A moral mais uma vez é criticada e esmagada nas cenas finais, em que o inimigo não dá nem um segundo para o patriarca falar com a filha, o matando assim que ele dá as costas, ou com o próprio patriarca matando sua filha sem dó nem piedade, pelo simples prazer de provar que seria capaz dessa "proeza", notando que ainda tinha uma bala em sua arma.

O final não poderia ser mais irônico, pois o mesmo patriarca que nos parecia enlouquecido no início e que, graças à publicidade na internet, pareceu-nos mais simpático no meio pro final, agora, depois de matar a filha, volta a ser o cara doentio que havíamos visto no início, e, nós sabendo que agora existe uma maneira de alimentar os zumbis sem que seja com carne humana torna os objetivos da família inimiga mais louváveis e até justificáveis, fazendo descaradamente com que troquemos de lado mais uma vez em prol da família inimiga. No fundo a conclusão, genial e imbatível, é que não importa o lado que estamos, pois sempre haverão lados que erguerão bandeiras, e mais pra frente suas causas são esquecidas, e tudo o que resta é "brigar pela bandeira", em uma outra síntese alegórica perfeita sobre a guerra no Iraque.


# Concorrência Desleal

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Mais um filme político de Scola. Dessa vez o foco da história é a concorrência entre um alfaiate e um lojista, que dividem a fachada de suas lojas e suas casas, a amizade de seus filhos menores e um romance entre seu filho e sua filha maiores. Possuem muitas coisas em comum, menos uma: uma família é de judeus; a outra, não.

É com esse pano de fundo bem arquitetado que o filme vai mostrar, gradativamente, o que o regime fascista na Itália fez com as pessoas, com os pensamentos, com uma simples rua de uma simples vila se transformar de forma radical por um "bem" que ninguém conhecia, mas muitos criticavam.

O início do diretor se dá com um econômico travelling que parte da loja de tecidos e vai até o quarto da fachada de sua casa, uma maneira que torna nossa invasão à privacidade dessa família mais natural.

É impressionante também notar que cada trilha sonora é encaixada perfeitamente em uma cena, nunca soando demais, nunca perdendo a beleza da cena e dos magníficos enquadramentos de Scola, que consegue sempre criar quadros de suas tomadas, seguidos por toques simples que remetem à nostalgia e tristeza que são sentidas daquela época.

Note como quando o rapaz lê o bilhete de sua amada na banheira a música que ela toca no concerto vem à mente dele e do espectador, um detalhe que faz parte do emaranhado planejado pelo diretor para nos fazer sentir realmente a história em todas as nuances.

A criança desenha caricaturas dos personagens conforme a história passa, e de fato universaliza a situação que aquele pedaço da Itália está passando para todo o mundo, com seus personagens e tudo mais. A forma como é contado esse desenho (sempre que somos apresentados a um personagem, já existe o corte seco para a criança desenhando).

Enquadramento de toda família na festa de 80 anos da vó.

Sequência da moça descendo a escadaria para beijar o amado na parte de fora, sem cortes, para demonstrar um breve momento.

Detalhes aos poucos são mencionados ou simplesmente mostrados, como a placa que proíbe falar de política, ou a confiscação do rádio dos judeus, e até o repúdio aos estrangeirismos. Aliás, existe uma belíssima cena sobre uma moça que vai à loja comprar um tecido e é mal atendida pela funcionária, para depois ser bem recebida pelo dono. Emana um não-sei-o-quê de Schindler no dono da loja nesse momento e tantos outros antes do final do filme.

Note o belo enquadramento do interior da loja, no escuro, enquanto os dois irmãos visualizam a rua.

Quando os dois meninos são separados pela proibição de estudar judeus em escolas percebemos que a ponta que estavam construindo ficou inacabada, em uma clara referência à quebra da aliança entre os povos que se acomete nesse regime.

Mais que mostrar o lado repudiado, é interessante ver o lado "vencedor", como em frases "felizmente, somos católicos".

Scola sempre usa o melhor quadro para mostrar a ação. Em visita ao seu concorrente, a cena mostra ele frente à cama do ângulo da fachada. Para uma cena final em que ele se aproxima da janela, ele inverte o ângulo, para economizar a caminhada da visita até a janela.

Por fim, quando o quadro final está completo, com a despedida da família judia, o último quadro é de um menino no meio da rua, vestido com camisas listradas, olhando para o vazio: uma vez que você toma óleo de bacalhau junto com uma pessoa, ela se torna seu amigo para sempre.


# Fôlego

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Em um período mais inocente da minha vida de cinéfilo Kim Ki Duk estava entre os poucos dos meus diretores favoritos, em uma lista que hoje em dia está esparsa demais para fazer algum sentido. Mas o diretor coreano continua sendo para mim um exemplo de contar histórias para chamar a atenção do seu público, sempre utilizando o chamariz das situações bizarras que nos prende e nos impede de desgrudar os olhos da tela até o final do filme.

Escrevi a respeito de Fôlego em 2010, no primeiro semestre que estava começando a escrever sobre os filmes que assistia. Eram anotações em um caderninho que rabiscava durante a sessão, no Cine Belas Artes, em São Paulo. Depois eu repassava esses rabiscos em algo inteligível. Mas essa não é desculpa para minha inocência em desvendar um filme falando sobre símbolos e detalhes que devem ser vistos como um todo. O meu texto de 2010 é meramente um capricho, e um rabisco, que hoje não me serve mais para análise.

Fôlego é um filme sobre sobrevivência, pura e simples. A sobrevivência de um casamento, a sobrevivência de uma carreira, a sobrevivência da própria vida. Quando perdemos o sentido de nossas vidas as que estão em nossa volta perdem o sentido também. Temos esse condenado à pena capital que matou a mulher e duas filhas. É de se pensar se poderia haver algum motivo para esses assassinatos que pudesse fazer sentido à razão humana, e a própria proposta de suavizar o ato deste criminoso pode soar repulsiva para a maioria das pessoas.

