# Acqua Movie
Caloni, 2021-06-05 cinemaqui mostra cinema movies [up] [copy]Acqua Movie é de um gênero bem específico: filme "de cabine na pandemia". Este gênero foi criado para atender às demandas de apesar do isolamento social que vivemos haver divulgação para filmes sendo lançados em streaming. Porém, por enxergar um risco maior de pirataria e conteúdo publicado antes da data do embargo, as distribuidoras evitam dar acesso às produções mais badaladas e entregam aos divulgadores de nicho, como nós do CinemAqui, filme lado B de menor importância, que lembra o estilo "filme de arte". E nesse caso em específico, patrocinado com programas culturais que restaram após as eleições de 2018, relevando empiricamente não haver censura na arte, contrariando diversos profetas do apocalipse que ouvimos na época.
Mas, enfim, me sinto na obrigação de contar algo simpático para não pegar mal e receber mais convite para as "cabines", e o que me vem à cabeça é que, apesar de Alessandra Negrini ter envelhecido mal, não foi tão mal assim. Claro que as memórias de Engraçadinha do passado continuarão serão as melhores, e possuem um espaço erótico-afetivo reservado no cérebro deste ex-marmanjo (mas você sabe que cérebros masculinos param de se desenvolver aos 15 de idade).
Porém, falando sério agora, sobre atuação: Negrini não está bem. Logo que aparece em tela e a partir daí até o final do filme, este se revela um trabalho burocrático da atriz, com um sorriso amarelo enigmático para economizar expressões. De certa forma toda a produção aos poucos se revela burocrática. Sem paixão e com medos políticos que minam a energia para narrar este conto estendido de visita às origens, o reencontro entre mãe e filho e o pano de fundo histórico... tudo é preguiçoso, colocado no texto do roteiro sem maiores surpresas. E as surpresas que existem são todas ruins.
Lançado na 43a. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, de 2019, esta é a segunda parte da trilogia do diretor pernambucano Lírio Ferreira, onde a primeira parte você deve conhecer, se chama Árido Movie e é de 2015, as ideias por trás do longa são bem claras. Claras demais para guardar qualquer sutileza para nos entreter. Se trata desse retorno às origens do jornalista visto no filme original. Na verdade, do filho dele, Cícero, e de sua mãe, Duda.
Perto do original este é um filme minimalista ao extremo. Baixa produção, poucos atores (atuando nada), pouco roteiro e nenhuma direção tornam Acqua Movie o filme perfeito para deixar passar no serviço de streaming enquanto almoça ou janta. Os comentários que ouço em minha imaginação em torno do filme, porque as pessoas instintivamente conversam durante um filme ruim, são os mesmos que eu já fiz, a respeito do envelhecimento de Negrini, e talvez uma outra curiosidade a respeito do elenco mais venerano, desperdiçado em uma breve e embaraçosa sequência durante uma refeição, sobre uma comida típica do Nordeste.
O rapaz que interpreta Cícero, Antonio Haddad Aguerre, é digno de escola global de atores: completamente alheio ao seu personagem, diz suas falas sem graça, milimetricamente e culturalmente neutras para pagar de filho de paulistano. Ele está de luto pela morte do pai, e isso soa de acordo com sua performance motivo de sobra para não comparecer em nenhum set de filmagem com a alma presente. É um robô bem adestrado conforme nossa tradição nacional em interpretar garotos paulistanos: sem graça e dizendo o batidíssimo "orra, meu". Me senti nos anos 90 por alguns momentos, ou em um quadro do Boça, ícone do humor dos comediantes Hermes e Renato.
E por falar em humor, as poucas piadas do filme carecem de energia, ou simplesmente estão ausentes. O meme internético explica: "the left can't meme". E nem fazer piadas. Há uma bem no meio da produção, sobre a refeição risível que comentei, a respeito de uma "galinha capoeirista", que chega a ser digna de pena. Se estivesse no cinema escorregaria da poltrona até o chão. Talvez saísse da sala, em respeito aos idealizadores.
As caricaturas que sentam à mesa, novamente na mesma sequência citada (talvez seja o grande momento do longa pelas vezes que estou citando), também vieram dos anos 90, mas com roupagem moderna, versão bolsomito. O tio do pai falecido é esse prefeito de uma cidadezinha do Nordeste seguindo uma linhagem de coronelismo familiar, vestido com calça jeans e camiseta pouco abotoada, quase um agroboy quarentão, e seus capangas ao lado. A família que mora na região quer todas as terras indígenas em torno do Rio São Francisco; o novo Velho Chico após sua transposição, cercando a cidade chamada de Nova Rocha. Este é um filme feito também para comentar sobre este polêmico projeto de transposição do rio. Na época de Lula se evitava estardalhar muito, embora houvesse debate. Agora na era pós-Lava Jato o discurso dos politizados é quase unânime: óbvio que é uma coisa ruim.
