# Code Jam 2019 Qualification Round
Caloni, 2019-04-07 computer [up] [copy]Estou viajando e com poucas horas de acesso a um computador, mas os dois primeiros desafios do Code Jam esse ano foram tão simples que sequer precisaram de meia-hora. Isso para um chinês, campeões em campeonatos de programação, deve ser equivalente a cinco minutos com um código C enxuto. Mas estou apenas aprendendo.
**Resuminho**: o problema é receber um número e retornar dois números cuja soma seja igual ao primeiro. A única restrição é que nesses números não poderá ter o algarismo quatro.
**Solução**: copiar como string o número para o primeiro deles e colocar zero no segundo; sempre que houver a incidência do caractere '4' trocar por '3' no primeiro número e '1' no segundo (ou a soma que lhe convier).
#include <iostream> #include <string> using namespace std; void calc(string& N, string& A, string& B) { for( size_t i = 0; i < N.size(); ++ i) { if( N[i] == '4' ) { A.push_back('3'); B.push_back('1'); } else { A.push_back(N[i]); B.push_back('0'); } } } int main() { int T; cin >> T; for( int i = 0; i < T; ++ i) { string N; cin >> N; string A, B; calc(N, A, B); cout << "Case #" << i+1 << ": " << stoi(A) << " " << stoi(B) << endl; } }
**Resuminho**: tem que atravessar um labirinto formado por quadrados de N x N começando acima à esquerda saindo abaixo na direita. Enviar uma string com os comandos E ou S (East/South) para sair do labirinto. A pegadinha é não repetir nenhum dos comandos de uma garota que resolveu o labirinto antes.
**Solução**: essa pegadinha é o que ironicamente resolve o problema, pois basta inverter os comandos S e E da string recebida como o caminho da garota e ele nunca se repete e sai do mesmo jeito, pois é o labirinto mais fácil do mundo.
#include <iostream> #include <string> using namespace std; void calc(string& P) { for( size_t i = 0; i < P.size(); ++ i) { P[i] = P[i] == 'S' ? 'E' : 'S'; } } int main() { int T; cin >> T; for( int i = 0; i < T; ++ i) { string N, P; cin >> N >> P; calc(P); cout << "Case #" << i+1 << ": " << P << endl; } }
**Resuminho**: encontrar quais números primos são usados como letras do alfabeto baseado em uma sequência em que o primeiro número é a multiplicação do primo da primeira letra pela segunda, o segundo número é a multiplicação da segunda pela terceira e assim por diante.
**Solução**: tentei fazer na força bruta criando o dicionário de primos usado procurando o resto zero das divisões dos números e depois já com o alfabeto montado reproduzir as reproduções. Apesar do sample funcionar devo ter perdido pelo tempo ou um erro que não descobri.
#include <iostream> #include <map> #include <string> #include <vector> using namespace std; void calc(int N, vector<int>&LS, string& LSS) { map<int, char> alpha; int first1 = 0, first2 = 0; for( int l: LS ) { int na = 0; for( auto a: alpha) { if( l % a.first == 0 ) { na = l / a.first; break; } } if( na ) { alpha[na] = ' '; continue; } for( size_t i = 2; i < N; ++i ) { if( l % i == 0 ) { int na1 = l / i; int na2 = i; if( first1 == 0 ) { first1 = na1; first2 = na2; } alpha[na1] = ' '; alpha[na2] = ' '; break; } } } const char Alphabet[] = { 'A', 'B', 'C', 'D', 'E', 'F', 'G', 'H', 'I', 'J', 'K', 'L', 'M', 'N', 'O', 'P', 'Q', 'R', 'S', 'T', 'U', 'V', 'W', 'X', 'Y', 'Z' }; size_t pos = 0; for( auto& a: alpha ) a.second = Alphabet[pos++]; int first = LS[1] % first1 == 0 ? first2 : first1; LSS.push_back(alpha[first]); for( int i: LS ) { int second = i / first; char c = alpha[second]; LSS.push_back(c); first = second; } } int main() { int T; cin >> T; for( int i = 0; i < T; ++i) { vector<int> LS; int N, L; cin >> N >> L; int l; for( int n = 0; n < L; ++ n) { cin >> l; LS.push_back(l); } string LSS; calc(N, LS, LSS); cout << "Case #" << i+1 << ": " << LSS << endl; } }
**Resuminho**: descobrir quais bits não estão sendo retornados em um echo (ex: manda-se '1010' e recebe '010') com um limite de envios para o servidor (este é um problema interativo).
**Solução**: imaginei dividir o envio pelo número de blocos defeituosos para alternar os 0s e 1s e assim ir dividindo pela metade de acordo com as respostas até ter as posições que não estão retornando. Não cheguei a terminar o código, mas a ideia geral era que como o limite de blocos defeituosos era de 15 ou N-1 (N é o número de bits) e o máximo de chutes é 5, imaginei que a divisão de 2 elevado a 5 fosse o limite da solução.
# 4x4
Caloni, 2019-04-12 cinema movies [up] [copy]O filme começa mostrando um monte de muros, alarmes, arames farpados e câmeras que demonstram a insegurança da classe média de hoje em dia. Um ladrão de toca-fitas de carros fica preso no carro de sua próxima vítima e não consegue mais sair. A situação em 4x4 é rapidamente montada, mas de difícil solução. É um filme tenso, com várias mensagens dúbias, mas que se soluciona de maneira superficial e sem um grande nó a unir as linhas de raciocínio que ele mesmo começa. Como direção um ótimo entretenimento. Como roteiro algo que dificilmente soará como inovador ou bem desenvolvido.
As situações retratadas no filme após o bandido entrar em um carro são tão bobas e simplórias, mas a forma de desenvolver a história do diretor Mariano Cohn é tão intensa que não nos damos conta da narrativa rasa que vai se desenvolvendo. De qualquer forma, este é um filme esteticamente competente, nos faz pensar que este será aqueles trabalhos que irá nos deixar pensando após terminar. Realmente nos deixa, mas mais em seus defeitos que em suas virtudes.
Sem querer estragar a história, posso dizer que ela se passa quase todo o tempo dentro do carro, há um outro personagem oculto e que os diálogos que se desenvolvem entre esses dois personagens é o suficiente para nos deixar presos na poltrona do cinema. Quando a ação sai do carro o roteiro parece que não imaginou que isso pudesse acontecer, e sai pela tangente nos deixando com o volante na mão.
# Shazam!
Caloni, 2019-04-12 cinema movies [up] [copy]O novo filme da DC, Shazam, tenta convencer seu público que moleques órfãos de 15 anos podem vencer um vilão adulto que quer o poder mágico mais que tudo na vida. A história começa com a origem desse vilão, que é a mesma do herói, em uma economia narrativa bem-vinda, pois já se vão dezenas de filmes de origens, todos muito parecidos e esquecíveis (dica: assista apenas o do Homem Aranha e seja feliz). Shazam tem o espírito da inovação, um super-herói mirim, no corpo do convencional, na pele do ator que faz a série Chuck, Zachary Levi, que funciona como comédia, mas não exatamente como um garoto de 14 pra 15 anos.
Essa é uma mistura simpática entre elementos que referenciam, homenageiam e satirizam trabalhos anteriores (não necessariamente os mais recentes da produtora Warner) como Superman, e que escrito por uma trupe de roteiristas segue a mesma cartilha de super-produções que não podem arriscar demais. Na produção ele finge ser uma versão politicamente correta de Deadpool. Isso apenas no teor. Na fantasia ele sonha em ser o novo Homem-Aranha live action da DC, mas carece de polimento.
Dito isto, assiti-lo é uma experiência simpática, mas nunca empolgante. Sabemos de tudo do começo ao fim. Magia, amargura, vilão, emergência, magia de novo, piadas e resolução com uma lição de moral sobre família. De uma maneira torta Esquadrão Suicida usou a mesma fórmula. Toda a leva de filmes medíocres de super-heróis utilizam os mesmos elementos de maneira preguiçosa para carregar junto as melhorias significativas de direção de arte, figurino e efeitos visuais. Isso, sim, é impressionante.
Mas não espere uma grande história. Eu sei que duas décadas depois de começarmos a assistir pessoas fantasiadas voando é fácil pedir isso. Há muitos milhões investidos para alguém tentar inovar alguma coisa. Eu nem sei por que vou ao cinema para essa experiência. Saudosismo do Homem Aranha, talvez. Ou porque a pipoca costuma compensar. Mas ela anda tão cara...
# The ONE Thing
Caloni, 2019-04-12 books self [up] [copy]The ONE Thing é um livro que comecei a ler inspirado na dica do Robin Wieruch, que já leu um ou dois livros que eu também já li. Este é um clássico da auto-ajuda empresarial e começa ensinando umas poucas e boas para o leitor comum, mas é particularmente inspirador para quem já sabe que as lições de Gary Keller servem mais para ele do que para qualquer outro ser humano no planeta.
"Going small" is ignoring all the things you could do and doing what you should do.
There will always be just a few things that matter more than the rest, and out of those, one will matter most. Internalizing this concept is like being handed a magic compass. Whenever you feel lost or lacking direction, you can pull it out to remind yourself to discover what matters most.