Porém, Kim Ki Duk não está interessado na opinião do espectador nem em justificar as ações deste rapaz. Ele nunca está. Seu interesse é em encontrar um eco, uma resposta positiva, para o que essa pessoa está pensando, presa em um cubículo com outros presos que estão alheios à sua situação.

E para isso ele encontra uma esposa com marido e uma filha e cujo sentido da vida anda lhe faltando. O marido a trai e isso a deixou deprimida ou vice-versa. Ela acompanha o noticiário e vê que esse criminoso tentou acabar com sua própria vida antes do Estado cumprir com seu dever legal e tirá-la antes. Ele fica sem voz, e era apenas o que faltava para esses dois seres encontrarem semelhanças o suficiente para se envolverem.

Fôlego não deixa fácil desvendá-lo porque o espectador não deseja, no fundo, fazê-lo. Seria amoral demais encontrar sentido em um assassino de família. Uma esposa insatisfeita em busca de conexão com outra pessoa, com o seu passado, é algo mais mundano e fácil de se relacionar. O que está implícito nesse drama sensual vai se desdobrando conforme o marido também entra na mente de sua mulher, a entende, a perdoa.

Quantos filmes conseguem abordar temas tão delicados com tamanha propriedade? Quase nenhum. E por isso Kim Ki Duk continua na minha lista de favoritos. Ele é o diretor que faz temas impossíveis parecerem fáceis. Que o espectador não perceba isso de maneira consciente é mero detalhe.


# Meu Malvado Favorito

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Meu Malvado Favorito é um ótimo exemplo de filme que divide opiniões, assim como Transformers: de um lado as pessoas que veem claramente uma péssima construção de história em conjunto com péssimas sequências para esta história. De outro, as pessoas que enxergam seus méritos no projeto ou 1) por gostarem do argumento desde o início ou 2) por entenderem sua proposta de uma maneira menos... crítica?

O fato é que estou do lado dos que defendem a produção, pois, apesar de perceber a artificialidade em seu roteiro e a maneira capenga com que a história é desenvolvida, consigo me divertir com as inspiradíssimas piadas, mesmo que estas soem deslocadas do contexto geral. O que segue são minhas impressões à época da estreia nos cinemas.

No início percebemos uma certa plasticidade nos personagens e cenários, parecendo mais um jogo de videogame que um filme com movimentos próprios. Mas aos poucos vamos nos acostumando com esse estilo limitado de animação, em que a física não é muito realista.

A piada sobre o "Banco do Mal" (antigo Lehman Brothers) é datada, mas pode ser considerada sob vários ângulos, pois eles realizam empréstimos de um negócio geralmente sem futuro, e é curioso notar as estátuas segurando as colunas da entrada do banco, esmagando-as aos poucos.

Os flashbacks do protagonista e suas ideias imaginadas possuem um toque de humor negro, quando por exemplo ele imagina se livrar das meninas na montanha-russa.

Significativo que o raio encolhedor estava sendo desenvolvido no leste asiático, já que eles costumam "encolher" invenções tecnológicas do Ocidente.

As diferenças entre o Vetor e o protagonista se fazem sentir pelo estilo clássico e antiquado do último, conforme sua casa decorada com elementos ditos "malignos" (sofá de crocodilo, poltrona de rinoceronte, porta-casacos de cobra), detalhes démodé (carpete vermelho, maçaneta decorada das portas). O primeiro, por ser mais jovem, possui aquele estilo descolado e nerd de usar coisas com curvas mais suaves (repare a diferença no design de ambas as naves) e mais da moda (ele joga um videogame que se assemelha ao Wii).

O final, que termina com com todos dançando (inclusive seu vilão) lembra filmes no estilo "poderia ser um pouco melhor". Como Quem Quer ser Milionário?, por exemplo.


# Micmacs - Um Plano Complicado

Caloni, 2010-12-20 mostra cinema movies [up] [copy]

A fotografia fabulosa de Amélie Poulain também cabe nessa fábula em que um homem, Bazil (Dany Boon), sofre uma dupla injúria em sua vida: a morte do seu pai por uma mina terrestre e uma bala em sua cabeça durante um tiroteio. Então ele resolve se vingar de ambas com o mesmo plano.

Com os mesmos enquadramentos exagerados como em Amélie, mas sem a sua graça, Jean Pierre parece acreditar que o mesmo modelo pode servir a mais de um filme, e nesse caso parece acertar parcialmente. Digo parcialmente pois, enquanto em Amélie sua infância explique suas constantes fugas da realidade e seu caráter idealista, aqui o herói assume essas características sem possuir um passado que o justifique. Pior, ao ser adotado posteriormente por uma trupe de moradores de rua que parecem ter saído da mente criativa da protagonista do outro filme.

Embora ou por causa de nunca revelar a estratégia de Bazil por completo, a história torna-se fascinante pela criatividade com que é conduzida, nunca soando por demais exagerada, apesar de sempre estar no limite da ousadia, mas que recebe a bela explicação da trupe, circense na alma e sem muito o que perder na vida.

A capacidade do filme de entreter é tanta que até nos esquecemos do real objetivo do herói, o que pode soar preocupante pois existe drama em sua história. Só que em vez de drama o que vimos são exercícios de relaxamento quando ele, ansioso, parece perder a respiração, e que mais uma vez inevitavelmente relembram a figura idealista de Amélie Poulain, principalmente por estarem esses inseridos como mera curiosidade, sem conexão com o que está ocorrendo na tela.


# Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Este é o filme mais poderoso do diretor e roteirista Kim Ki Duk e ele é o único cineasta capaz de contar essa história sem resistir à tentação das respostas fáceis. Enquanto outros dos seus filmes -- Casa Vazia, Fôlego, Time, Pietá -- apresentam um conceito-chave que será explorado à exaustão até nos darmos por rendidos e aceitarmos aquele novo escopo de sentimentos, em "Primavera, Verão" não existe novidade, e o que nos prende durante e após o filme é a nossa tentativa fugaz de captar algum significado. Este é um filme simples, mas que você precisa interpretar. E no preciso momento em que o estiver vendo saberá do que se trata, mesmo que ninguém diga isso verbalmente. Palavras são inúteis frente a imagens poderosas. Simples, mas poderosas.

O diretor esbanja a qualidade indiscutível de narrar uma história mortal com eventos sobrenaturais de forma a prender a atenção do espectador na medida em que a simplicidade está sempre acima do sobrenatural, é o objetivo final, e o sobrenatural apenas o caminho pelo qual nossa percepção dos eventos será guiada. A pergunta de quem movimenta o barco para que o mestre possa observar seu pupilo vai perdendo sua força conforme a história avança, e quando descobrimos qual é o mecanismo ele não importa mais.

Nunca com pressa e sempre sem perder o timing, somos apresentados à dupla principal de mestre e pupilo de uma maneira quase contemplativa na primeira parte do longa (que é dividido em cinco partes, como é possível deduzir pelo título). No entanto, a identificação com esses personagens será vital para atravessarmos praticamente o resto de suas vidas em pulos de anos à frente, de maneira que não percamos o senso de continuidade, mesmo com tanto tempo sendo atravessado. É a identificação que nos permite continuar acompanhando uma história que se separa por décadas, e apenas a identificação do sofrimento humano que universaliza esta parábola sobre a existência.

Para isso, o diretor também se aproveita dos elementos comuns da história: a casa flutuante e toda a disposição dos "móveis" internos (o templo de oração e as camas, que possuem ocupantes distintos no verão e no outono), os portões do lago (que têm outra função importante: fazem o papel de cortinas que anunciam uma nova parte da história), o próprio barco que vem e vai (e esse fluxo é vital para que esse ritmo faça parte constante da narrativa).

Nada está à toa neste filme, e tudo, mesmo o mais mundano, como um totem que não deve ser usado como banco, possui uma função dupla: narrativa e simbólica. Essa foi a maneira do cineasta nos aproximar da filosofia budista, que não diz sobre algo específico deste mundo, mas do próprio mundo, de tudo que está nele, incluindo nós mesmos, tentando entender alguma coisa. Como espectadores não há presente melhor do que um filme que não se explica, tal como a vida, pois é da experiência de assisti-lo que encontramos a paz que nos falta em vida. É de sabermos que há alguém igualmente perdido e fascinado que entendemos que esta é uma vida de valores, que seguimos ou não, e para cada caminho há um diferente destino.


# Sem Medo: As Canções De Luciano Ligabue

Caloni, 2010-12-20 mostra cinema movies [up] [copy]

Esse é um documentário que, em um tom misto de atualidade e nostalgia, conta a história dos italianos pelos olhos de sua Constituição, criada após a Segunda Guerra, e como esses ideais foram (ou não) evoluindo na passagem das gerações.

Usando um cantor pop (o Luciano Ligabue do título) como identidade para cada parte da história, ouvimos a opinião de vários representantes da sociedade, de uma adolescente a um padre. Há pessoas, inclusive, que passaram por momentos que gostariam de não se lembrar, como uma filha que teve o pai assassinado por ser testemunha de um crime político na empresa que trabalhava.

O uso do cantor de carne e osso como elo entre a sociedade e a política não é por acaso. Como no diálogo de início das elucubrações políticas, depois de escritos os direitos dos italianos pós-guerra, o povo ativo foi aos poucos se tornando o público de um regime que cada vez mais se distanciava dos ideais da nação que acabava de renascer.

Podemos dizer que, por meio desse documentário, Baarìa faz mais sentido do ponto de vista contextual, pois tanto este quanto aquele representam a necessidade que esse país tem de revisitar o que aconteceu e o que acontece no cenário político-econômico do povo italiano, e ambos o fazem de uma maneira similar: com enxurradas de ideologias e imagens entrecortadas do cotidiano.

E o que isso representa para nós, brasileiros? Antes que uma forma de enxergar as diferenças entre nossos povos, essa visão vem mais a calhar para que vejamos muitas coincidências e semelhanças em nossos modos, principalmente no que diz respeito à política. Há uma hora, por exemplo, que um repórter pergunta, nas vésperas da Copa do Mundo, se o evento esportivo não representaria um risco do povo esquecer dos problemas que o país enfrenta.

Da mesma forma, quando vemos as pessoas aplaudindo a prisão de um conhecido mafioso enxergamos o que ocorre pros lados de cá quando um assassino que emerge da mídia é finalmente preso em consequência de seus atos e, mais importante, da pressão pública.

A semelhança acaba no momento que vemos que o engajamento político do cantor, que exibe texto da Constituição de seu país enquanto canta uma das músicas no Coliseu. Há muito tempo por aqui esse costume também era uma realidade. Perto da cena em que ele usa uma filmadora para gravar os fãs naquele momento é dito que o povo não liga pra mais nada a não ser "o grande irmão" (Big Brother Itália?).