A produção barata de Acqua Movie prejudica o andamento da história, mas não tanto quanto sua direção, afetada por essas manias de usar a câmera com o filtro dramático, mexendo mais do que devia e desfocando por "efeito artístico". Pode ser por uma boa causa: tudo para trazer emoção ao projeto, já que ele não virá das atuações.
Este filme é um retrato muito fiel do cansaço e da derrota dos movimentos artísticos e políticos pós-2018. Para você ter uma ideia, você enxerga neste filme uma polarização até maior do que das últimas eleições. São tempos difíceis para a esquerda, eu sei. Você sabe. Nós sabemos. Assistindo a Acqua Movie você sente isso também. Há uma desistência. Ele se torna melancólico, mesmo que sua curva final se esforce pelo "e deu tudo certo". Não deu. Os xamãs não curam tiro de revólver, e uma mãe responsável deveria ir ao hospital. Onde está o SUS, o orgulho da nação, essas horas? Pois é, é o que eu digo: há uma nota de desesperança ecoando por todo o filme. É triste de ver, mas seria poderoso se fosse um bom trabalho, mas as energias foram drenadas. Assim como o antigo São Francisco, as águas foram suavizar a vida de outros.
O uso pontual de inglês falado no filme não serve como chamariz internacional, embora seja uma boa tentativa. A ponte inexistente entre o projeto da mãe, diretora e documentarista, que fica suspenso lá na Amazônia, e o velho Nordeste, mas também com índios, também não funciona. No começo uma língua nativa diz sobre o mistério das águas. Seria gratificante se o filme tivesse algum mistério em seu fluxo. Mas do começo ao fim parece tão do mesmo que o máximo que dá pra fazer para se entreter é buscar os simples furos do roteiro, mas observá-los faz brotar dentro de nós mais fácil uma indignação do que a compaixão. É difícil sentir pena dos produtores de Acqua Movie. Eles não facilitam nossa vida assistindo essas quase duas horas de lenga-lenga.
A vida irá seguir seu fluxo através da água, seja ela no Velho ou no Novo Chico. Quem faz uma poesia sobre o poder místico das águas e defensor da sociedade líquida que vivemos deveria entender que nada é para sempre. Essa visão antiquada de contar histórias de fundo social no cinema brasileiro vai contra essa proposta. Mas essa é uma conclusão pós-filme. Só o tempo dirá.
# The Lost Village (Mayoiga)
Caloni, 2021-06-05 cinema animes [up] [copy]A dinâmica do primeiro episódio é hipnotizante. O ar de mistério sobre quem são aquelas pessoas dispostas a desistir de suas vidas indo em direção a uma vila perdida para nunca mais voltar garante nossa atenção. Eles estão em um ônibus de excursão. E o motorista? Pessoas já "se perderam" por lá. E a polícia? Há criminosos no meio do grupo? E se alguém desistir?
The Lost Village possui uma estética noturna atraente e misteriosa. Observar este ônibus adentrar um denso nevoeiro na estrada enquanto todos estão submersos em seus pensamentos é fruto de uma direção ritmada, intensa e com um jogo de câmera e luzes que mantém o clima de tensão.
Por fim, uma trilha sonora primososa, unindo o fantástico com o drama pessoal e coletivo do que irá acontecer em seguida.
# Jouran: The Princess of Snow and Blood
Caloni, 2021-06-05 cinema animes [up] [copy]Nossa, que legal. Anime com lutinha e revelações no meio delas que ninguém que não leu o mangá vai entender. Esse é um dos poucos exemplares que eu dormi no primeiro episódio. Vinte minutos é atenção demais para uma sequência de medida de forças que se passa em um Japão nazista com espiões e agentes aparecendo pra fotinha e se transformando em monstros.
# Zazie no Metrô
Caloni, 2021-06-05 cinema movies [up] [copy]Esse filme absurdo e cartunesco é de Louis Malle, um dos precursores da Nouvelle Vague que era ignorado pela panelinha do Truffault, Godard e cia. Ele conta a história da pequena Zazie indo passar um final de semana com seu tio enquanto a mãe se diverte com o namorado. Tudo que Zazie quer em Paris é andar de metrô, mas eles estão de greve. Então ela parte para sua rica imaginação, onde as leis da física e do bom senso dão lugar a um dos filmes que mais investe energia em casa quadro e em cada gag, com a condição de pelo menos arrancar uma expressão de surpresa do espectador.