Once you've figured out what actually matters, keep asking what matters most until there is only one thing left. That core activity goes at the top of your success list.
Say no. Whether you say "later" or "never," the point is to say "not now" to anything else you could do until your most important work is done.
Don't get trapped in the "check off" game. If we believe things don't matter equally, we must act accordingly.
The truth is that things don't matter equally and success is found in doing what matters most.
You don't need to be a disciplined person to be successful. In fact, you can become successful with less discipline than you think, for one simple reason: success is about doing the right thing, not about doing everything right.
The payoff from developing the right habit is pretty obvious. It gets you the success you're searching for. What sometimes gets overlooked, however, is an amazing windfall: it also simplifies your life. Your life gets clearer and less complicated because you know what you have to do well and you know what you don't. The fact of the matter is that aiming discipline at the right habit gives you license to be less disciplined in other areas.
When you do the right thing, it can liberate you from having to monitor everything.
Australian researchers Megan Oaten and Ken Cheng have even found some evidence of a halo effect around habit creation. In their studies, students who successfully acquired one positive habit reported less stress; less impulsive spending; better dietary habits; decreased alcohol, tobacco, and caffeine consumption; fewer hours watching TV; and even fewer dirty dishes. Sustain the discipline long enough on one habit, and not only does it become easier, but so do other things as well. It's why those with the right habits seem to do better than others. They're doing the most important thing regularly and, as a result, everything else is easier.
So how do you put your willpower to work? You think about it. Pay attention to it. Respect it. You make doing what matters most a priority when your willpower is its highest. In other words, you give it the time of day it deserves.
What taxes your willpower: Implementing new behaviors, filtering distractions, resisting temptation, suppressing emotion, restraining aggression, suppressing impulses, taking tests, trying to impress others, coping with fear, doing something you don't enjoy, selecting long-term over short-term rewards.
When you gamble with your time, you may be placing a bet you can't cover. Even if you're sure you can win, be careful that you can live with what you lose.
When you're supposed to be working, work, and when you're supposed to be playing, play. It's a weird tightrope you're walking, but it's only when you get your priorities mixed up that things fall apart.
No one knows their ultimate ceiling for achievement, so worrying about it is a waste of time.
When you allow yourself to accept that big is about who you can become, you look at it differently.
Big ideas: think big, avoid incremental thinking that simply asks, "What do I do next?", this is at best the slow lane to success and, at worst, the off ramp. Ask bigger questions.
A good rule of thumb is to double down everywhere in your life. If your goal is ten, ask the question: "How can I reach 20?" Set a goal so far above what you want that you'll be building a plan that practically guarantees your original goal.
Here's what I found out: We overthink, overplan, and overanalyze our careers, our businesses, and our lives; that long hours are neither virtuous nor healthy; and that we usually succeed in spite of most of what we do, not because of it. I discovered that we can't manage time, and that the key to success isn't in all the things we do but in the handful of things we do well.
Mark Twain agreed with Carnegie and described it this way: The secret of getting ahead is getting started. The secret to getting started is breaking your complex overwhelming tasks into small manageable tasks and then starting on the first one.
Voltaire once wrote, "Judge a man by his questions rather than his answers."
Sir Francis Bacon added, "A prudent question is one-half of wisdom."
Indira Gandhi concluded that "the power to question is the basis of all human progress."
The Focusing Question collapses all possible questions into one: "What's the ONE Thing I can do / such that by doing it / everything else will be easier or unnecessary?"
# A Última Casa da Rua
Caloni, 2019-04-14 cinema movies [up] [copy]House at the End of the Street apresenta a mega-star Jennifer Lawrence da série Jogos Vorazes descobrindo os podres do garoto bonitinho interpretado por Max Thieriot. O problema do material entregue pelos roteiristas é que esta é a velha fórmula do mistério se abrindo aos poucos com uma revelação nem tão bombástica assim, e a morte de uma personagem importante no meio não torna as coisas tão imprevisíveis também.
Além do mais, Lawrence é a boazuda da história, querendo ajudar o garoto cujo passado traumático envolveu a morte de seus pais pelas mãos de sua irmã, que acordou uma noite transtornada e decidiu tocar o terror com uma faca na mão. Ela e a mãe (Shue) se mudaram para uma grande casa ao lado porque, adivinhe, estava barata devido ao assassinato brutal da casa vizinha. O garoto continua morando lá e tem o apoio apenas do policial local, James Thomas, que parece ter o único objetivo de ir juntando as pontas e ser marcado para morrer.
Com um design de mistério (sombras, muitas sombras) e uma câmera inquieta que parece estar pronta para lançar a versão vídeo-clipe do trailer do filme, o diretor Mark Tonderai não tem muita ideia do que fazer com a história senão torná-la interessante através de sua decupagem, colocando momentos tensos através de closes e câmera tremida, ou apenas aumentando a tensão aumentando o número de cortes. Contudo, essas tentativas empalidecem frente à história clichê. Não há muito como melhorar uma história ruim.
Lawrence está linda e seus seios são o alvo da equipe de produção. Ela precisa tirar sua blusa e deixá-los sempre à frente das cenas de ação. Parece que ela foi escolhida para isso. Funciona para o público masculino (palavra de honra), mas ela não é atriz para esse tipo de filme. Alguém ouviu falar que ela fez um filme de floresta e decidiu que ela era boa escolha.
Mas não. Se o jovem Thieriot é o escolhido para fazer o papel de reviravolta e nunca sabemos quando ele saiu do armário, não será Lawrence que irá salvar este thriller legalzinho para assistir à noite, só deixando rodando junto com pipoca, doce ou outro snack à mão. Se assistir de galera talvez alguém se surpreenda.
# Coisa Mais Linda
Caloni, 2019-04-15 cinema series [up] [copy]Essa é uma série brasileira vintage que se passa em um Rio de Janeiro que parece feito em computador e fundos de cenários estilo papel de parede do Windows, com filtros exagerados que lembram a primeira vez que a TV Globo botou as mãos no sinal digital, em alta resolução, e misturou filtros com aquele saudosismo dos anos 90 a respeito dos anos 50.
Prova disso é seu feminismo chinfrim, ultrapassado, que tenta soar atual em um Brasil na década de 50. Uma mulher é abandonada pelo marido que foge com a amante e todo seu dinheiro. Ela viraria refém de seu pai, patriarca de família tradicional em São Paulo (que só pensa em negócios, claro), mas decide arriscar tudo porque sempre foi filhinha de papai e não entende o valor do dinheiro, mas tudo irá dar certo para ela, pois ela está em uma novela da Globo direto da Netflix.
# Meu Nome Não é Ruben Blades
Caloni, 2019-04-15 cinema movies [up] [copy]Rubén Blades é o cantor mais famoso do Panamá. Também já fez pontas de ator em Hollywood, se candidatou a presidente (foi nomeado ministro), faz ataques ferrenhos ao imperialismo americano enquanto mora em Nova York e defende o povo enquanto bebe água Perrier em seus shows. Ou seja, um membro da esquerda caviar básico. Isso tudo você aprende neste burocrático documentário.
O diretor e roteirista panamenho Abner Benaim precisa de um motivo para filmar esta produção patrocinada pelo governo argentino. Então ele usa o populismo das massas e mostra diversos shows lotados do cantor mais famoso do seu país. Abner Benaim parece gente boa olhando de longe, além de visivelmente inteligente.
Mas sabemos menos sobre a celebridade do que a pessoa. Contado como se todos já soubessem quem é o cantor de salsa, "Meu Nome Não é..." parte da base de fãs para um trabalho correto que apenas diz mais do mesmo para quem já o conhece e não diz muita coisa para quem ainda não é fã (e provavelmente nunca será, pois o filme não instiga a curiosidade).
De qualquer forma, quando o filme trata de reviver alguns momentos pessoais da vida do cantor o filme se torna um pouco mais interessante, mas ainda assim uma incógnita. Para que ele foi feito? Como uma simples homenagem em vida? Não é um filme provocante, pois não apresenta nada de novo. Também não é um filme debate, pois apenas apresenta um ponto de vista.
Sem saber direito por que fazem filmes sobre a vida das pessoas sem oferecer nada em troca (exceto ganhar um dinheirinho estatal), este filme com nome clichê é documentário clichê que passa como um episódio de tv. Da TV panamenha.
# Osmosis
Caloni, 2019-04-16 cinema series [up] [copy]Ah, se o amor fosse apenas um código em um computador orgânico -- aka nosso cérebro -- e que fosse possível descobrir sua alma gêmea simplesmente analisando esse código. E se essa série distópica da Netflix, baseada em uma versão mais romântica e dramatizada de um episódio de Black Mirror, fosse francesa, e exibisse todas as formas de amar de um futuro próximo? Bom, aí nós teríamos que perder uma hora assistindo ao piloto para concluir: ideia interessante. Poderia ser um bom filme. Mas séries estendem demais conceitos simples.
E aqui há pequenos elementos que se unem para formar uma narrativa repetitiva que tenta abordar o tema do amor perfeito (ou a sua eterna busca) de várias maneiras, além de uma corrida contra o tempo para que a solução final fosse descoberta.
Esta é mais uma das séries que gosta de brincar com o conceito de nossos cérebros serem não apenas maleáveis, mas facilmente traduzíveis. Um dos seus trunfos é entender que as questões não são tão simples assim.