# Sobre Café e Cigarros

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Esse é um filme extremamente deprimente, pelas características dos cenários, pela estática das cenas, pela conversinha dos personagens, pelo princípio que os personagens principais, de fato, são os nomes do título. Seguem minhas anotações quando o assisti na época que estudava para ser crítico:

  • Tanto é que em cada início e fim do curta vemos eles, o café e o cigarros, vistos de cima, como os que realmente importam e estão sempre presentes (as pessoas geralmente estão chegando e/ou se despedindo).
  • O próprio fato do filme ter sido feito em P&B e o café e o cigarro serem, por natureza, dessa cor, realça sua realidade, em detrimento aos personagens.
  • Uma mesa estilo xadrez e um ambiente decadente. Mais para frente vamos ver que os próprios detalhes do cenário se repetem (como a mesa xadrez), além dos diálogos e os próprios personagens.
  • Nesse ambiente as paredes estão arrebentadas e o clima é de loucura. Ambos os personagens tremem, por muito café, cigarro, ou ambos.
  • Vemos café claro (com leite) e escuro. Uma teoria maluca sobre o irmão gêmeo de Elvis Presley contada pelo garçom. Aliás, os garçons do filme são extremamente impertinentes (inclusive Bill Murray), o que mais uma vez demonstra a falta de personalidade dos personagens e sua repetição constante.
  • Um mexe o café do outro. A visão por cima permanece nessas cenas.
  • Um copia o estilo do outro.
  • Vemos uma expressão forçada e ansiosa de quem espera, mais uma repetição de personagem. Aliás, os próprios curtas forçam que os atores sejam breves e marcantes em suas interpretações.
  • Um oferece café, outro cigarro. Suas opiniões sobre o cigarro mudam rapidamente, uma vez que um encontra o alicerce no outro.
  • Um jeitão esquisito do músico/médico, repetido no membro do Wu-Tang Clan.
  • Os cigarros, apesar do usual, possuem, sim, marca: Camel, Malboro, etc.
  • A "força de vontade" é enfatizada muitas vezes, enquanto eles se entregam ao vício.
  • Há muitas contradições e absurdos nos personagens. Não só os desse curta.
  • Sombra na pessoa que reclama, luz na pessoa que se defende.
  • Uma relação pai/filho baseada no dinheiro para manter o segredo de fumante.
  • Revista de armas (relacionada ao resto?)
  • Garçom insistente e impertinente (mais uma vez).
  • Qual o significado geral da composição? Começamos a perceber uma certa ligação entre as histórias, ou entre o clima delas, ou algo maior.
  • O P&B, se não me engano, varia de esverdeado para o simples.
  • Não sabemos o objetivo das pessoas. Elas se encontram para não contar nada de mais (não há nada de errado com a minha vida, só queria ver você).
  • Talvez o "só queria ver você" fosse uma antropomorfização do café/cigarro, sendo que não há, de fato, um motivo para vê-los, mas os personagens os veem de qualquer jeito. Isso nos dá uma pista que talvez os personagens sejam todos assim.
  • Aos poucos percebemos que o nível das conversas é gritantemente raso, um small talk no pior dos gêneros. Tudo para que assistamos o café e o cigarro de camarote.
  • Na mesa, quase sempre há mais xícaras de café do que pessoas.
  • Talvez a mesa xadrez evoque o próprio cenário que presenciamos, P&B, das pessoas em volta.
  • Relação entre prima rica (e famosa) e prima pobre.
  • Mais uma vez garçom impertinente.
  • Molina interpretando ele mesmo e outro ator também interpretando ele mesmo.
  • No começo um dá as cartas, no final Molina ganha a atenção que queria (e a rejeita).
  • Um é visto como o astro da vez, tanto que uma fã, quando o descobre no recinto, apenas o vê, e não Molina.
  • O absurdo da situação é incrementado quando o outro ator até se esquece do nome completo do Molina.
  • As expressões dos atores diz tudo sobre essa relação, bem mais que os diálogos, que continuam fracos, mas possuem em sua essência exatamente aquilo que estamos vendo.
  • Dessa vez o chá toma o lugar do café.
  • Mais uma vez o músico/médico (e o garçom impertinente: Bill Murray!).
  • Mais uma vez são todos pessoas conhecidas no show business.
  • A mesma história de sonhar rápido contada no primeiro curta.
  • Bill Murray "se disfarçando" de garçom, é o que realmente fuma e bebe café compulsivamente.
  • As expressões e o diálogo ingênuo de um e as expressões e o diálogo lógico do outro contracenam mais uma vez, como um fechamento que une a primeira história.
  • A interpretação dos velhinhos é soberba, pois apenas com seu tom de voz, sua maneira de se mexer podemos perceber claramente a tristeza da situação, mas a alegria por trás disso.
  • A luz é mais escura que em todos os outros, e talvez isso realmente se compare com o primeiro curta, onde tudo é muito claro (luz forte na cara dos atores).
  • Vemos diálogos e ideias cruzadas de novo (Nikola Tesla e sua ideia da Terra ressonante e o almoço saudável).
  • No final, temos a sensação de algo muito deprimente. Talvez o efeito do filme como um todo seja de fato o efeito que o café e os cigarros fazem em nossa vida. Eles vão e vêm, passam despercebidos, mas possuem importantes mensagens de vida e morte.

# Três Homens em Conflito

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Esse faroeste de Leone foi narrado em um contexto histórico e, por isso mesmo, com muitas pitadas de realismo nas cenas, mesmo com os absurdos hilários a que estamos acostumados em filmes do gênero. Nesse longa de quase três horas de duração teremos três pistoleiros decididos a encontrar uma fortuna escondida, mas para isso terão que passar por várias provações na época da guerra da Sessesão.

Uma característica marcante e que nos torna ainda mais cúmplices das peripécias dos personagens é o ângulo e a forma como a câmera se posiciona em cada cena. Fora os enquadramentos magníficos na maior widescreen que o cinema já teve, exacerbados ainda mais pela belíssima fotografia do filme, que é belíssima exatamente por evocar imagens históricas. Leone faz questão que sintamos o ponto de vista dos personagens ou da situação em cada quadro, com uma continuidade que é sempre eficiente, pois nos coloca na posição privilegiada em que podemos ver a ação e ao mesmo tempo interpretá-la.