E ele arranca, com certeza. E várias. O tom cartunesco pode ser visto hoje na maioria dos desenhos da época, como Tom e Jerry e Pica-Pau. Malle se deu bem em Hollywood, e não à toa. Diferente de seus colegas franceses sua dedicação é pela técnica e pelo cinema antes de esboçar um discurso político (claro que ele também ataca a burguesia, mas isso é chover no molhado e... até a burguesia ataca a burguesia; esses intelectuais não sabem o que colocar em uma crítica).
Comédia escrachada, é empolgante na maioria do tempo, mas sua bagunça cansa um pouco. As crianças devem ter adorado. As cores, o movimento, o absurdo. Eu adorei. Apenas já não tenho tanta energia assim, e o filme é uma viagem de montanha russa de uma hora e meia.
# Cabine Quem Vai Ficar Com Mario
Caloni, 2021-06-09 cinema [up] [copy]Sempre fico curioso sobre onde estão as pessoas que escrevem sobre cinema. Uma oportunidade surgiu durante a cabine de imprensa do filme Quem Vai Ficar com Mário, já que foi virtual e todos os espectadores tiveram que se apresentar junto do veículo no chat. Aproveitei e montei uma lista dessas pessoas. Muitas delas deixarão de existir daqui a pouco, e algumas podem ou não ficar por mais um tempo. A vida é tão frugaz nas redes que nem me darei ao trabalho de coletar links. Esta lista é pura e simplesmente para quando estiver entediado e for buscar se existe algum texto que preste hoje em dia na criticosfera.
# Forever
Caloni, 2021-06-12 cinema series [up] [copy]Comédia simpática. Maya Rudolph e Fred Armisen interagindo de maneira sarcástica e cheio de subtextos são os melhores momentos, mesmo que os diálogos sejam péssimos. Isso é improvisado?
A direção do criador Alan Yang é cheio de incertezas. Ele esconde essas incertezas em um estilo difícil de seguir, meio indie, meio boomer do novo século.
O roteiro é igualmente indeciso. Sai do banal e cai no sentido da vida. Uma série sobre nada e tudo ao mesmo tempo. Curioso. Mas a ponto de continuar vendo? O primeiro episódio parece durar bem mais que 25 minutos. Talvez por isso a série se chame Forever.
# Lúcifer
Caloni, 2021-06-12 cinema series [up] [copy]Seu sotaque e sua dicção são sexy. Esta é uma série em que o diabo de férias na Terra gosta de brincar com os humanos. Muitos deles devem-lhe favores e ele está cheio de disposição para sair por aí trocando farpas verbais e um pouco de ação em mais essa série policial.
# Meu Amor: Seis Historias De Amor Verdadeiro
Caloni, 2021-06-12 cinema series [up] [copy]Um seriado de longas documentais sobre histórias de amor que já passam de décadas. Assisti o do casal do Brasil, Nicinha e Jurema. É sobre a rotina das duas moradoras da Rocinha, favela no Rio de Janeiro. De idade já avançada, elas trabalham o dia-a-dia com planos para o futuro sendo desenhados, os rituais do presente e tenras lembranças do passado. É uma edição relaxante, sem tensão alguma. Quase um vídeo de homenagem ao simples. Há pouco de tratamento na história. Elas são o que você vê na tela, e não tem como desgostar dessas duas. Não tem como desgostar de uma relação que tem dado certo por tanto tempo.
# My Wife Is the Student Council President!
Caloni, 2021-06-12 cinema animes [up] [copy]Comédia do absurdo. A linguagem se solta um pouco além da lógica. Há um teatro não-relacionado com a história e uso de enquadramentos e posições diferentes, proporções propositadamente exageradas. Os traços são imaginativos, unindo o exploitation de belas curvas de colegiais com uma pegada mais cartunesca, o que permite momentos fofinhos, e tudo funciona bem porque é muito bem feito. Lembra vagamente trabalhos da Trigger como Kill La Kill e Patrulha Espacial Luluco em alguns aspectos, mas não é a mesma coisa. Junto uma pegada que lembra o clima solto de Epic Pop Team, mas sem o anarquismo completo. É uma mistura de fato, não é original, mas consegue ser divertido com o que oferece.