# Mormaço
Caloni, 2019-04-18 cinemaqui cinema movies [up] [copy]Mormaço tem a cara da ficção do documentário Favela Olímpica. Ambos são sobre as consequências das Olimpíadas no panorama da desigual cidade do Rio de Janeiro. E ambos chegam atrasados aos cinemas, mas felizmente (ou infelizmente) sem perder a atualidade.
O tema escolhido pela diretora Marina Meliande lembra muito o que o cineasta Kleber Mendonça Filho discute em seus filmes sobre o sistema opressivo do poder que esmaga as relações sociais e desencadeia uma degradação lenta, mas fatal, da sociedade como um todo. Porém, a visão que Marina nos traz se distancia de O Som ao Redor ou Aquarius (para citar trabalhos de Mendonça) porque ela traz um nível de humanidade que se materializa no problema principal, conseguindo assim um poder de síntese admirável.
Além disso, é muito satisfatório constatar que o que vemos no final está ancorado com os símbolos do começo quando vemos uma visão micro do que nos espera. Uma formiga carrega outra visivelmente seca. O musgo ao lado de uma queda d'água se expande. Em corte abrupto avistamos o Pão de Açúcar. Uma ponte se explode. A fumaça da explosão se apresenta de diferentes formas, todas cobrindo seus cidadãos, pela cidade.
O palco desse tenso drama com leves toques sobrenaturais (ou metafísicos) é a cidade do Rio de Janeiro, uma vez maravilhosa, mas que hoje vive uma decadência trágica causada por crise econômica, especulação imobiliária e o consequente caos urbano. E o pilar humano dessa história pertence a Ana, que trabalha na defensoria pública e luta pelos moradores da Vila Autódromo, um bairro de moradores de mais de quarenta anos e que agora está sendo desapropriado pela prefeitura para a construção de empreendimentos relacionados às Olimpíadas.
Além do mais, Ana mora em um prédio tradicional de classe média que também está em risco de ser substituído por outro empreendimento corporativo, e se relaciona com o engenheiro responsável por avaliar os apartamentos. E isso é apenas a ponta do iceberg de um filme que realiza conexões narrativas e temáticas de uma maneira tão simples que parece fácil, mas é fruto de um trabalho monstruoso de edição e direção.
Os roteiristas Felipe Bragança e Marina Meliande não conseguem traduzir exatamente em palavras o que querem dizer, mas isso torna o visual do filme muito mais importante, o que é ótimo porque nesse aspecto o trabalho conduzido por Meliande arrebenta em seus conceitos. Além disso, vários de seus diálogos e frases no filme querem dizer mais do que simplesmente sua primeira camada. Por exemplo, ao lado da construção de um estádio para o grande evento da cidade está escrito: "As Olimpíadas deixam muito mais para o Rio". E algo que supostamente era para ser positivo, nós sabemos graças ao tom angustiante do longa, está longe de o ser.
Suportado por um trabalho de maquiagem e direção de arte impecáveis, é recompensador observar a perda gradativa de luz e cores nos ambientes (como o aumento de folhas mortas) que vamos nos acostumando conforme acompanhamos a rotina desgastante de Ana, que sofre de uma doença desconhecida com fundo psicológico que a faz sentir um calor acima do normal para quem mora no Rio e que começa a ser afetada fisicamente por isso.
Aliás, a escolha de Marina Provenzzano como Ana é igualmente um símbolo. De pele clara e significando pureza, sua personagem aos poucos vai sofrendo o peso de ser uma mártir em uma cidade que a está esmagando por todos os lados, e lentamente. Provenzzano faz uma Ana corajosa, mas que está perdendo o rumo de suas ações. E o filme a utiliza como o símbolo final, para satisfação dos espectadores do Cinema que ultrapassa alguns limites da realidade para ascender como algo que não nos esqueceremos tão cedo.
# Décimo-Quarto Encontro CCPP42BR
Caloni, 2019-04-19 ccppbr [up] [copy]Foi definido recentemente no nosso grupo de Telegram que nosso próximo encontro será realizado na cidade de São Paulo no dia 6 de julho de 2019. Como nossa última tentativa falhou miseravelmente por falta de inscrições suficientes estaremos iniciando a organização primeiro pelas incrições, e, havendo quórum, será feita alocação de sala(s) e coffee-break. Em paralelo iniciaremos o call for papers, onde você é convidado a palestrar em nosso encontro.
As inscrições terão o preço inicial definido em R$ 30,00 (trinta taoqueis). O pagamento poderá ser feito pelo PagSeguro. Se está interessado em palestrar envie sua proposta na página do CFP. Se atente às datas limites para envio do abstract e do conteúdo. Vá no site oficial do grupo para ficar antenado das últimas atualizações sobre o evento.
# O Homem Que Copiava
Caloni, 2019-04-20 cinema movies [up] [copy]A sinopse do IMDB diz assim: "André, relatively poor, falls in love with Silvia, a neighbor whom he spies with a telescope." Relatively poor é o que me chamou a atenção, pois isso diz muito sobre o filme. Que é relativamente excelente.
É relativo porque enquanto sua primeira metade esbanja técnica narrativa visual o seu final vai se desenrolando por caminhos que ultrapassam o absurdo fácil demais para continuarmos no mesmo espírito de seu começo, que é ingênuo, mas ao mesmo tempo profundo. Caminhamos pela mente de André, este operador de máquina de fotocópia, e observamos o seu mundo através de seu ponto de vista, que é simples, humilde, e com conhecimento recortado dos vários relances que faz de todo o material que copia de outras pessoas todos os dias.
Para isso repare como o diretor e roteirista Jorge Furtado realiza sua decupagem de maneira cirúrgica. Enquanto André revive uma passagem de uma estrofe de Shakespeare que leu por acaso vamos observando corte a corte as cópias que saem da máquina que opera, acompanhando cada palavra ressaltada pelo enquadramento ligeiramente diferente a cada momento. E um momento de poesia visual e ao mesmo tempo dinâmica, em um filme que explica as coisas como resultados parciais do Google (e isso em 2003).
Da mesma forma, a rotina de André, como toda rotina, se repete, e isso vira mais uma rima sobre as inúmeras cópias que André realizou em seu trabalho, além de se juntar com sua verdadeira paixão: desenho. Em particular quadrinhos. Dessa forma, acompanhamos em formato de gibi os movimentos detalhados de sua mãe momentos antes de ir dormir. A sua frase "boa noite, filho, estou indo dormir; televisão me dá um sono..." é repetida vezes suficientes para entendermos que a rotina no universo do filme é mais uma cópia, e André nada mais é que a cópia de um dos inúmeros garotos que tiveram seu destino selado com o abandono do pai.
Mas nada disso fica verbalmente claro em O Homem que Copiava, que respeita a inteligência do espectador e espera que ele mesmo analise o filme, ainda que de forma inconsciente, e descubra sobre as diferentes camadas que ele deseja falar. Enquanto isso acompanhamos um romance fofo e puro entre ele e a menina que mora ao lado, Sílvia. É isso que move o filme por caminhos tão imprevisíveis que nos faz lembrar das desventuras de outra heroína no mundo dos tímidos chamada Amélie Poulain.
Porém, este também é um mundo mais natural, ainda que fantasioso em várias partes. Os amigos que André conhece são todos gente boa, incluindo sua colega de trabalho que só pensa em casar com um homem bem-sucedido, a voluptuosa, ao mesmo tempo que ingênua de sua forma, Marinês (Luana Piovani). E podemos dizer isso também de seu namorado mais velho, Cardoso, que soa mais patético ainda nesse trio (que se tornará quatrilho) por ser o mais velho de todos. Cardoso é interpretado por Pedro Cardoso, da série A Grande Família, com um humor mais dramático, e chegamos até a devanear um pouco sobre como o sujeito foi parar na loja de velharias que trabalha.
Mas esta não é uma qualidade apenas de Cardoso, já que Lázaro Ramos e Leandra Leal formam a verdadeira alma do filme, com caras e trejeitos meticulosamente planejados para criar um romance daqueles imortalizados pela pureza que emana, que faz lembrar inclusive um soneto de Shakespeare, ou um Romeu e Julieta inteiro. Ambos estão interessados um no outro, mas a cadência com que as coisas acontecem é o que faz a diferença de um simples relacionamento que inicia no primeiro contato. Ambos são "relativamente pobres", e ser pobre é também um dos motores do filme.
Esta é uma produção brasileira na época que a indústria ainda engatinhava com programas de apoio do governo e tecnologia de som porca. Mas Pedro Furtado é um cineasta de talento e sua equipe é competente, e por isso este filme soa como um trabalho sisudo do começo ao fim. Não sentimos as limitações técnicas porque este é um filme feito por pessoas que tiram água de pedra na hora de cada um fazer a sua parte.
Eu não acho que O Homem Que Copiava termina muito bem. Depois que um evento extraordinário acontece, logo em seguida a outro mais extraordinário, e duas coincidências incríveis acontecem, o pano de fundo fantasioso de nosso protagonista não é suficiente para manter a suspensão de descrença. Mas, ainda assim, é capaz que você goste muito mais do que eu. Há trabalhos que envolvem uma estética particular, um gosto de gênero que tornam nosso julgamento míope. Esse pode ser, sim, um filme relativamente excelente.