A trilha sonora principal de Morricone lembra a de um animal, que inclusive podemos ouvir nos minutos iniciais, o que comenta acertadamente o estilo cartunesco do longa. Note, por exemplo, como a apresentação dos personagens (no original, o filme se chama "O Bom, o Mau e o Feio") é feita congelando a tela com o ator e colocando seu "título", logo depois descongelando a mesma cena. Algo que Tarantino usou mais como homenagem e menos como plágio do diretor.

Há exemplos bem vivos desse estilo de quadrinhos, como em um movimento de câmera com ângulo subjetivo quando Tuco (Eli Wallach), um dos três personagens, chega à cidade e desmaiando. O desmaio é filmado pela câmera, e ela "fica tonta" e cai. Há exemplos também de posicionamento da câmera: quando vemos pela primeira vez Clint Eastwood, que aqui faz mais uma vez o papel do homem misterioso, , a câmera foca seu paletó, e não o seu rosto, pois é ali que está escondida a arma que entrará em ação nos próximos quadros. Mais um exemplo: quando Tuco cai na frente da delegacia, o próximo corte é feito de baixo pra cima, como se estivéssemos vendo do ponto de vista dele estirado no chão.

Fora o uso constante dos ângulos, há câmeras giratórias magníficas por todo o filme que fazem rima com a montagem que oscila entre o tenso e o cômico, sendo um dos primeiros o enforcamento, que passa pelo público que assiste enquanto ouvimos todos os crimes cometidos pelo condenado. Na montagem, a sequência que mostra os capangas subindo até o quarto de hotel onde está Clint, e ao mesmo tempo com cortes dele montando a arma cria tensão exatamente por não sabermos quando eles chegarão, e se dará tempo de montar a arma.

Uma segunda trilha, original e belíssima, é a da caminhada do deserto, pois ela evoca a passagem do tempo muito bem, e essa noção de enjoo e delírio. Os enquadramentos na cena do deserto, aliás, são todas excepcionais, com destaque para duas onde Clint está na frente e o bandido no cavalo atrás e, depois, uma em que o bandido está bebendo água na sombra do cavalo e vemos Clint andando atrás. Tudo sem perder a majestade do cenário que é o deserto, personagem sempre principal desse trecho.

Há outro belíssimo ângulo na cena do deserto quando vemos Clint descendo uma duna, desfalecido. A posição da câmera é bem baixa, para dar ideia do cansaço do personagem. Exemplo de câmera subjetiva: quando Tuco tenta acordar o amigo no hospital, a câmera que mostra sua face perde o foco levemente, sem corte, como se já sofresse a influência da visão de Clint, ainda desacordado.

E os diálogos, poucos, pois aqueles homens não são de falar muito, possuem momentos de bilhantismo singular, pois com poucas palavras resumem tudo que acabamos de ver. Quando Clint e Tuco tentam fingir serem do exército que se aproxima, Tuco exclama "Vamos nos dar bem, porque Deus odeia os ianques, também!", no que, quando Clint vê que foram enganados, e se tratava do outro exército, exclama "Não vamos não, porque Deus também odeia os idiotas".

A atuação de Tuco, então, é uma delícia à parte, pois suas expressões, exageradas, mas sinceras, demonstram um personagem que está exatamente de acordo com o que vemos na tela; na forma de se comportar e agir em todos os momentos, com sua ingenuidade e ignorância, mas também maldade e malícia. É o mais carismático dos personagens, sem dúvida, e alívio cômico ultra-eficiente em vários momentos do longa.

Os cenários seguem por todo o filme grandiosos. Pode-se dizer que qualquer momento podemos parar o filme e tem-se um quadro belíssimo, fenômeno que se repetirá no irretocável Era uma Vez no Oeste.

Exemplo de diálogo brilhante, além de alívio cômico: após ser ameaçado por um homem armado enquanto tomava banho em uma banheira de espuma, Tuco atira e mata o sujeito, dizendo em seguida "Se vai disparar, dispara, e não fala".

Também é muito bom notar que Leone dá bastante esmero aos detalhes. Logo após a cena da banheira, temos os dois amigos na rua. Tuco está vestido, mas ainda podemos ver algumas manchas de sabão em seu rosto.

A forma como são capturados em direção ao cemitério, e o enquadramento posterior, mostrando toda a grandiosidade do acampamento, espelha esse esmero com o posicionamento da câmera.

Há um realismo e grandiosíssimo na batalha da ponte que parece que somos transportados para aquele tempo, e o que estamos vendo são atores conhecidos no meio de um evento que realmente aconteceu.

Quando Tuco tenta encontrar o túmulo no cemitério há uma bela passagem de travelling sem foco pelas jazidas, enquanto logo após o cineasta coloca Tuco em foco e um travelling por todos os túmulos, rapidamente, em um movimento constante.

A cena do "trielo" (uma invenção para "duelo de três") é a mais tensa, antes mesmo de começar, pois já sabemos de antemão que os três atiram muito bem, como pudemos comprovar em mais de duas horas de filme.

Exemplo de diálogo brilhante: "Existem dois tipos de homens neste mundo meu amigo: Aqueles com armas carregadas e aqueles que cavam. Você cava..."

O enquadramento da forca, quando Tuco olha para cima, é hilária e simples, pois coloca a cabeça de Tuco já dentro da corda.