# Outlander Quinta Temporada
Caloni, 2021-06-12 cinema series [up] [copy]Após uma leve queda na produção na temporada anterior, a Season 5 demonstra mais uma vez que é de um primor artístico. A maquiagem, o figurino, a direção de arte. O elenco fixo está agora à vontade independente da época que quer retratar. Que no caso agora é a iminência da guerra americana das colônias.
É esse ar aristocrático dos personagens Claire e James Fraser, seguido de perto por Brianna. É o espírito do tempo materializado em cada quadro, e em muitas falas. Uma adaptação das mais ricas. O poder dessa série é você conseguir sentir de fato em alguns momentos imerso no drama local, com um pano de fundo histórico que só lemos ou ouvimos falar na escola.
Ainda continua o romantismo estilo Sabrina, marca registrada da autora romântica dos livros de Diana Gabaldon, escritos desde a década de 90 e ainda em desenvolvimento. Há um charme sutil nesse talvez desejo oculto. Somos presenteados com tanta presença de espírito histórico que se torna um chamariz a mais, junto da noção de violência e a importância da coragem e da honra.
# Quem Vai Ficar Com Mario?
Caloni, 2021-06-12 cinemaqui cinema movies [up] [copy]Uma pena que poucas pessoas irão entender o trocadilho de "Quem Vai Ficar Com Mário?". Não, não é esse Mário que você está pensando. Dos longínquos anos 90, "Quem Vai Ficar Com Mary?" foi uma comédia romântica dos irmãos Farrelly de chacoalhar os cinemas, em que a personagem de Cameron Diaz era disputada a tapas por dois marmanjos imaturos. Porém, os tempos mudaram, e mais de vinte anos depois o nosso humor mudou. Se tornou mais polido, politizado. Chato, em resumo. Isso aconteceu ao longo dos anos por bem ou na marra, e por motivos fora do escopo desse texto.
Mas por falar em referências, esta é uma adaptação de uma comédia italiana de 2010 chamada O Primeiro que Disse. O plot é o mesmo: dois irmãos gays e um patriarca retrógrado. Mas não está nos créditos do roteiro. De qualquer forma ele foi atualizado com uma causa LGBTYZ mais ampla, atualizada. Seu diretor e idealizador, Hsu Chien, é um dos únicos no Brasil com a sensibilidade e o espírito de equipe para não transformar um projeto desses em uma globochanchada cheio de estereótipos.
Não vou mentir que há, sim, um ou outro momento em que "as bichas vão à loucura", e isso pode soar preconceituoso para alguns. No entanto, em comparação a filmes mais comerciais este sustenta uma dignidade necessária para esta década. Seu elenco suporta seus personagens com esmero e paixão. O resultado é assombroso. Não é original nem excelente. Mas é cativante, do começo ao fim.
Não existem piadas ofensivas ou escrachadas. E o motivo disso foi a escalação da atriz Nanny People, que na coletiva de imprensa comentou que apenas aceitou o papel escrito especificamente para ela se fossem retirados os exageros caricatos e o final derrotista, em um dos inúmeros exemplos do nível de abertura de seu diretor, que com o apoio dos quatro co-autores do roteiro acatou as mudanças requeridas por People.
A história reciclada do filme italiano investe em novos personagens que modernizam a trama, e incidentalmente a tornam mais engraçada. Há uma coach empresarial feminista interpretada pela ótima Letícia Lima cuja piada frequente é corrigir sutilmente todas as pessoas que não a chamam pelo nome. É engraçado por sugerir um estereótipo, mas é útil também por exemplificar através do humor um tratamento indelicado que é bem comum de acontecer.
Da mesma forma a geração anterior e a próxima são representadas pela sobrinha e pela avó do protagonista, ambas antenadas com respeito às liberdades que o mundo ganhou e prontas para dar lição de moral ao patriarca da família, este, sim, muito próximo de uma caricatura. Ele se torna o calcanhar de aquiles do projeto, pois o terceiro ato inevitavelmente terá que conter um desfecho satisfatório que sacrifica a essência desse personagem, necessário para criar a tensão inicial, mas que enfraquecerá o drama nos minutos finais, e nos lembra que tudo não passa de uma farsa.
