# A Parte dos Anjos
Caloni, 2013-04-01 cinema movies [up] [copy]O diretor Ken Loach consegue extrair tensão nesse suposto drama britânico, como podemos constatar durante um leilão de uísque e logo antes em uma sequência noturna particularmente inspirada. Essa capacidade, no entanto, parece rivalizar com sua vontade de fazer comédia, que também funciona, mas ao preço de perdermos o gênero inicial. A leveza que ele aplica no resto da história flerta perigosamente com o seu reducionismo. Dessa forma, não é possível desenvolver melhor a relação entre o admirador de uísques e seu protegido, e o aprendizado deste é resumido em 10 segundos de uma cena dele cercado por diversos livros sobre a bebida.
Por outro lado essa mesma capacidade de síntese é bem-vinda na apresentação dos outros personagens. A primeira sequência, onde vemos Albert quase morrer na linha do trem e o corte para o juiz determinando as penas para esses pequenos delitos é eficaz em nos deixar curiosos para saber a história de quem iremos seguir, e parece ser esse um mistério que o diretor se diverte até o final dessa sequência.
Já a dinâmica do grupo que se une para aplicar um golpe baseado nos conhecimentos de Robbie (Paul Brannigan), o protagonista casual, perde justamente por se fixar unicamente no drama deste, empenhando-se para mostrar como a vida do sujeito não pode mudar de rumo caso ele não tome uma medida drástica. O roteiro de Paul Laverty nesse sentido flerta com a desonestidade ao evitar a todo o custo uma solução menos arriscada.
Ainda do ponto de vista narrativo Ken Loach entrega pistas no meio do caminho que permitem que vejamos os atos dos personagens muito antes deles acontecerem. E o pior é que não há obstáculos o suficiente para que o desenrolar saia um pouco dos trilhos. Mesmo assim acompanhamos imersos, aguardando que algo dê errado. O imprevisível aqui é que não há obstáculos previsíveis. É o suficiente para nos deixar interessados.
# Depuração na nuvem com o novo Visual Studio
Caloni, 2013-04-01 [up] [copy]Uma das novidades do futuro Visual Studio pouco comentada ainda em fóruns por seu caráter sigiloso e ainda em testes (mas que pode facilmente ser observada pela engenharia reversa dos binários do Visual C++) é a possibilidade de depurar trechos de código "na nuvem", ou seja, dentro dos gigantescos servidores de clusters de serviços de escalabilidade da Amazon, do Google e, claro, da Microsoft.
Já é conhecido que será possível inserir comentários no código-fonte com o formato @nickname e incluir na listagem de bugs o estilo das #hashtags para que programadores vinculados à sua rede social possam enxergar referências a outros programadores e verificar o Developer TrendTopics, como um #blame-joel-on-software. Porém, o que poucos sabem, é que será também possível depurar as APIs de redes sociais em tempo real. Ou seja, caso seja usado o método Twitter::Tweet(), logo após o retorno da chamada será possível aguardar por uma resposta dos usuários envolvidos:
Twitter::Tweet push ebp mov ebp, esp 000007f9`bd590000 call __internal_tweet 000007f9`bd5900ac call _checkesp 000007f9`bd5900af ... 000007f9`bd5900ff ... 000007f9`bd59015f call __internal_wait_for_replies 000007f9`bd59017f pop esp ...
Ou seja, logo será possível além de perder horas navegando em saites de rede social perder também horas depurando os comentários e respostas das pessoas nessas redes direto do Visual Studio. É a Microsoft pensando nos programadores que gostam de <del>perder tempo</del> se envolver com pessoas (ainda que virtuais) e discussões acaloradas sobre tópicos irrelevantes e absurdos (ainda que virtuais).
# Up: Altas Aventuras
Caloni, 2013-04-01 cinema movies [up] [copy]Uma produção da Pixar possui, como todo o filme, o(s) nome(s) do diretor. Contudo, a dedicação dos seus produtores e toda a equipe é tamanha que transparece o amor pelo Cinema em cada canto da tela e em cada detalhe técnico de suas produções.