# Um Dia Muito Especial

Caloni, 2010-12-20 cinema movies [up] [copy]

Um drama de um relacionamento de um dia entre uma dona-de-casa e seu vizinho homossexual que mostra de diversas formas como a Itália fascista estava se transformando. O dia em questão calha com a visita de Hitler à Roma. O filme conta com Sophia Loren e Marcelo Mastroiana nos papéis principais, e é dirigido por Ecolla.

O filme inicia com um daqueles filmes políticos que passavam nos cinemas na época apresentando a visita de Hitler à Itália. Usando expressões que aos poucos denunciam o pensamento da sociedade da época, como a "majestosa simplicidade" com que o Fuher será recebido, ou a "doçura viril" de determinada pessoa, o prólogo em preto e branco nos dá a exata sensação do que seria viver naquela época, assistir filmes naquela época.

Há um corte brusco para o vermelho, uma bandeira nazista. A câmera sobe aos poucos mostrando mais bandeiras sendo hasteadas. No próximo corte temos uma câmera que entra dentro de uma das casas do condomínio, e através de uma arquitetadíssima e longa sequência somos apresentados à dona-de-casa que lá reside e vai acordando em cada cômodo a família. É como se fôssemos uma visita indiscreta a passear pela casa inteira.

Aos poucos o comportamento das pessoas reflete a mesma época que vimos no vídeo inicial, como críticas pesadas à masturbação ("você vai ficar cego assim") ou o uso de estrangeirismos.

O diretor gosta de navegar a câmera da forma mais eficiente possível, como na cena em que ele está no telefone e, durante a conversa, a câmera dá um giro por trás dele, denunciando ao fundo a mulher na janela do apartamento à frente, ou quanto em um diálogo na casa deste, a mulher fica à frente da câmera e ele está parado no fundo à esquerda; conforme ela se move para a direita a câmera segue e para do lado dela e de um espelho, que reflete a mesma imagem dele (talvez uma interessante rima com o fato dele ser homossexual).

O sobrenome da família é colocado como placa na frente na porta. Não sei se é um aspecto cultural ou, ao mesmo tempo uma influência do próprio fascismo. Uma prática semelhante é seguida na Japão, se não me engano.

É significativo que a hora que os dois se juntam, sobre o terraço, a câmera foque debaixo de um coberto, e eles estão contra a luz; portanto, no escuro para a câmera.

Por muitas vezes ouvimos diálogos memoráveis, bons demais para estarem na boca de pessoas comuns, mas considerando que a maioria deles são pronunciadas por Mastroiani entendemos sua cultua mais sofisticada: "Um bom homem deve ser pai, marido e soldado; eu não sou nem marido, nem pai, nem soldado", diz ele ao revelar sua homossexualidade.

O tapa que ela dá na face dele também é dado na mesma contraluz do terraço. E acompanhamos a descida pela escada deles por uma câmera de fora, que desliza pelos andares rapidamente.

Um corte preciso e orgânico; depois que ele prepara seu omelete, o vemos cortando no seu prato. Logo após esse corte o plano aumenta e vemos outro prato com outro omelete; ela está comendo ao seu lado.

A câmera sempre escolhe os melhores ângulos; quando ela avança a mão para cima dele na cena de sexo, por exemplo, a mão que faz isso é a que contém a aliança. Temos câmeras mostrando ele por baixo e ela por cima, com representações significativas de ambos, mais dele, pela sua experiência heterossexual.


# Pós-II Seminário Portabilidade e Performance

Caloni, 2010-12-21 ccppbr [up] [copy]

O nosso seminário da semana retrasada sobre portabilidade e performance teve um clima mais familiar, lembrando os antigos eventos. O tamanho menor da sala, aliado ao fato dos palestrantes não precisarem usar microfone, como foi da última vez, fez com que houvesse mais interação com o público, com destaque para minha própria palestra, onde tivemos um hiato significativo para falar sobre o desempenho da classe std::string e outros assuntos mais obscuros.

A ordem das palestras também ajudou muito a tecer os conteúdos individuais para algo maior e em comum, que eram os temas do seminário: se com Galuppo tivemos uma pitada do desenvolvimento concorrente, com Fernando conseguimos entender de uma maneira simples e didática como funcionam os recursos de sincronismo entre threads rodando em múltiplos cores, com uma pequena ajuda de um exemplo em C levado ao nível de assembly, onde foi possível acompanhar o que já havíamos aprendido com a palestra do Caloni.

Pra terminar, um apanhado de boas práticas e  a experiência de quem já mexeu muito com análise e desempenho no código: Rodrigo Strauss. Além das dicas e do bom humor costumeiros, tivemos uma pequena prévia do que poderemos ter em breve com o tema "C++ com outra linguagens".

Deixarei disponibilizado para download minha transparência, onde infelizmente não estão embutidos o áudio nem o vídeo do momento realmente importante,que foi a interação do grupo durante a apresentação. Se você perdeu, so sorry. Até a próxima!


# O Concerto

Caloni, 2010-12-24 cinema movies [up] [copy]

Trama principal: o próprio concerto; trama secundária: a relação de Andrey e sua solista, Anne-Marie.

Há uma introdução eficaz, pois já demonstra o jeito do maestro com a regência, e ao mesmo tempo, no corte inicial, já mostra que ele não faz parte da orquestra, mas está condicionado ao papel de faxineiro. Uma direção de arte que se preocupa com os detalhes em vermelho escuro (empoeirado?) do escritório do antigo partido. Domínio sobre a algumas sequências, como no jantar na casa de Andrey em que discutem o plano. Note como sua mulher aparece ao fundo e sussurra no ouvido de Andrey, ao passo que ao se dirigir à cozinha a câmera a acompanha, e ainda faz um círculo, voltando para a mesa de jantar.