# A Garota Que Conquistou O Tempo
Caloni, 2019-04-22 cinema movies [up] [copy]Netflix, fui tapeado! Pensei que iria ver uma animação sobre viagem no tempo no estilo Steins;Gate e acabei vendo um filme de menininha japonesa. Com quem devo ficar? Oh, meu deus, de quem será que eu gosto? Este também é um filme sobre uma pessoa que volta no tempo apenas para comer seu pudim antes da irmã.
A animação em si é consistente e agradável, embora nada original. Foca mais nas formas e possui a paleta típica de animações dos estúdios Ghibli (de Hayao Miyazaki). Quando os personagens estão longe não vemos suas faces. E há um quê de Makoto Shinkai (do sucesso pop adolescente Your Name) quando vemos a jovem Riisa saltando em câmera lenta ou em um still para fazer o pôster do filme.
Mas este é um filme do diretor japonês Mamoru Hosoda, de quem a Netflix comprou um pacote de filmes para mostrar em seu serviço de streaming. Este já é um filme "velho", de 2006. Dele você também irá encontrar Crianças Lobo, Mirai e... Digimon: O Filme? Espero que não.
A história é simples e reutiliza elementos porque este é um filme sobre viagem no tempo. Uma garota entra no laboratório do colégio e é afetada por um dispositivo que ela não percebeu do seu lado que possibilita a ela realizar saltos no tempo. Ela usa pela primeira vez para salvar a própria vida quando é lançada em frente a um trem porque os japoneses passaram o trilho de um trem entre duas subidas íngremes no meio da cidade, aparentemente na esperança de filmar mortes bizarras. A segunda vez que ela usa é para comer o pudim na frente da irmã.
E não melhora. Centrado em um relacionamento da jovem com dois garotos com quem joga beisebol, os detalhes da trama você vai ouvindo de um ou outro personagem no meio dessa história que parece preparada para virar série (já tem até música-tema). Quando a garota descobre que um dos garotos está afim dela e a convida para sair ela decide voltar no tempo várias vezes até que ele não a convide mais em vez de simplesmente falar não. Isso tem muito mais a dizer sobre a cultura japonesa, mas pode também ilustrar como qualquer um de nós tenta de todas as formas sair de situações difíceis da vida por um atalho.
Mas momentos como esses são apenas lapsos em uma historinha convencional que sequer precisaria de um elemento de sci-fi. O dispositivo de viajar no tempo parece mais uma muleta narrativa e uma forma da jovem Riisa saltar de várias maneiras diferentes (e cair também) como mecanismo cômico e de estilo.
Fica bonito, mas não é exatamente profundo. Assista sem prestar atenção.
# A Sombra do Pai
Caloni, 2019-04-22 cinemaqui cinema movies [up] [copy]A diretora Gabriela Amaral veio da televisão mas no cinema brasileiro está se revelando uma excelente contadora de histórias. E com A Sombra do Pai, segundo longa após Animal Cordial, o gênero terror em terras tupiniquins começa a ganhar uma desenvoltura própria mesmo que referencie os clássicos mundiais inconfundíveis sobre além-túmulo.
Mas o que Amaral está trabalhando aqui vai além da história e diz muito mais em como se conta ela. Ao descrever para nós essa família com seus membros isolados cada um em seus próprios medos o filme ganha o tom de terror pelos elementos naturais que vão acrescentando à nossa psique a presença do sobrenatural de uma forma natural e convincente, tanto que quando algo de fato ocorre não parece destacado de todo o resto, mas uma continuação do que estávamos vendo.
A pequena Dalva (D'Alva, do Branco), interpretada com muita presença pela atriz-mirim Nina Medeiros, é uma criança acostumada com o sobrenatural e que, de acordo com sua tia, Cristina (seu nome também remete a algo: cristã católica), possui o dom de realizar desejos dos vivos no mundo dos mortos. A tia adverte, contudo, que ela deve usar esse dom apenas para o bem, pois o mal sempre volta para quem o fez, de uma forma ou de outra.
Luciana Paes está em segundo filme da diretora e aqui faz aquele personagem comum, que teme o sobrenatural, mas que ao mesmo tempo pede uma ajudinha para Santo Antônio para conseguir um bom partido. Acostumada com mandingas que vieram desse nosso folclore misturado de várias culturas, envolvendo santos e simpatias pagãs (e muitas vezes envolvendo sangue para maior força), sua Cristina fala com um sotaque e um trejeito que disfarça o roteiro com um tom natural magistral. Cada fala de Luciana Paes é um prazer no filme por resgatar a simplicidade e o medo da pessoa comum.
Já para a pequena Dalva a morte da mãe é uma situação material, mas nunca definitiva. Ela observa seu pai, Almir (Dinho Lima Flor), e vê claramente que ele nunca conseguiu se recuperar da morte da esposa, e por isso nunca foi um pai presente.
Os detalhes da trama misturam sobrenatural com drama de maneira eficiente, mas por este ser um filme do gênero terror ele puxa muito mais para o lado sombrio. Dalva nunca sorri e raramente responde uma pergunta. Seu pai está sempre caminhando como que carregando um pesado fardo em suas costas. Ele trabalha como pedreiro, e faz muito sentido estar sempre cansado. E aproveitando essa profissão do personagem, quando ela é falada o filme corta para o túmulo de sua falecida esposa sendo exumado, quebrando os tijolos que a sepultaram. Ou seja, este é um trabalho com o gênero bem pensado. Não se trata de aspectos do terror jogados casualmente. Este é o melhor terror: o que existe na vida dos personagens.
Talvez o maior pecado do longa seja mesmo em não conseguir criar algo novo. Referenciando todo o tempo os trabalhos Cemitério Maldito, onde o desejo pelo retorno dos mortos queridos causa uma maldição em uma família, e A Noite dos Mortos Vivos, clássico do cineasta George Romero, sobre a noite em que os mortos decidem voltar e se vingar dos vivos, toda a atmosfera da história está sendo montada em cima dessas duas fáceis referências, tornando este terror brasileiro um ponto de entrada acessível para o grande público, mas se sabotando quando a questão é transcender o velho jogo da morte.
Por outro lado há uma criatividade latejante neste filme, que recicla suas referências com bom humor, como a figura do soldador como uma espécie de Ceifador das almas na Construção Civil. E nada pode ser mais assustador do que a imagem de dentes plantados em um copo como se fossem feijões de um trabalho escolar repousando sobre o criado-mudo de uma criança, ao lado dos cabelos de sua falecida mãe.
A Sombra do Pai é um terror dos bons, que referencia os clássicos e ainda possui uma identidade brasileira, que se aproveita de nossa enorme mescla de crendices e formas de enxergar o pós-vida. É de fácil acesso para o grande público, possui uma equipe técnica de talento (principalmente de fotografia, que consegue mostrar muitas cenas noturnas sem comprometer a qualidade) e acima de tudo uma diretora extremamente competente em controlar sua obra. E não é um prazer saber que há uma diretora brasileira que poderá dirigir mais filmes do gênero dialogando com nossa realidade?
# Necrópolis
Caloni, 2019-04-22 cinema series [up] [copy]Esta série é um bom exemplo de como fazer conteúdo engraçado sem pretensão alguma e um orçamento menor ainda que a pretensão e ficar bom. Bom, bom eu não diria. Ele fica exatamente como você esperaria que ficasse um vídeo com você e seus amigos em uma tarde preguiçosa e criativa.
Ela conta a história de um escritório do IML (Instituto Médico Legal) em que a última alternativa de médico residente foi o fracassado Richard (Rafael Pimenta), que estudou cinco anos para passar em uma faculdade particular de medicina e se formou e se endividou no processo, se tornando "doutor". Você vê, a comédia já começa com tons de crítica social sobre o péssimo sistema de ensino nacional.
Usando o gore misturado com o descaso e um pouco de novela, Necrópolis em seu piloto demonstra não irritar o espectador com tantos zooms ritmados porque seus personagens são tão ridículos que a suspensão de ridículo fica no automático. Após os primeiros minutos não rimos mais da produção da série porque dá pena e começamos a rir das situações. Elas são criativas e dinâmicas. Algo bem brasileiro: criatividade demais, dinheiro de menos.
# Amor e Revolução
Caloni, 2019-04-23 cinema movies [up] [copy]Esse filme com a Emma Watson, a Hermione que virou feminista (portanto feia), conta uma história baseada em fatos reais como um drama, mas vira uma piada pronta. Começa com os bonitos revolucionários comunistas tentando se proteger do feio golpe militar de direita, mas quando o casal de crushes são enviados para um campo de trabalhos forçados onde se planta e se descasca muita batata e onde ninguém pode sair, ou seja, o paraíso comunista, eles não gostam. Difícil agradar jovenzinhos revolucionários.
A Hermione é uma guria que ficou magra demais, deve ter feito uma dieta comunista para se preparar para o filme. Aqui ela faz uma aeromoça alemã falando inglês, mas não tem problema porque nesse filme todo o Chile fala inglês (graças ao imperialismo ianque). Ela tem o seu amorzinho com um cara que tira excelentes fotos, mas depois do golpe ele é levado para a sala de tortura e vira um retardado. Mas peraí, ele já não era comunista?