É o que podemos conferir em Up!, que pega uma história até que simples, um velho viúvo deseja realizar o grande sonho de sua falecida esposa, e consegue não apenas torná-la acessivel às crianças, mas faz um apelo à criança que ainda vive dentro de nós esquecida pela agruras da vida.
Para isso a direção de arte não poupa esforços em apresentar cada elemento da vida de Carl Fredricksen remetendo à sua infância e sua vida feliz com sua amada Ellie. Não apenas isso, a própria ideia da viagem maluca de Carl já está anunciada desde o início da produção, em detalhes cada vez mais frequentes, como seu balão que simula o dirigível do seu herói, um explorador desenganado, como sua profissão de vendedor de balões. Dispensável dizer algo sobre a própria Ellie, que parece ser o grande símbolo que todos nós almejamos: a vida perfeita ao lado de alguém.
PS: como é de praxe, preciso comentar dos primeiros 15 minutos dessa produção, que de tão sucinto e dotado das maiores qualidades narrativas do audio-visual, possui, assim como Wall-E, o seu lugar no Panteão dos grandes curtas lançados dentro de um longa. Além de emocionar o mais duro dos humanos que já viveu o suficiente para entender a grande mensagem do filme: a vida é uma aventura.
# The Walking Dead - Primeira Temporada
Caloni, 2013-04-03 cinema series [up] [copy]The Walking Dead é uma trama de zumbis para forçar uma trama sobre seres humanos sobrevivendo no limite. Ele exagera demais no drama, talvez nos zumbis, mas nunca nessa premissa. Estamos acompanhando pessoas que estão tentando adaptar uma nova moral, novas regras e novas formas de viver a vida. Felizmente ou infelizmente, aos poucos eles descobrem que nada mudou muito.
Finalmente, por livre e espontânea pressão, decidi começar minha peregrinação por essa série que encanta pela dramatização do que antes era visto como piada: um apocalipse zumbi. Tive boas surpresas, principalmente na parte técnica, como a fotografia, que lembra tons de sépia e caracteriza esse ambiente sem qualquer rastro de esperança (além de conseguir se contrapor às cenas com sangue), e o som, que aposta em um em realismo inebriante ao estilizar os ruídos produzidos pelos "errantes", humanos que morreram e que ressucitaram como criaturas sedentos por carne viva (humana e animal). Já o uso de Matte Paintings -- cenários pintados ao fundo --, se em um primeiro momento exalta a solidão daquele mundo com precisão dramática, usado à exaustão revela mais sua artificialidade do que reforça a situação vivida por aquelas pessoas.
A parte dramática também começa bem. Acordamos em um hospital junto de Rick Grimes (Andrew Lincoln), um policial que foi baleado e que encontrava-se desacordado em recuperação. Já delineando os rumos da história a partir do seu melhor amigo/colega e a sua família formada por esposa e filho, acompanhamos sua peregrinação em busca de respostas e que culmina em uma Atlanta devastada e um acampamento com pouquíssimos humanos que sobrevivem de saquear os restos de comida da cidade deserta.
Aliás, quando digo "deserta", me refiro a almas. Constituindo a maior aglomeração de zumbis já vista, os errantes se misturam à paisagem como se sempre fizessem parte do asfalto cinzento e do vento podre. A maior força de The Walking Dead reside justamente nas novas relações e regras que precisam ser criadas para a sobrevivência daquelas pessoas não apenas como animais, mas como seres humanos dotados de consciência.
E embora a série se esforce em ressaltar o lado humano, seus acontecimentos seguem à risca a cartilha televisiva e soam episódicos demais, iniciando e terminando convenientemente na duração de um capítulo (como os acontecimentos em torno das duas irmãs e de um inusitado asilo). Não que esse formato prejudique a história isolada de cada evento. Sabemos o que essas pessoas têm passado durante todo o tempo, e apenas isso consegue unir suas histórias. É por isso que a câmera se fixa por tanto tempo nas duas irmãs e isso não soa invasivo ou repetitivo demais. Há um outro ritmo a seguir na história humana, e a série pontua e reacerta o relógio biológico da sociedade de forma impecável.