O elenco se completa com o trio gay interpretados por Daniel Rocha, Felipe Abib e Rômulo Arantes Neto. Cada personagem desse trio é unico em tom, estilo, ritmo, personalidade e profundidade. O que é um marco no cinema nacional gay. Talvez no hétero também. Entre eles se sobressai Daniel Rocha, em um personagem inusitado. Rocha constrói um Mário que, diferente daqueles personagens que nos dão raiva por ele nunca tomar as decisões que precisa tomar, aqui não podemos nutrir nossas críticas porque... esse Mário é realmente convincente. Nós entendemos essa pessoa e o que ela representa no microcosmos de personalidades desse filme e sabemos de imediato que esta não é uma pessoa que vai resolver sua própria vida sozinho.
Por outro lado, nem seu namorado, Fernando. Interpretado por Felipe Adid, Fernando é possessivo e controlador um pouquinho acima do desejável para que os dois funcionem como um casal. Eles dão certo no palco. Enquanto um escreve o outro dirige. Porém, a vida não é só feita de palcos, e quando ambos descem para a realidade um impasse fica flutuando no ar. Eles precisam que alguém construa a voz da razão ou serão triturados pelo mundo lá fora.
Esse alguém é a personagem de Letícia Lima. Uma pessoa forte e empoderada sem ser vulgar. Um pouco chata quando necessário. E por "sorte" ela inspira em Mário uma paixão física e espiritual. Porém, o mais fascinante é que ambos sem Fernando se desequilibram. É aquele fogo de palha que logo se apaga. Só o ingênuo e sonhador Mário não percebe.
Como você pode ver, este é um filme com personagens encantadores que minimizam o roteiro maniqueísta. Quando o diretor Hsu Chien viu essa trupe em ação sabia que havia algo de especial. O que cada atriz e ator, dedicados em sua própria performance individual, eram incapazes de ver, Hsu vislumbrou em conjunto. E tirou o melhor de cada tomada. Cada sorriso, cada olhar, cada suspiro.
"Quem Vai Ficar com Mário?" com esse título de comédia dos anos 90 tomou o rumo de um conteúdo leve que faz jus aos tons de cores não tão exagerados quanto uma comédia gay nem tão sóbrios quanto filmes do extremo sul do país. Um arco-íris sóbrio ainda é um arco-íris.
# Sabor da Vida
Caloni, 2021-06-12 cinema movies [up] [copy]Para quem buscar ele tem o nome internacional Sweet Bean e está entitulado na Amazon Prime como Sabor da Vida. E Sweet Bean é um drama leve, calmo, que se beneficia de sua edição de impor o ritmo necessário para pausarmos nossas super-ocupadas vidas e prestar atenção em pessoas invisíveis para a sociedade.
O chefe é um recluso, individado para o resto da vida por um erro do passado. Ele encontra uma senhora que está no final desse processo de isolamento social. Ao fim de sua vida, no entanto, ela aprendeu algo para passar adiante. E não é apenas fazer uma pasta de feijão doce perfeita, mas dar atenção aos detalhes que tornam o processo maravilhoso.
A direção e o roteiro de Naomi Kawase tornam essa experiência baseada no romance de Dorian Sukegawa minimalista, talvez um pouco demais. É difícil se relacionar com o clichê da colegial com mãe solteira, e até mesmo a figura do chefe de cozinha solitário e amargurado fica monotônico, ele é quase uma representação mais geral. E, se formos pensar, a senhora Tokue também é, representando os leprosos do mundo.
Porém, a atuação naturalíssima de Kirin Kiri (Caso de Família) eleva o filme para sua observação em cena, maravilhados. Os diálogos ganham brilho, mesmo que não sejam geniais. A fotografia com filtro do Instagram merece uma segunda olhada, apenas por conta da atriz veterana. E sua história, nós assistimos o filme por ela. E porque queremos saber mais de seu feijão e onde está escondida.
# Sweet Tooth
Caloni, 2021-06-12 cinema series [up] [copy]Era uma vez um mundo pós-Covid onde o que sobrou foram millennials que achavam ser a solução de todos os problemas. Também achavam que eram metade homem, metade bicho da floresta. Nesse universo a mãe natureza está nervosa com os humanos carnívoros e a salvação é um bando desses furries veganos.
# A Boa Esposa
Caloni, 2021-06-20 cinema movies [up] [copy]A Boa Esposa é uma farsa bonitinha em formato comercial sobre um causo que ocorreu na última resistência do patriarcado, lá em maio de 1968, na fronteira entre França e Alemanha, onde se faz chucrute, mas se fala francês. O mundo só melhorou ou piorou desde então, dependendo de quem responde (homem ou mulher).
Estamos na boa companhia de Juliette Binoche, Yolande Moreau, Noémie Lvovsky e Edouard Baer. A dupla Binoche e Moreau são respectivamente a esposa e a irmã do chefe de família Robert Van der Beck (François Berléand), que comanda uma escola de donas de casa em uma época em que as famílias não-ricas colocavam as moças para aprender a serem esposas em vez de fazer um curso na faculdade.