Ah, não, agora ele está fingindo ser retardado. E Hermione entrou na dança também, indo se hospedar em uma Auschwitz para nazistas em plena América do Sul. Por um breve momento sinto um ar de O Conto da Aia misturado com 1984.
Mas a real é que o dono do lugar é um sacerdote cristão moderno (Michael Nyqvist dando medinho), que come criancinhas, mas mantém velhos hábitos da igreja, como bater em mulheres submissas. Não que isso seja exclusividade dos religiosos, como já demonstraram os negros norte-americanos e sua aclamada cultura do "nós é que temos o direito de bater em nossas mulheres".
Voltando para o filme. Ele tenta ser sério e dramático, com trilha sonora triste e roupas cinzentas, mas os homens que se reúnem para bater nas mulheres de noite parecem uns retardados, repetindo frases de apoio genéricas como "yeah", "isso mesmo", "vai fundo". Não é bem assim que você reproduz uma seita patriarcal, assim como não é separando por completo homens e mulheres que você deixa os homens felizes.
Ou todos são gays, o que faria sentido... Mas lembrei de um fato mais curioso ainda. Diz a historinha que esse lugar existiu por quarenta anos e que o regime Pinochet não assumiu nenhuma responsabilidade pelo apoio a esse maluco. Porém, a seita já existia antes, como se pode verificar pela moça que ia casar, que disse que estava lá desde os 9 anos. Algo errado não está certo.
Ou o roteiro foi feito por um comunista feminista. Elxs não costumam ser bons de lógica, mas em contrapartida têm a melhor dieta pra emagrecer. Você viu como está a Hermione?
# Atentado ao Hotel Taj Mahal
Caloni, 2019-04-24 cinemaqui cinema movies [up] [copy]O que mais impressiona em "Atentado ao Hotel Taj Mahal", um thriller biográfico tenso, pesado e claustofóbico, é que apesar de (ou por causa de) toda a brutalidade que vemos na tela, causada por diferenças culturais e conflitos políticos, aos poucos nele emerge um senso de humanidade que é livre de gênero, nacionalidade, posição social ou dinheiro. Quando pessoas estão à beira da morte é o momento em que surgem os heróis anônimos, seja em pequenos atos, como manter um bebê no colo todo momento ou tentar tranquilizar uma mulher inconsolável com um uísque 20 anos, ou em verdadeiros exemplos de hombridade, como se manter fiel ao comprometimento de um trabalho, mesmo que para isso seja necessário deixar de lado os valores mais sagrados que se tem em vida.
Essa camada interpretativa por trás da ação desenfreada é desenvolvida de maneira sutil e controlada pelo diretor Anthony Maras, que estreia em longas-metragens com um trabalho onde demonstra possuir um controle invejável da ação e dos pequenos momentos onde a história ganha contornos mais complexos entre seus personagens, e isso em um filme que não tem muito tempo para isso, pois quase todas as duas horas do filme são ocupadas com muita violência e pouquíssimos diálogos. Vemos apenas tiros, mortes, gritos e sangue. Tudo isso coordenado por uma voz de um rosto que nunca vemos (uma ótima ideia manter o "mal absoluto" sem face).
Estamos testemunhando sob o filtro da ficção o que realmente houve em 2008 em Mumbai, capital financeira da Índia, durante atentados realizados por toda a cidade, mas a maioria ao Sul, na região mais rica. Um dos 12 ataques registrados foi no Taj Mahal Palace Hotel, um prédio centenário que hospedou líderes de Estado e celebridades. A maior parte da ação e do filme se passa nesse hotel, e acompanhamos hóspedes e funcionários durante a luta pela sobrevivência quando dois jovens entram com armamento pesado e começam a atirar em qualquer alvo vivo.
Para que o espectador se sinta desorientado o filme nunca nos mostra a localização exata dos locais onde os hóspedes estão se escondendo, e muito menos a localização atual dos atacantes. Isso gera sempre a sensação de que ao atravessar um corredor seremos pegos de surpresa por um deles e sua arma semi-automática, sem chance de reação. Não é uma sensação boa, mas se torna importante para entendermos melhor o significado das ações dessas pessoas tentando sobreviver.
O roteiro escrito pelo diretor e por John Collee parece evitar todo e qualquer clichê desses filmes. Claro que eles estão narrando acontecimentos reais, mas com muita dramatização. Só que isso não impede que tudo soe plausível. Isso porque não teremos aquele personagem que está sempre causando problemas e que vai acabar se dando mal no final, ou conflitos artificiais entre os atacantes que faça com que surja uma oportunidade para os reféns escaparem. Além disso, Collee nunca nos dá um motivo para que determinado personagem morra, e assim nos sintamos menos mal com isso, o que é a forma mais digna de demonstrar respeito pelas vítimas reais. Cada acontecimento dentro daquele hotel parece que poderia acontecer de verdade, e isso depois de tantos filmes repetindo a mesma fórmula é digno de aplausos, pois finalmente é possível assistir um filme com pessoas multidimensionais reagindo como qualquer ser humano.
O tom realista também facilita acreditarmos na humanidade daquelas pessoas e até nos faz refletir na humanidade de quem geralmente não é bem visto, pois aquele milionário russo da mesa ao lado do restaurante que falava ao celular de maneira grosseira acaba ajudando uma esposa e mãe desamparada a se acalmar (e mesmo que você interprete esse ato de maneira bondosa não é possível rotulá-lo apenas como boa ou má pessoa), e aquele funcionário relapso que veio sem sapatos para trabalhar acaba se tornando o herói do dia.
Mas é claro que você sabe que ele será o herói. Ele é interpretado por Dev Patel (Quem Quer Ser Um Milionário, Lion) e é o ator mais famoso de um elenco acertadamente low profile, o que colabora para o realismo do filme. Porém, Patel é instrumental em seu papel, pois suas ações são as mais ousadas, exigindo que nos identifiquemos desde o começo como uma figura humana e com valores que reflitam caráter. Por isso ele é que inicia o filme, sendo o pai de família responsável e carinhoso. Seu jeito manso mas firme e ligeiramente assustado de lidar com as situações é perfeito para contrapor ao seu chefe, que já demonstra mais experiência e auto-controle. Não saber ao certo como seu personagem irá reagir a cada situação adiciona uma bem-vinda imprevisibilidade que todos nós, humanos, temos ao lidar com situações de estresse.
Muitas pessoas morrem nesse filme. Pessoas que você não veria morrendo em filmes mais formulaicos do mesmo gênero. Essa é uma surpresa e ao mesmo tempo um aviso: este não é um filme sobre os heróis daquele dia que sobreviveram, mas sobre todos os envolvidos, os que mataram e morreram. A mensagem que se pode extrair de "Atentado..." não é algo simples e fechado, o que é algo positivo para um filme que parece banalizar a violência. Parece, mas é justamente o contrário: através do seu uso da violência aprendemos sobre o mundo cada vez mais irracional que vivemos, e ao mesmo tempo sobre valores que estavam inertes na sociedade, mas que foram vitais aquele dia para salvar mais uma vida.
# Bonding
Caloni, 2019-04-24 cinema series [up] [copy]Bonding, ou Amizade Dolorida (como está na Netflix Brasil), é uma série curtinha, que quase pode ser um filme, se tivesse a ousadia de implementar um closure no final de sua temporada. Mas não importa: é um conteúdo solto. Livre, leve e solto. Ele trata de traumas de adolescência, sexo e fetichismo de maneira a abraçar o mundo. E é um abraço gostoso e engraçado.
É mais ou menos essa a impressão dessa série que possui um elenco afiado para sua história, que envolve a amizade entre um gay/bi e uma garota atormentada pelos rapazes do colégio. Eles "cresceram" e resolveram seus problemas desenvolvendo diferentes fetiches sexuais. Ela é uma dominatrix, e trabalha com isso. Ele é um fudido, e trabalha para ela como assistente. E tem fetiches por pés.
Os personagens que vão se acumulando nos curtos episódios são assim como eles engraçados e espirituosos. Não é que o roteirista escreveu frases de efeito para todos eles e foi distribuindo. As piadas funcionam do ponto de vista de cada um deles. Este é um trabalho acima da média da Netflix, pois vitimiza pouco os bizarros que tenta homenagear/prencher cota, preferindo dessa vez comemorar as diferenças.
E nesse sentido temos um movimento semelhante à série Community, quando os nerds foram homenageados como deveriam, difernete da série comunzinha The Big Bang Theory. Quer dizer, é este movimento, mas para variantes sexuais. Os especialistas da área da saúde talvez pirem, mas bem feito para eles, que dependem que as diferenças comportamentais dos mortais existam e sejam tratadas como doença.
# Special
Caloni, 2019-04-24 cinema series [up] [copy]Ryan O'Connel criou e é o astro de sua própria série. Ele tem paralisia cerebral, é gay (pelo menos na série) e não tem vergonha de sair do armário. Por ser gay. Já por ser aleijado...