Porém, ainda que assuma o drama, a origem cartunesca pode ter gerado alguns percalços ao definir de qual gênero estamos falando, pois ao mostrar um ataque surpresa de zumbis as câmeras são inundadas de sangue de uma forma cômica em um momento intenso e primordialmente dramático. Esse tipo de enfoque pode prejudicar o desenvolvimento da série como narrativa orgânica ou pode nos preparar para futuros acontecimentos que desafiam nossa percepção de absurdo e bizarro.
De qualquer forma, do jeito que está, The Walking Dead ainda não disse realmente a que veio, mas promete muito.
# The Walking Dead - Segunda Temporada
Caloni, 2013-04-03 cinema series [up] [copy]Nunca se viu antes zumbis tão realistas e humanos tão inverossímeis. Não é tão difícil acreditar nos mortos-vivos, pois já vimos isso antes em inúmeras obras do que tornou um sub-gênero do terror. Porém, um grupo de humanos como esse tentando sobreviver nessa selva de carne podre (e dentes, claro) é algo inédito e inacreditável. E mesmo assim, é exatamente dessa forma que a maioria de nós vive, o que acaba não dando muitas esperanças caso o universo de George Romero realmente viesse à tona.
Baseado na criação de Frank Darabont e com a participação de inúmeros roteiristas e diretores, a segunda temporada de The Walking Dead se passa em uma fazenda que sobreviveu ao apocalipse zumbi, dando a possibilidade de dois grupos distintos interagirem: uma família tradicional e uma outra que se forjou na luta pela sobrevivência. Curiosamente o que vemos é o grupo original se despedaçando enquanto acampam no lugar mais tranquilo até agora na série. O motivo de estarem lá são as crianças: uma desaparecida (Sophia, Madison Lintz) e outra baleada (Carl, Chandler Riggs).
O ritmo é lento, se arrasta em cômodos 13 episódios. Mas esse não é o problema fundamental da série. Afinal, Breaking Bad se aproveitava do marasmo para criar sua tensão psicológica. Só que em TWD a tensão fica em suas bordas, salpicado aqui e ali com algumas cenas mais fortes. Tirando um zumbi ou outro que aparece quase sempre de repente, podemos dizer que essas pessoas estão tirando umas merecidas férias no campo depois de terem visto Atlanta se dissipar em uma fogueira de humanos. Agora é a tensão entre os humanos que cria o drama.
Sem muito o que dizer em sua narrativa além de uma possível discussão moral a respeito da lei natural do mais forte, a história se limita em usar o artifício de pessoa ferida, convenientemente inserindo um médico (Hershel, Scott Wilson). Ele, aliás, possui uma crença particularmente peculiar a respeito dos zumbis (ou errantes, como de fato chamam a criatura na série e legendada de forma errada na versão brasileira). Essa maneira atípica de encarar essas criaturas faz sentido vindo de um profissional que dedicou sua vida salvando vidas e constitui a parte que melhor sintetiza a bondade nesse mundo dos avessos.
Sem medo de repetir os mesmos conflitos e dúvidas, o novo episódio de suicídio, por exemplo, não consegue trazer à tona as mesmas reflexões da primeira temporada. Ele acaba gerando o efeito contrário, banalizando o ato, assim como a morte de maneira geral. Será que já estamos no inferno e não sabemos? Essas almas errantes em que se transformaram os humanos, talvez já esteja habitando também o mundo dos vivos.
Ou no fundo talvez tudo não passe de uma série que cresceu devido à sua popularidade e desistiu de ousar, se limitando a picotar sua história em pedacinhos de quinze minutos e esticar para além dos quarenta. Das duas teorias, espero que a primeira esteja correta assistindo à terceira temporada.
# The Walking Dead - Terceira Temporada
Caloni, 2013-04-03 cinema series [up] [copy]Se a segunda temporada de The Walking Dead é um banho de água fria que vira um melodrama quase celebrando a mediocridade de algumas novelas globais, a primeira metade da terceira temporada e alguns belos momentos da segunda metade quase que compensam a tortura de acompanhar os velhos e conhecidos episódios arrastados na mesmice.