A importância de Tchaikovsky na trama é logo declarada quando a orquestra escolhe o seu repertório, como pode ser notado na expressão de medo e incredulidade das pessoas que estão presentes quando é revelado. Os dedos tremendo do judeu ao tocar o trompete, e o foco na câmera nesse detalhe, é um exemplo dos pequenos detalhes da projeção que tentam criar o clima do desafio que o concerto representará para a maioria da orquestra.

Por trazer um conjunto de etnias tão diversificado como judeus e ciganos, o filme demonstra saber muito bem a atmosfera política em que ele se insere, até porque a subtrama do partido permanece até o final, na reunião do PCF (Partido Comunista Francês), que se revela um fracasso, com menos participantes que a própria orquestra.

Ao mesmo tempo, a orquestra como metáfora ou alegoria da própria sociedade comunista pela qual passaram seus participantes, onde as coisas simplesmente não funcionam se não houver a participação e o empenho de todos, é usada do começo ao fim, o que mais uma vez prova o engajamento político e ideológico do longa.

A cena do tiroteio no casamento pode ser engraçada, mas não se insere de forma tão orgânica, apesar de necessária para o financiamento da viagem (se bem que foi colocado para dar um tom mais dramático). A beleza da música na performance de Dmitry e do cigano principal, igualmente descartáveis, mas por dar um voto de confiança em Anne-Marie talvez se justifique.

O fato de Andrey (e, por tabela, Dmitry em alguns momentos) não saber muitas palavras em Francês também é uma jogada esperta que torna a comunicação com Anne-Marie mais deficiente, ou a mesmo tempo com palavras reveladoras (usar amar no lugar de gostar, no discurso de Dmitry).

Na descrição de Andrey durante o jantar com Anne-Marie no ocorrido, apenas ele ouve a música tocar (em que há um corte perfeito com a música no restaurante), e por isso Anne-Marie não entende completamente o que ele quer dizer. No momento do concerto, porém, Anne-Marie faz parte da orquestra, e tudo faz mais sentido para ela.

A comunicação então funciona plenamente, pois passa a ser baseada na música, que é universal. Existe uma transição entre a batuta quebrada do maestro e sua batuta (remendada) e a transição mais profunda, entre Lea e Anne-Marie na mesma posição, passado e presente.

Como se não bastasse, há ainda uma transição entre o futuro e presente, já mostrando a conclusão da trama durante o concerto e respeitando a inteligência do espectador.


# O Mundo Encantado de Gigi

Caloni, 2010-12-24 cinema movies [up] [copy]

O que mais me incomodou nesse filme foi o gráfico, nem tanto pela sua limitação, mas por não existir uma história suficientemente interessante para esquecermos das limitações da técnica usada, como foi com Wallace e Gromit: A Batalha dos Vegetais, ou até mesmo A Fuga das Galinhas. Simplesmente temos uma história batida, com poucos diálogos inspiradores que atravessam os seus 87 minutos de duração em um estado de quase chatice.

Fora os minutos finais, quando temos a cena de voo de Gigi, o resto é totalmente descartável.

Ainda com respeito à arte, os cenários podem até ter sido bem construídos, com uma textura e cores suficientes para estabelecer o "clima" por trás do sonho de Gigi. Contudo, mesmo estes ficam diminuídos frente aos movimentos de câmera que insistem em mostrá-los como se fosse algo que merecesse ser visto por longos segundos.

Lembrando quase sempre um videogame, e não seria exagero supor que a intenção dos produtores era exatamente essa: criar uma plataforma para rodar um filme publicitário que mais tarde seria lançado como um jogo. Essa é a impressão que passa, com suas fases e pulos desengonçados de seus personagens.

Por fim, se até crianças chegaram a dormir em um filme desses, o que dirá os adultos, que não têm opção melhor do que tentar se colocar na posição de uma criança de 4 anos; e mesmo isso não é garantidor de diversão.


# Trabalhando em múltiplos ambientes

Caloni, 2010-12-27 [up] [copy]

Existem diversas maneiras de se trabalhar com o Bazaar. Eu já havia definido como fazer na máquina de desenvolvedor para modificar o mesmo código-fonte em projetos paralelos, onde basicamente tenho um branch principal conectado no servidor (assim todo commit vai pra lá) e crio branches paralelos e desconectados para fazer quantos commits eu tenho vontade durante o desenvolvimento. Após todas as mudanças e testes básicos, atualizo o branch principal (com mudanças dos meus colegas) e faço o merge com o branch paralelo onde fiz todas as mudanças. Antes de subir com o commit final, ainda realizo um build de teste local, se necessário.

Nos casos em que eu trabalho em casa (ou em outro ambiente), posso fazer basicamente a mesma coisa, só que meu branch paralelo é copiado para outra máquina:

   C:\>cd \Src\projeto-principal
   
   C:\Src\projeto-principal>bzr get . ..\projeto-principal.TravamentoServico.MeuNotePessoal
   Branched 950 revision(s).

Geralmente o que faço depois é compactar a pasta gerada (se desejar, use uma senha forte nesse passo), fazer uma cópia para um PenDrive e descompactar na máquina que irei trabalhar.

   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>hack hack hack
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Uma mudancinha inicial"
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   added teste.txt
   Committed revision 951.
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>hack hack hack
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Vamos ver se funciona"
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   modified teste.txt
   Committed revision 952.
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>hack hack hack
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Não funcionou. Mais uma vez."
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   modified teste.txt
   Committed revision 953.
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>hack hack hack
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Desconfio de uma coisa..."
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   modified teste.txt
   Committed revision 954.
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>hack hack hack
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Corrigido travamento."
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   modified teste.txt
   Committed revision 955.
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>doc doc doc
   
   C:\Src\projeto-principal.TravamentoServico>bzr ci -m "Comentando e documentando solucao."
   Committing to: C:/Src/projeto-principal.TravamentoServico/
   modified teste.txt
   Committed revision 956.