Esta é uma série de humor negro, e apenas por isso eu a recomendo. Mas há mais coisas. Ele vai trabalhar em uma revista de millenials. Tem um cara usando suspensórios. A estrela do lugar é uma gorda porque ela vive escrevendo artigos sobre o orgulho de ser gorda. Ela diz no piloto: "falar sobre sua condição te libera; você acaba possuindo o que diz e ninguém mais pode controlar". Eu não tenho palavras para tamanha sensibilidade e falta de vitimismo. Esta é a série que estava esperando sair do armário depois de tantas tentativas frustradas (como o medíocre Atypical).
# Mademoiselle Paradis
Caloni, 2019-04-26 cinemaqui cinema movies [up] [copy]Mademoiselle Paradis segue a cartilha dos filmes de época, mas não deveria. O filme é muito mais do que isso, abordando temas como etiqueta e a dualidade entre ser medíocre em tudo ou sacrificar uma vida para ser algo pelo qual será lembrada.
Baseado em fatos históricos e inspirado pelo livro de Alissa Walser (Mesmerized), sua heroína é Maria Theresia Paradis, uma moça que desenvolveu cegueira completa pela idade de três anos. Tocando o piano de maneira impecável, seus pais parecem adestradores orgulhosos de sua filha nas exibições que realiza em sua casa.
Ninguém possui tato no século 19 e os deficientes são tratados como um estorvo e julgamentos estéticos são ditos na cara (uma de suas "amigas" a diz "depois do tratamento sua cabeça começou a feder e seus olhos ficaram ainda pior"). Como se não bastasse, os "cientistas" da época tinham à sua disposição uma vasta gama de experimentos completamente anti-éticos a ser realizados em seus pacientes.
Um deles, Franz Anton Mesmer (Devid Striesow), tem tido êxito com vários pacientes usando o "poder mágico" do invisível e indetectável (e indolor) eletromagnetismo, o que causa um frisson na comunidade. Infelizmente estão todos cegos nesse mundo da realeza e ninguém percebe que na verdade cuidado e atenção são o segredo para as curas milagrosas.
Este é um filme sobre como pessoas vistas como inferiores (em sua maioria mulheres, aleijados e criados) são tratadas como objetos, das mais diferentes formas. Se é uma serviçal assediada, é apenas um incômodo que ela tenha engravidado. Se uma criança demente sofre um acidente fatal, talvez fosse melhor assim em vez de viver uma vida miserável.
Mas esses são detalhes de um filme longo e cansativo dirigido pela austríaca Barbara Albert, que não consegue fluir sua narrativa e ainda por cima decide não usar nenhuma trilha sonora artificial, o que torna algumas longas sequências onde quase nada acontece quase insuportáveis. Ele repousa quase inteiramente no talento da atriz principal, Maria Dragus.
Dragus nos dá a exata sensação de alguém fora de qualquer categoria estável do mundo onde nasceu. Sua esperança era se tornar exímia pianista, mas quando ela começa a enxergar um pouco ela passa a não fazer nenhum dos dois direito. Os seus olhos se reviram de uma maneira completamente caótica, em uma mistura de paixão e passividade. Sua dor é sentida pelos seus agitados movimentos, mas ao mesmo tempo a alegria de fazer algo (tocar piano) tão bem feito.
Infelizmente este é um filme disposto a descrever a História de maneira burocrática, que apenas pincela alguns comentários sociais. O resto é pura direção de arte de época, com figurinos bordados à mão e as bonitas músicas tocadas ao piano por Paradis. É bonito, mas oferece pouco aos mais ansiosos por comentários atuais sobre uma época grotesca.
# Special Primeira Temporada
Caloni, 2019-04-26 cinema series [up] [copy]Tenho algo a confessar: o piloto de Special mentiu para mim. Pensei que seria uma série de humor negro onde alguém com paralisia cerebral seria atropelado constantemente por um carro. Mas não é. Está mais para um programa preenchendo cota para deficientes. E deficiente no caso físico, emocional e mental.
Nunca é explicado na série o que é realmente um paralítico cerebral, mas a conclusão que chegamos no final é que se trata de uma pessoa que não consegue fazer algumas coisas como amarrar sapatos e embaralhar cartas, mas outras sim, como usar o celular e o computador.
Mas só se o computador usar Windows. Essa série é patrocinada pela Microsoft e usam até a Cortana. Quer pior vergonha que isso?
De acordo com Ryan, sim. Ele fica a temporada inteira mentindo sobre um detalhe que ninguém realmente liga. Atropelado por um carro ou paralítico de nascença, no fundo o único com problemas em aceitar essa condição é o próprio Ryan. E uma série que começa tão bem nas piadas vira um show de autopiedade.
Special se aproxima de outra série Netflix chamada Love, onde toda a trama é tipo um Big Brother do bem e ficção. Os acontecimentos das duas séries em cada episódio são coisas do tipo "agora fulano vai fazer sexo pela primeira vez", e o que acontece? Ele faz sexo pela primeira vez. "Que legal!", exclama a única pessoa que achou o plot interessante (o próprio roteirista).
Chega uma hora que a Netflix pausa e pergunta: "tem alguém assistindo essa série?" (Eles fazem isso quando vc deixa os episódios passando no auto-play). E a resposta é "não, mas pode continuar passando; eu não ligo mais, mas vou escrever sobre essa bosta de qualquer jeito".
# Corra, Lola, Corra
Caloni, 2019-04-27 cinema movies [up] [copy]Esse filme é o prêmio que todo cinéfilo espera depois de assistir a vários filmes medíocres que seguem a mesma fórmula. "Corra, Lola, Corra" não é um deles. Ele quebra barreiras linguísticas (sobre a linguagem do cinema). Ele explora a mescla entre realismo e fantasia. Ele permite que o espectador acompanhe três versões de roteiro e as compare. E ele tem uma das trilhas sonoras mais perfeitas do cinema.
A heroína é Lola (Franka Potente), que se veste como personagem de vídeo game e com seu cabelo vermelho a destaca do mundo que a cerca. Ela precisa correr. Seu namorado, Manni (Moritz Bleibtreu), precisa de 100 mil em 20 minutos ou está morto. Ele perdeu o dinheiro para um mendigo, que aliás é uma pessoa de carne e osso e não esses estereótipos de mendigo de filmes nova-iorquinos zumbificados.
Este é um filme que foi infeccionado pelo vírus do vídeo-clipe. Ele inteiro parece um. E isso não é uma coisa ruim, pois é exatamente isso que essa história precisa para ganhar dinamismo. Lola sai correndo pelo corredor e ao descer as escadas vemos na tela da TV de sua vizinha o desenho dela própria correndo uma escadaria infinita. Aparece um obstáculo: um garoto e seu cachorro raivoso. Você não os vê em detalhes no filme, apenas no desenho. E isso instiga nossa mente a trabalhar com uma versão da realidade levemente fantasiada, onde alguém gritando pode estourar vidros.
A direção desse filme está obcecada em perfeccionismo. Há muitas cenas que você sequer percebe o virtuosismo técnico, mas ele está lá. Está nos ângulos que a câmera se coloca dentro da cabine telefônica onde Manni espera por Lola. Está em Lola correndo vista de cima e sem cortes vista de frente. Está em um cassino onde a bola caindo na roleta possui uma física impossível. (Tenho quase certeza que eles tiveram que fazer um modelo aumentado para esse efeito, e ao tentar pensar nos efeitos é revelado o quão intrincado é fazer um filme desse.)
Ele é rico em linguagem também. Usa o som de uma câmera fotográfica e fotos de possíveis futuros das pessoas que Lola encontra pelo caminho (o que também nos faz pensar constantemente em quando será o destino de Lola e Manni). Este filme também está infectado com o vírus do efeito borboleta. E por falar em fotos, ao final de cada versão da história de Lola e Manni os vemos em um lugar coberto da luz vermelha, como se eles fossem negativos a ser ainda revelados, seu destino ainda incerto. Isso é poesia em sétima arte.
Nunca um filme foi tão conciso, ritmado, ambicioso como esse. Ele confia completamente em sua premissa e nunca a larga, investindo cada segundo em deixar o espectador grudado na tela contando os segundos. Há filmes que deixam um gosto ruim na boca porque prestamos atenção demais para algo que não merece o nosso respeito. "Corra, Lola, Corra" não é um deles. Pode mergulhar fundo, a recompensa estará espalhada pelo percurso. Por três voltas.
# I Think You Should Leave With Tim Robinson
Caloni, 2019-04-27 cinema series [up] [copy]Essa é mais uma das séries de comédia da Netflix que começa com suas melhores piadas no piloto e vai piorando. Ela tem uma pegada Monty Python de experimentação misturado com os canais da tv interdimensão de Rick & Morty, mas não consegue dar o salto final para o abismo. São quadros até que bem bolados, mas quase nenhum deles sabe bem quando parar. Alguns cedo demais, a maioria tarde demais.
O que torna engraçado esse estilo, como o grupo responsável por Flying Circus deve ter descoberto aos poucos, é essa sensação de estar com um pé fincado no chão e o outro em um lamaçal absurdo; quanto mais você mexe o pé (leia: continua na piada) mais seu pé no chão se levanta e mais seu pé no lamaçal afunda. O truque da comédia é saber quando parar antes de morrer afogado. OK, essa analogia foi péssima.