O começo da nova trama aproveita um gancho do último episódio da trama anterior e mostra como Rick e seus seguidores evoluíram como um grupo, tomando uma prisão infestada de zumbis em questão de minutos. Ou deveria dizer andarilhos, como a imprecisa e canastrona legenda nacional dessa vez chama os mortos-vivos comedores de gente. Curiosamente agora eles não são uma democracia, mas surge uma nova forma de organização dirigida por uma pessoa que é chamada de Governador. Eles possuem armas, moradia e suprimentos e a mente de um psicopata (David Morrissey, mal escolhido) que manipula a mente e os corações de seu "povo" para atingir seus próprios objetivos. Qualquer relação com 100% das democracias populistas do nosso século será mera coincidência.
Aliás, os comentários políticos são uma boa novidade em TWD, que demorou para mostrar mais pessoas sobrevivendo ao holocausto zumbi, mas infelizmente as trata em sua maioria como os coadjuvantes sem graça do grupo principal. E apesar de dessa vez fazer as mortes valerem a pena e se tornarem mais realistas, a seleção dos que vão morrer beira o ridículo e dá razão a South Park: O Filme, colocando membros negros no grupo por três episódios apenas para matá-los sem maiores delongas. O curioso não é isso, mas um deles é alto e forte e resistiria bem mais que o atormentado líder da equipe fracote do presídio. Enquanto isso, na cidade improvisada pelo tal Governador, a fachada das casas é colorida e bonita, mas alguns quartos são escuros e feios, como o laboratório e o "aquário de zumbis". O pátio onde as lutas em torno de zumbis e as declarações hostis do Governador também seguem a mesma lógica de que o feio é escondido da aparência perfeita e inofensiva da comunidade.
Aliás, a luta fingida com zumbis sem dentes, ensinando erroneamente que são inofensivos, é mais um comentário político interessante que diz muito sobre a decisão de alguns governantes de lutar pelo desarmamento de sua população. Da mesma forma quando o primeiro zumbi adentra a cidade e as pessoas ficam atônitas e nem sabem o que fazer com uma vítima. No entanto, os inúmeros roteiristas e diretores não parecem muito entusiasmados em criar algum tipo de coesão nesses discursos. Ou eles são abafados por tantas delongas que fica difícil acompanhar uma história de tantas sutilezas. Diferente, por exemplo, da ótima sequência de Daryl falando sobre a morte de sua mãe seguido pela fala final de outro personagem que praticamente vale o episódio inteiro. São momentos como esses que fazem quase valer passar horas assistindo aos mesmos dramas.
E por falar em dramas repetidos ou personagens sem carisma, o mistério que cerca Andrea e Michonne soa batido antes mesmo de começar, pois a garota é praticamente muda. Se tentaram fazer uma relação lésbica ou foram covardes demais ou sutis demais. Eu aposto em uma amizade, daquelas que todo mundo no seriado fala: "ela salvou minha vida". No entanto, a questão nessa série é: será que irá sobrar alguém que não salvou a vida de ninguém?
Outro clichê que começa a perder sua eficácia, mesmo que usado em diversos filmes, é quando alguém desaparecido irá voltar. Sim, porque se alguém sumiu, não se sabe se morreu, então é "óbvio" que a pessoa ainda está viva. A não ser que seja uma criança (praticamente o tema da temporada anterior).
Já nos aspectos técnicos é preciso dar créditos à fotografia, que consegue oscilar harmoniosamente entre três cenários-chave: a umidade/tristeza do presídio, a fachada da cidade do Governador e a crueldade do mundo externo na floresta. No entanto, a tentativa de cartunizar através de closes de semblantes à direita ou à esquerda de uma cena é tímida e falha, porque não é essa a abordagem em geral, portanto soa deslocada. Melhor se sai a trilha sonora, mais adequada à proposta de um drama humano, sem soar óbvio ou forçado, mas acaba, assim como tudo na série, virando um recurso repetitivo justamente nos episódios que se alongam.