Porém, esta já é uma idéia ultrapassada na época de olharmos para as expressões das únicas 18 jovens inscritas esse ano. O número caiu quase pela metade comparado com o ano anterior, e não há nenhuma realmente empolgada com este curso. Cada uma possui interesses diversos, o que quer dizer que há um romance lésbico no meio, e objetivos distintos, nem que seja sair da casa dos pais.
Isso não impede a empolgação da matriarca da casa, uma Juliette Binoche tão autocentrada no seu papel de esposa e educadora que não consegue sair de seu personagem quando inevitavelmente as coisas começam a sair dos trilhos: revoltas avançam na capital francesa e ela redescobre um antigo amor perdido.
Já Yolande Moreau (você deve lembrar dela nem que seja de Amelie Poulain) faz aqui uma de suas personagens mais carismáticas, mesmo que reduzida a monossílabos no roteiro. Ela ensinando as meninas a cozinhar um coelho é um dos poucos prazeres do filme desprovidos de ideologia política e encanta de imediato.
Apesar de comédia, A Boa Esposa possui em seu fundo um tom melancólico e talvez saudosista, de uma época em que os problemas da sociedade eram óbvios e sabia-se o que fazer, não havendo cortina de fumaça e cientificistas dizendo o que devemos acreditar. É fácil de entender porque o filme termina em um número musical. O difícil é se levantar após a dança.
# Felizes Juntos
Caloni, 2021-06-20 cinema movies [up] [copy]Wong Kai Wai é um dos maiores cineastas em atividade no cinema. Seus filmes são a expressão pura do desejo de retratar sentimentos, emoções ou qualquer presença de espírito ou atmosfera através dos enquadramentos, cores, sombras, movimentos. Seus atores são seus bonecos de modelar sensações, e seu misce en scene, ou seja, que ele escolhe colocar na tela, é tão natural quanto o ar que suas locações emanam. O cineasta também não está interessado em levantar as horríveis bandeiras políticas de nossos tempos, o que hoje é um diferencial. É sobre relacionamentos, mas não apenas. No universo do diretor que nunca escreve roteiros antes de sair filmando, muito se pega por osmose. É um olhar, um ângulo, um movimento com a cabeça. A vida está lá, representada em cor e movimento. Pulsante, livre e atemporal.
# Jumanji
Caloni, 2021-06-20 cinema movies [up] [copy]The Rock poderia estar um pouquinho mais inspirado, mas quem se empolga com material requentado? Este é em remake/continuação sem a menor criatividade, trocando o jogo de tabuleiro que tornou John Williams uma paródia para o hoje velho e empoeirado vídeo-game de cartucho. Há um jogador preso há 20 anos nessa realidade fantástica, embora sua carisma seja de um NPC, e esses garotos millennials são sugados para dentro da mesma selva para resolver suas vidas e seus casos. Dois nerds que viram ídolos corporais e dois sex appeals do colégio que viram dois gordinhos nada sensuais ou sequer engraçados. Essa troca de papéis não é usada muitas vezes porque hoje é feio, então a história fica mais ou menos a mesma. Há comentários verbais sobre alguma mensagem bonita do filme, mas a única coisa que você vai se lembrar é que em uma época onde todas as aventuras que saem no cinema lembram games modernos sem riscos ou desafios, apenas fases, este filme tenta ser tão ruim quanto um vídeo-game com roteiro fraco. E consegue.
# Reflexões de um Liquidificador
Caloni, 2021-06-20 cinema movies [up] [copy]Selton Mello é nosso mascote de cinema e novela, sempre disposto a impor sua cara e voz nas telinhas e telonas. Aqui ele não se mostra, mas usa o mesmo tom monótono e irritante de sua voz como o narrador no corpo de um eletrodoméstico em um crime do Notícias Populares: mulher processa o marido no liquidificador. Não há vítimas. A narrativa social desse thriller impede que haja. Em filmes de arte só se fala da indignação da condição humana, com o objetivo geral de denegrir nossa existência, dizer que somos falsos e dissimulados, etc. O filme é todo reflexivo com alguma parte engraçada ou sensual. Mas seus ótimos atores e direção não salvam a narração do liquidificador mais irritante do cenário nacional.