# Const Int Pointer Var
Caloni, 2019-04-29 computer [up] [copy]A melhor forma de declarar variáveis ponteiros (constante ou não, mas segue o exemplo) é `const int * var`. Explicação:
Quem diz o asterisco fazer parte do tipo e não da variável tem razão. Pensando dessa forma ele tem que ficar próximo do tipo.
const int* var
Porém, outra forma de interpretar a variável é que ela equivale a um inteiro quando usado com asterisco, o que também é verdade. Ou seja, `int *var` significa que `*var` equivale a um `int` (constante ou não, mas preciso dessa variável não-const para o exemplo). É por isso que `*var = 10` possui o mesmo valor de atribuição do que `int var; var = 10`, ou seja, `*var` é sinônimo do l-value `var` (se var fosse um inteiro e não um ponteiro).
Além disso, outro argumento pró-proximidade da variável é que declarações de múltiplas variáveis na mesma linha precisam de múltiplos asteriscos: `const int *var1, *var2, *var3`.
Portanto, como ambos os lados estão certos, separar o asterisco de ambos não dá prioridade a nenhuma forma que o programador poderá interpretar essa decisão, seja como parte do tipo ou da variável. Cada programador com seu próprio estilo irá enxergar em `const int * var` a proximidade com `int` ou com `var` de acordo com seu próprio bias (e estará certo em sua análise).
Ergo:
qualifier type * name;
# Família Rodante
Caloni, 2019-04-29 cinema movies [up] [copy]Pablo Trapero nos entrega a experiência completa do que era uma família no tempo de nossos pais/avós. (Era, porque a família foi destroçada pelos marxistas culturais.) Todos os elementos estão no filme. As fotos inapropriadas que servirão para os mais velhos alimentarem suas memórias. O amor juvenil entre primos e as traições, que fazem rima com as declarações de amor eterno dos noivos. A matriarca e suas opiniões antiquadas, que soam familiares e por isso não conseguimos simplesmente dizer que ela está errada. Quem diria isso para a própria mãe ou avó?
Este é um road movie do começo ao fim. Depois de muito tempo sem se verem, em uma reunião a vovó recebe a notícia que sua sobrinha irá se casar e que ela foi escolhida como madrinha. Ela emocionada declara que todos irão para a festa, e ninguém consegue dizer não para a anciã próxima do fim da vida com felicidade nos olhos. Ao mesmo tempo ela sabe que não será uma viagem fácil, o que faz sua pressão subir.
A viagem feita em um trailer parte de Buenos Aires para o extremo norte do país, na província de Misiones, quase em Foz do Iguaçu, o rio à frente demarcando o limite com o território brasileiro. A paisagem inicia desértica com avestruzes em volta da estrada e vai ficando um verde vivo e ao mesmo tempo saudosista, daquelas fotos de anos 70 ou 80 de passeios pelo campo. O motorista é o orgulhoso e mal-humorado Tio Gordo (e toda família tem um tio gordo... eu tinha), que não deixa ninguém mexer em seu trailer e que olha para o cunhado com um misto entre desconfiança e desprezo.
Há a bordo um casal de primos e uma amiga. A tensão sexual vista pelos olhos de Trapero sempre é sensual ao mesmo tempo que natural. E lindo. O contraste entre as gerações é um assunto recorrente, que o filme consegue abordar simplesmente mostrando as interações entre essas pessoas e como cada uma reage aos acontecimentos da viagem.
O garoto mais novo da família acha um cachorro em um posto e o adota. Vemos a mãe dele lavando o pobre coitado dentro do vaso sanitário do trailer. A vovó, sempre com calor, reclama a viagem inteira. Quem tem pessoas mais velhas na família irá se identificar muito. Aliás, toda a viagem é a vida inteira em família resumida em um fim-de-semana.
Este é um filme que usa o naturalismo de suas situações e tem a vantagem de um diretor obcecado pelo controle da câmera, entregando o melhor de dois mundos: uma história que evoca a vida real com um filtro estilizado que torna aquela pobreza das situações de uma beleza bucólica. Nunca se torna enfadonho, sempre está preocupado em mostrar a evolução das histórias paralelas e de seus personagens. Acompanhamos oito, nove pessoas e depois de dois dias as conhecemos como se fizessem parte da família.
# OpenSSH no Windows
Caloni, 2019-04-29 [up] [copy]O Secure Shell (SSH) é um protocolo de sucesso nos unixes da vida para terminal remoto e seguro por décadas, mas no Windows nunca houve uma forma simples e protegida de abrir um terminal ou copiar arquivos. A opção é instalar um cygwin com esse componente ou tentar compilar um protocolo SSL e em cima dele o SSH. Porém, há detalhes na autenticação que estão relacionadas com o Sistema Operacional e que precisa ser feito. O OpenSSH é uma maneira de compilar tudo isso e ainda funcionar no Windows.
O software WinSCP, um client SFTP para Windows, possui um guia sobre como instalar essa opção no Windows. A partir do Windows Server 2019 e Windows 10 1809 isso não será mais necessário, pois já estará disponível entre as ferramentas opcionais instaláveis do SO (Apps > Apps & features > Manage optional features, "OpenSSH server"). Para os que ainda precisam manter o passado há uma maneira.
Se você preferir não compilar a partir dos fontes você pode baixar um pacote dos binários pelo GitHub. Basta extrair tudo para uma pasta e rodar o script PowerShell de instalação e o serviço sshd estará instalado no modo manual . O local indicado para conter os arquivos é em `C:\Program Files\OpenSSH`, conforme o tutorial do WinSCP.
Após instalado você deve abrir a porta 22 pelo firewall do Windows (há uma maneira PowerShell de fazer se tiver um Windows novo ou usar a interface mesmo se tiver um antigo). Após esse último passo tudo deverá estar funcionando, e basta criar seu par de chaves pública/privada com o `ssh-keygen.exe` e adicionar no servidor com `ssh-add.exe`, além de copiar para um arquivo chamado `authorized_keys`... enfim, está tudo no tutorial.
Menos a parte de mudar o `sshd_config`.
Como nos informa um post do Stack Overflow, é preciso comentar no arquivo `c:\programdata\ssh\ssh_config`, próximo do final, essas duas linhas:
Match Group administrators AuthorizedKeysFile __PROGRAMDATA__/ssh/administrators_authorized_keys
Para isso:
#Match Group administrators # AuthorizedKeysFile __PROGRAMDATA__/ssh/administrators_authorized_keys
Aí, sim. Reiniciar, o serviço e testar a conexão:
ssh -o UserKnownHostsFile=/dev/null -o StrictHostKeyChecking=no domain\user@host
Os programas `ssh.exe` (shell remoto) e `scp.exe` (cópia remota de arquivos) também estão disponíveis no pacote OpenSSH, mas a versão do Cygwin ou até do Git (que vem com um pacote de ferramentas básicas de Linux) funcionam.
Se seu objetivo é realizar backups remotos silenciosos e para isso você instalar um serviço que irá executar o `scp.exe` de tempos em tempos é preciso tomar cuidado com as credenciais usadas e onde estarão as chaves de criptografia. O padrão usado pelo OpenSSH no Windows é na pasta `C:\Users\Usuário\.ssh`, mas para um processo na conta de sistema esse valor deve ser diferente. No caso de um terminal executando pelo `psexec.exe` ele ficou apontando para `c:\windows\system32\.ssh`, mas para serviços rodando como `SYSTEM` é capaz que seja outro valor. Enfim, é necessário testar e verificar os resultados dos testes.
a partir dos fontes você pode baixar um pacote dos binários: https://github.com/PowerShell/Win32-OpenSSH/releases
a partir dos fontes você pode baixar um pacote dos binários pelo GitHub. Basta extrair tudo para uma pasta e rodar o script PowerShell de instalação e o serviço sshd estará instalado no modo manual : se você já usou o cygwin sabe que o nome é o mesmo
a partir dos fontes você pode baixar um pacote dos binários pelo GitHub. Basta extrair tudo para uma pasta e rodar o script PowerShell de instalação e o serviço sshd estará instalado no modo manual . O local indicado para conter os arquivos é em `C:\Program Files\OpenSSH`, conforme o tutorial do WinSCP: https://winscp.net/eng/docs/guide_windows_openssh_server
# Requiém Para Um Sonho
Caloni, 2019-04-29 cinema movies [up] [copy]Eu nunca me decepciono (pelo menos por enquanto) com Darren Aronofsky. Em "Réquiem Para Um Sonho" há essa forte mensagem anti-drogas, realizada com propriedade, com uma textura pesada e indissociável da própria natureza de um ser humano que não se valoriza. É um filme depressivo, mas que ao mesmo tempo nos faz refletir sobre nossos próprios vícios no dia-a-dia. E se você acha que é apenas contra drogas ilegais, pense de novo e responda a si mesmo: o que você faz para fugir da sua realidade?
A televisão já foi massacrada algumas vezes pelo Cinema, já perdeu até a novidade, ela e seu caráter de lavagem cerebral. Mas aqui ela é uma vilã muito caricatural, uma mistura de tudo que fascina as pessoas, principalmente as que anseiam por atenção. É um programa de TV que recebe pessoas de sucesso (pela definição do apresentador) e tem uma plateia empolgada com a existência dessa pessoa fictícia.