Terminado o trabalho naquela máquina, geralmente gero um branch novo (para limpar o diretório) e recompacto a solução, copio para o Pendrive, e descompacto na máquina da empresa. O resto do caminho é como se eu tivesse feito as modificações na própria máquina:


# De Pernas pro Ar

Caloni, 2010-12-30 cinema movies [up] [copy]

Alice é uma mulher que se dedica inteiramente ao trabalho. Boa parte do tempo a vemos usando seu celular e seu notebook. Apesar de excelente profissional, ela ignora sua família, cuidando dos afazeres caseiros e profissionais como se fizessem parte de uma mesma agenda. A triste consequência é que, apesar de terem uma vida invejável de classe média alta, ela acaba conhecendo pouco de seu próprio filho e quase não nota a existência do marido, que aparece distante em sua vida (sua cara de fato não aparece no início do filme).

Após ser demitida no dia da sua promoção e levar um fora do marido pela secretária eletrônica (a única maneira que ele encontrou de fazer sua esposa ouvi-lo), Alice vê sua vida perfeita ficar, com o perdão do trocadilho, De Pernas pro Ar. Procurando um motivo para tal fracasso na vida de esposa, o quesito sexo é o que irá mais ressoar em sua cabeça. Ajudada pelas opiniões distorcidas de sua mãe e amiga, pois segundo elas a cama é o convívio central de todo casal que se preze, Alice abraça essa nova obsessão como a solução para todos os males, e tenta com ela restaurar tanto sua vida afetiva quanto profissional.

Escrito por Marcelo Saback (Divã) e Paulo Cursino, a "escalada" de Alice rumo à sua nova vida dupla de empresária e mãe de família é um apanhado de piadas eróticas e sexistas que divertem mais por elas mesmas do que pelos personagens, que permanecem unidimensionais por todo o trajeto. Mesmo o humor algumas vezes é logrado no próprio roteiro, adiantando um evento com falas que o tornam previsível, como quando Alice comenta para a amiga o que faria se reencontrasse a mulher que viu no flat com o marido (e adivinhem quem toca a campainha?).

Com uma história coerente em sua introdução e conclusão, mesmo com seu formato enlatado do subgênero "comédias de situação com conotações sexuais", possui um ritmo agradável e piadas que funcionam a maior parte do tempo, graças à presença de espírito de Ingrid Guimarães, que constrói uma personagem simplista e eficaz. E mesmo que Alice não tenha qualidades memoráveis que que a tornem mais palpável, sua divertida participação faz jus a esse projeto.


# Elsa e Fred

Caloni, 2010-12-30 cinema movies [up] [copy]

A noção de felicidade na sociedade atual acaba a tornando inalcançável. Quanto mais busca-se o mundo ideal, mais perde-se a satisfação do real. Sendo assim, é difícil não se emocionar com a praticidade de Elsa, uma mulher em torno dos seus 80 anos bem vividos que só tem um desejo em mente e que o coloca em prática o mais rápido possível: viver mais, não importando os defeitos e os obstáculos que o mundo real lhe apresenta.

Com um jeito apressado e cativante de se expressar, Elsa não é fácil de lidar, como é observado na relação com o filho. Porém, o que emociona na interpretação de China Zorrilla é a forma com que ela lida com seus problemas, se livrando rapidamente deles quando pode, ou se conformando com os que continuam a lhe atrapalhar. Isso não interfere com seu humor. Disposta a tudo para ser e fazer as pessoas felizes (as que merecem, do seu ponto de vista), não há nada que parece lhe tirar esse gostinho de viver. Vaidosa e dissimulada quando lhe convém, é autêntica. Imperfeita, mas real.

Em contrapartida, Alfredo, um recém-viúvo gentil, correto e educado, não tem muitas aspirações na vida a não ser ficar onde está. Lembra de sua ex-esposa pela sua principal virtude, ser organizada, e não seria exagero imaginar que eles viviam cada dia juntos como se fosse o mesmo. Para Alfredo, todas as coisas devem ficar no seu lugar, tudo tem uma hora, não se deve arriscar mais que o suficiente e, principalmente, deve-se tomar muito cuidado com a saúde.

Quando os dois se encontram, o que é mais notável é a rápida transformação de Alfredo. Sempre cauteloso e melancólico no início, a atuação de Manuel Alexandre confere autenticidade nas capacidades de Elsa de renovar o espírito de quem quer que esteja com ela. Note como Alfredo começa a história com movimentos lentos, cabisbaixo e com uma leve amargura no olhar, e quando, ao conhecer Elsa, volta a se movimentar com mais desenvoltura (e os cortes um pouco mais rápidos ajudam imensamente nesse efeito). Ao reerguer sua cabeça e empregar um tom de voz mais enérgico, especialmente ao conversar com sua filha, Manuel Alexandre nos dá a medida exata do poder de influência de Elsa e sua contagiosa vontade de viver.

Com uma trilha sonora e movimentos de câmera que privilegiam a contemplação, o filme é recheado de diálogos que pareceriam piegas se não saíssem da boca de dois simpáticos velhinhos, mas que exatamente por isso se tornam momentos inesquecíveis. E nada mais apropriado que o filme de Fellini, A Doce Vida, para que fossem resgatados os sentimentos de juventude e a valorização da vida, imperfeita como ela é, eternizada na relação amorosa entre os dois.

Nesse sentido, a cena final do casal, imortalizada com a troca de cores da sensível fotografia, representa muito mais que um momento. O "Obrigada" de Elsa dito a Fred simboliza a gratidão por tornar este momento especial, mesmo que o gato não seja branco, e mesmo que não dure para sempre.


[2010-11] [2011-01]