# Exótica
Caloni, 2021-06-21 cinema movies [up] [copy]Este filme magnético dos anos 90 une diferentes personagens através de curiosas relações. Não que as relações o sejam, mas o desenrolar dos personagens são, enquanto não os entendemos. O filme captura nossa atenção ao não explicar nada. Nós queremos saber, mas para isso precisamos acompanhar cada cena. O diretor ganhou experiência compreendendo a estranheza das pessoas sendo funcionário de um hotel. O resultado é um mergulho profundo na psique humana e seus problemas banais elevados a drama.
# Machuca
Caloni, 2021-06-21 cinema movies [up] [copy]Este denso drama chileno se torna leve aos olhos do espectador porque acompanhamos a vida dessas crianças como, por sua vez, meros espectadores das transformações sociopolíticas do Chile na década de 70. É nas sutilezas que se encontra o subtexto que irá agradar o cinéfilo mais atento, como as questões ideológicas e em que espectro político e social cada personagem, principal ou periférico, se posiciona nesse mosaico tão bem construído em torno da juventude de Gonzalez, Machuca e uma garota. Machuca não é o protagonista apesar do título, e apenas esse detalhe já revela todo um subtexto a respeito da atmosfera da época. Gonzalez é o garoto protagonista, pois de todos ele está mais no centro deste furacão que acontece nesses anos entre a eleição de um populista e a inevitável intervenção militar. Note os detalhes sutis desta história para testemunhar um grande filme, cheio de textura histórica e uma atmosfera de seu tempo.
# Não Amarás
Caloni, 2021-06-23 cinema movies [up] [copy]Este é um de dois longas-metragens dirigido por este cineasta polonês baseado em dois episódios de um programa de TV baseado nos Dez Mandamentos. A história é simples e monossilábica sobre um jovem, órfão e tímido, que se apaixona por sua vizinha a observando de longe. É um filme curto que comprova que é possível criar uma música tema com uma dúzia de notas musicais e é possível imprimir filosofia no cinema. O desejo inatingível, o quadro imutável de nossa existência. Não é um filme bonito, porque reflete a existência humana, em todo seu egoísmo e mesquinhez. Estamos impossibilitados da perfeição de Cristo, e se tentarmos seremos condenados.
# Diário de Uma Garota Perdida
Caloni, 2021-06-25 cinema movies [up] [copy]Thymian não é uma gamine, mas flerta com o estéreotipo enquanto encanta os homens com seu olhar ingênuo e curioso. É da misteriosa atriz Louise Brooks a missão de realizar o arco da heroína neste filme mudo alemão de 1929 que muitos consideram um clássico, e talvez não apenas por ser um filme mudo alemão de 1929. Há versões desse filme entre 79 e 116 minutos, e eu acho que a versão mais curta deve ser melhor, pois eu vi a mais longa e não gostei muito do resultado. A câmera repousa por muito tempo no rosto dos atores, um misto entre expressionismo e cacoetes da época, além de sequências desnecessárias, como Thymian dando aulas de dança em roupas de banho.
A história é boa, mexe com nossos brios. Essa garota ingênua e de menor é estuprada por um funcionário da farmácia do pai, gera um filho ilegítimo e o pai faz o que manda o protocolo: expulsa Thymian. Que cai na vida. Passa por um orfanato e depois em um bordel. A dona do bordel é uma atração à parte. É um misto de boa senhora e segundas intenções. Se sai melhor que os vilões do filme, caricatos demais. Embora a moça que toca o gongo que força as meninas do orfanato a se exercitar é um momento hipnotizante.
Hoje há muitas variações dessa história, mas esta é baseada no controverso romance de Margarete Böhme. Apesar das pausas, a direção de G. W. Pabst muitas vezes é dinâmica e possui outros momentos hipnotizantes além da cena do gongo.
# To Your Eternity
Caloni, 2021-06-25 cinema animes [up] [copy]A jornada dos anônimos, contada como um épico porque todo anônimo que se sacrificou pela sobrevivência conta como um passo à frente para onde estamos hoje. Tudo começa com um "orb" que pode reproduzir formas. Isso chega na Terra como uma pedra. Vira um lobo, o melhor amigo de um menino. "O Último" é o título desse primeiro episódio de um anime orquestrado com esmero. É para fazer você se emocionar, pelo texto e pela música. Fará você chorar pela desesperança, ó doce e ingênua criança moradora do século 21. Ignora o número de obstáculos para chegarmos aqui. E ignora que "O Último" é apenas um entre muitos. E o sonho de um paraíso continua entre os sobreviventes. Viva a jornada!