E apesar de viciada nesse programa de TV, a mãe de um viciado o deixa vendê-la, para logo depois pegá-la de volta, comprando em seguida. Ela é uma mãe que coloca seu filho em primeiro lugar, pois anseia pelo mínimo de atenção. Viúva e sem nada que a faça viver (suas amigas de banho de sol não contam), ao receber uma ligação de alguém que diz que ela aparecerá na TV a faz entrar em uma rígida dieta para voltar a entrar em um vestido que representa sua época áurea.
Por falar em época áurea, este filme está localizado no símbolo de sua decadência: Rhode Island, finalzinho de Nova York, que mantém seu aspecto histórico e ao mesmo tempo definha em torno do mundo se transformando. Aquelas mulheres tomando banho de sol a alguns metros da praia vira uma mistura entre saudosismo e melancolia. Este é o cenário perfeito para retratar os quatro personagens principais que sofrem disso. Seus estados de euforia são estágios temporários em busca de algo que nunca encontrarão, mas que tentam incessantemente achar através de substâncias que alteram sua percepção da realidade.
Todos sofrem, mas é na figura dessa mãe viúva que repousa todo o coração do filme. Isso porque, diferente dos outros três, essa mulher não é uma jovem que pode mudar seu destino; ela apenas aguarda pelo seu final, e entendemos sua angústia interna. Esta é uma atuação mestre de Ellen Burstyn em completo controle do descontrole de seu personagem. É a partir dela que não se torna difícil também nos colocarmos no lugar do seu filho (Jared Leto), porque por mais que estejamos presentes na vida de nossos pais (ou se você for muito jovem, seus avós) a verdade é que viver sem propósito é uma tortura constante para a existência de qualquer ser humano. Quando ela diz ao seu filho que emagrecer para aparecer na TV é o motivo dela arrumar a cama, lavar os pratos, e até sorrir, mais uma vez a ficção nos entrega a realidade dura da vida, realidade essa tão presente em nossos jovens, que não respeitam seus corpos e suas mentes.
Este é um filme que se entrega à obsessão perfeccionista de seu diretor, o que quer dizer que você pode reassisti-lo quantas vezes for e ainda encontrará detalhes novos. Note o uso gradual de lentes olho-de peixe para distorcer a vida dessa mãe, e aos poucos torná-la um programa triste e patético de TV (se não é de sua época, as TVs antigas tinham um tubo atrás e uma lente distorcida na frente). Note o uso de cores e as luzes, que vão se escurecendo, seja no figurino, na maquiagem ou nos quartos onde essas pessoas se escondem (e o melhor exemplo é a personagem de Jennifer Connelly). Note os detalhes contidos nas casas dessas pessoas, e como podemos notar a passagem do tempo através desses detalhes. Uma caixa da Sony em um canto, e onde havia dois toca-fitas usados em festinhas repousam cinco empilhados, que aparentemente não são usados mais. É o consumismo pelo consumismo, outro vício recorrente na sociedade pela busca de um significado nas coisas que é inexistente.
Sobre as cores, volto a observar a mãe. Note como seu cabelo pintado vai perdendo a força. Além da cor que desejava para ele, vermelho, ter começado laranja, as raízes brancas vão tomando conta da base conforme as estações passam e ela não é chamada para ir na TV.
O uso das câmeras subjetivas também é exemplar, pois conforme o drogado se fecha em seu mundo ele só consegue prestar atenção em si mesmo e em suas reações. O mundo se distorce perante as próprias distorções da definição de felicidade. Por isso as cenas com uma câmera presa na frente do ator fica mais frequente e representa uma pessoa fechada para o mundo, e ao mesmo tempo desesperada para sair.
Aronofsky sempre escolhe o tema de personagens que buscam a perfeição. Dessa vez a perfeição em escapar da realidade dura da vida através das drogas é um caminho sem volta. Não deixa de ser coerente. E nesse caso, impactante e inesquecível.
# Longa Jornada Noite Adentro
Caloni, 2019-04-30 cinemaqui cinema movies [up] [copy]Longa Jornada Noite Adentro possui um foco desde o início, que é justamente o título do filme: realizar um dos mais elaborados planos-sequência do cinema em 3D. Mas este não é um filme 3D, conforme anunciado em seu início. Há um momento em que, munidos de óculos 3D, devemos colocá-los, mas no meio da sessão, junto com o protagonista, e eis que assim o trabalho do diretor e roteirista Gan Bi começa a fazer algum sentido.
Mas há um problema nisso tudo para espectadores não-chineses (pelo menos no Brasil): a legenda. A não ser que você entenda mandarim, as legendas em português do Brasil estão em 3D no filme inteiro, o que nos obriga a colocar os óculos desde o início da sessão, perdendo assim a proposta do diretor. O que era para ser um trabalho de imersão e interatividade acaba virando uma experiência lastimável.
E isso nem é culpa do diretor ou de qualquer um da sua equipe, pelo menos até a metade da projeção. Este é um filme escuro, e com óculos 3D ele fica ainda mais escuro. Perdemos os detalhes da fotografia em boa parte do filme. Há um momento em que o protagonista olha por uma janela um trem surgindo à noite. Há árvores em sua frente, e as folhas criam uma espécie de disfarce para que não seja visto. Assistido com os óculos, essa cena 2D nos mostra um vulto que parece uma sombra ou reflexo do vidro. Retirei os óculos e a fotografia está correta, sendo possível ver as folhas da árvore na frente do trem. Qual dos dois filmes merece ser analisado? O que você verá no Brasil ou o que o diretor idealizou? Sinto muito, mas não sei mandarim. Tive que ver um jogo de sombras que não existe na película original.
Mas nem tudo é problema da versão brasileira, já que a partir do momento que devemos de fato usar os óculos o filme perde boa parte da imersão tridimensional. Diferente de Hugo Cabret (Scorsese, 2011), que apesar de também escuro utiliza uma paleta mais fantasiosa e cheia de luzes, as poucas luzes dessa jornada pelo meio da noite são escassas demais para conseguirmos perceber detalhes da cena. Porém, nesse momento percebemos que isso faz sentido pela proposta do filme, é aí que entra o objetivo do cineasta em torno desse trabalho que foge das fórmulas hollywoodianas.
Gan Bi nasceu na cidade de Kaili, na província de Guizhou, região centro-sul da China (que é gigante, diga-se de passagem). Conta ele que quando assistiu Stalker, de Andrei Tarkovsky, percebeu que todo aquele tédio que aprendeu acompanhando os filmes americanos não é necessário seguir. Há um enorme leque de possibilidades que ele, ainda jovem, não tinha ainda experimentado. Seu primeiro longa, Kaili Blues, se passa em sua cidade-natal. "Longa Jornada" se passa em sua província. É a história de alguém amargurado pela morte do pai, que o obriga a voltar à sua terra e relembrar que nunca conheceu a mãe.
O filme é sobre essa busca, mais interna que externa. Esse homem carrega um livro verde sobre uma história de amor. Ao começar a investigar o paradeiro da mãe ele encontra dentro do relógio de parede verde do pai uma foto antiga com o rosto de uma mulher queimado por um cigarro. Ele coloca a foto dentro do livro e começa a seguir uma mulher misteriosa com um vestido verde. Nos primeiros quinze minutos de Longa Jornada já fica claro que esta é uma narrativa movida por símbolos, muitas vezes oníricos, outras vezes temáticos.
O passeio deste homem pelo seu passado lembra os filmes noir dos investigadores e suas femmes fatales, mas nada faz muito sentido em sua busca. Estamos recebendo as informações em pedaços. O homem some e aparece em lugares que não nos foram apresentados, fala com pessoas a quem não fomos introduzidos, mas ainda assim montamos esse quebra-cabeças. Uma fala do protagonista: "sabe a diferença entre um filme e as memórias? Um filme é todo falso, já as memórias algumas são falsas, e outras não." Como saber qual é qual? Gan Bi se diverte omitindo essa informação que os americanos morreriam para ter.
O filme em 3D, o feito para ser visto com óculos, é escuro demais. Mas este é o delírio de um homem que nunca conseguiu terminar o sonho constante que tem à noite. E Cinema é a fábrica de sonhos. Tudo muito óbvio no campo simbólico. Os contornos dessa sequência estão sempre invisíveis. São as sensações que importam.
E quando menos esperamos estamos diante de um plano-sequência magistral, tecnicamente desafiador em vários momentos, que faz lembrar a cena do estádio de futebol em O Segredo dos Seus Olhos, mas que por ser um sonho remete mais claramente a Arca Russa. Porém, nenhum deles foi filmado em 3D. E é aí que está a supresinha do final. Bravo, Gan Bi. Eis um bom divertimento. Este é um filme de sensações, ainda que baratas, já que os anseios do protagonista nunca nos parecem valiosos a ponto de nos preocuparmos com eles no decorrer do filme. Em meio ao niilismo de uma busca desmotivada feita através do subjetivo do espectador da sala de cinema, voltamos ao cinema entretenimento de Hollywood. No que diferem os dois? Gan Bi tem símbolos para entreter, e 3D em locais escuros. E plano-sequência. De resto, falta motivação. E isso pelo menos os americanos têm de sobra.