# Bagdad Café
Caloni, 2021-06-26 cinema movies [up] [copy]Tudo é ligeiramente fake nesse filme dirigido pelo alemão Percy Adlon e falado em inglês. Soa como baseado em peça de teatro, talvez um musical e quem sabe um romance estadunidense. Nada disso. Original, recebe diversas influências do show business e do cinema indie para se tornar relevante. No processo se torna hipnotizante. Para começar, a música-tema, Calling You, de Jevetta Steele, vira o hino profundo de Bagdag Cafe. Essa profundidade ecoa por todo o filme, mas nunca sabemos de onde vem. Ao final descobrimos não vir de lugar algum. Era apenas um show de mágica. O cinema como ilusão se recria quando quiser e não precisa de motivos.
# Love on Delivery
Caloni, 2021-06-26 cinema movies [up] [copy]Stephen Chow escreve, produz, dirige, atua e coreografa seus filmes com uma energia admirável. A maioria é um lixo, mas um lixo prazeroso para o cinéfilo. As cenas de luta são bem montadas porque ele não é nenhum Jackie Chan (embora admire). As piadas são escrachadas próximo do nível do insuportável, mas nunca ultrapassa esse nível. Seu cinema é de uma grandiosidade que gostaríamos de ver na telona mais vezes em vez dessas produções mais caras que investem no público da mesmice. Cinema bom é cinema de apaixonados pela arte, e até trash de baixa qualidade como os seus filmes furam a fila dos insuportáveis blockbusters de franquia.
# Minha Mãe é Uma Peça, o Filme
Caloni, 2021-06-26 cinema movies [up] [copy]Esta obra tem a capacidade de nos fazer virar e olhar para o espectador médio brasileiro de conteúdo globochanchado. É a curiosidade que nos move para entendermos esse bicho exótico. Como podem tantas pessoas recomendarem esse pedaço de audiovisual que se auto entitula "filme" (sic) quando na verdade é um palco de vergonha alheia para todos os envolvidos? Há limites para o descaso e o escracho para com a palavra filme? Há alguém com sanidade para assinar este conteúdo como algo além de tempo de tela pago para os canais globais? Existe algum cineasta digno nesta atrocidade? Incapaz de criticar a direção do que não considero um filme, gostaria que esta uma hora e meia simplesmente não existisse. Me sinto uma pessoa pior depois de ter assistido a isso. Me sinto culpado de ter ido tão longe. Até o final. Me perdoem.
# Erin Brockovich
Caloni, 2021-06-28 cinema movies [up] [copy]O momento de Julia Roberts brilhar e fingir ser uma atriz de talento é esse filme. Ela está ótima, oscarizável (ganhou inclusive) e possui falas bonitinhas. A história baseada em fatos é sensacional, mais do que o filme, que é um Soderbergh menor, que quer ser intimista sem perder o tino comercial. Tem ótimos momentos do elenco, mas o processo judicial se arrasta por mais de duas horas. Assisti no cinema em um sábado na hora do almoço com a sala vazia e não esperando nada e foi uma viagem do bem. Reassisti agora na Netflix e vejo com olhos saudosistas dos anos 90. O figurino de Erin e os enquadramentos de sua bunda e peitos são um plus. Quem resiste àquele sorriso maroto? Nem Richard Gere.
# Carolina Caldas de Vivente Andante
Caloni, 2021-06-30 cinema [up] [copy]O texto escrito para Quem Vai Ficar Com Mário? é cheio dos discursos sociais em voga com direito a chavões e as palavras que sempre ganham o bingo, como as mais simples diversidade, inclusão, passando pelas mais complicadas heteronormativo e a sigla esdrúxula dos degenerados que já desisti de decorar (já chegam as siglas da área de TI). Esta "autora" está apenas copiando discurso ideológico e tecendo elogios vazios ao filme sem falar propriamente dele para garantir os convites das próximas cabines de imprensa. Pode ser ignorada com segurança por ser apenas mais uma voz robotizada.
# Raphaela Souza de O Quarto Nerd
Caloni, 2021-06-30 cinema [up] [copy]Seu texto sobre Quem Vai Ficar com Mário está cheio de erros de ortografia e gramática, o que gera uma certa repulsa sobre como o termo nerd virou qualquer coisa. Porém, não é um texto tão incômodo quanto o de Carolina Caldas porque este possui uma cadência menos militante. De qualquer forma, é mais do mesmo no bingão dos oprimidos que agora têm voz, mas não sabem escrever: discurso ideológico manjado, narra a historinha do filme e tece elogios vazios à equipe.