E essa é a grande falha de TWDS03: sua abordagem novelística e televisiva força uma duração e um número de episódios para os quais não há história suficiente. Lá pela metade da temporada a narrativa volta para seu ritmo de segunda temporada, e embora as peças do tabuleiro se mexam, é lentamente e às vezes com a lógica distorcida. O horror que o Governador quer enfrentar lá fora -- e daí o aquário de cabeças -- diz um pouco de sua instabilidade, e é por isso que ele insiste atacar o grupo, embora seja mais conveniente para o roteiro essa ação do que funciona como desenvolvimento da história e dos personagens.
Vejamos o episódio Fill Up, por exemplo, que aborda por quase uma hora a conversa entre Rick e o Governador e contém longas cenas em que ambos não falam nada por longos segundos que parecem minutos, mas nenhum dos dois consegue interpretar qualquer sentimento. Viram automaticamente duas Michonnes de barba.
Já o antepenúltimo episódio da perseguição -- e basicamente o episódio é apenas sobre isso -- é meio uma homenagem a filmes-desastre pós-apocalípticos, mas se arrasta de tal forma e é tão mal desempenhado que se torna tão enfadonho quanto a conversa entre Rick e o Governador de uma hora de duração. Isso faz lembrar que apesar dessa temporada ter várias cenas de tiroteio, nenhuma se torna emocionante. Talvez pela própria falta de carisma nos personagens ou o mais provável: os idealizadores não têm ideia de como realizar essas cenas.
Continuo torcendo para que os zumbis se tornem mais espertos que os humanos e tomem essa porcaria de planeta.
# G.I. Joe: Retaliação
Caloni, 2013-04-04 cinema movies [up] [copy]Na cena inicial de "G.I. Joe: Retaliação" (que nomezinho) o comandante de uma missão (Dwayne Johnson) que precisa adentrar uma zona militar da Coreia do Norte ao lado de uma guarita vigiada em uma quase total escuridão resolve derreter a cerca de arame e formar um círculo de fogo que provavelmente poderia ser avistado a uns dois quilômetros. Essa introdução espetacular do grupo de operações especiais secreta do governo norte-americano, os chamados G.I. Joes, é o bastante para termos certeza que nada do que aparecer diante de nós deve ser levado a sério.
Como um dos representantes do gênero "filmes baseados em brinquedos", assim como Transformers e Battleship, a saga protagonizada por bonecos de plástico e carrinhos irados da Hasbro consegue ao menos contar uma história simples com começo, (longo) meio e fim enquanto exibe no meio do caminho um conjunto de armas e veículos completamente desvinculados da realidade (meu exemplo favorito e menção honrosa é um tanque que parece querer voar). A graça da coisa reside em pensar nos seus heróis musculosos e com coragem suicida como os próprios bonecos de plástico que os inspiraram, manipulados por um garoto megalomaníaco de comercial de TV.
Nesse sentido o enredo dessa continuação se sai muitíssimo melhor que seu desprezível predecessor. Brincando com mísseis nucleares acionados por botões em maletas pessoais de líderes mundiais que se diferenciam apenas pela bandeira de cada país, isso deve fazer parte de algum padrão mundial para destruição em massa, e satélites que explodem assim que uma operação é cancelada (o que são alguns bilhões pela diversão de ver acontecer) o perfil "brincadeira de criança" do filme parece nunca querer sair da mente. O que é algo ruim caso o longa abraçasse de vez a unidimensionalidade dos seus personagens e esquecesse do drama vazio da família de ninjas e pessoas com máscara fumê. É esse delírio de grandiosidade que torna tão maçante as cenas de ação envolvendo um bando de ninjas, que se vestem com uniformes amarelo e vermelho parece que apenas para combinar com o fundo branco das montanhas geladas de algum povoado chino-japonês (bons tempos quando os ninjas eram guerreiros invisíveis). A baboseira se torna particularmente cansativa por enfatizar que a luta é pelo destino de alguém que não damos a mínima. Enquanto isso, os planos maquiavélicos do nosso garoto estirado no tapete da sala brincando de destruição do planeta se saem muito melhor, já que não precisa de drama nenhum para entreter (acho que "destruição mundial" é um tema que já costuma chamar bastante atenção).
Porém, mesmo se saindo bem em algumas sequências de ação razoavelmente eficientes somos obrigados a participar de uma tonelada de cenas descartáveis que tentam explicar mais uma vez a origem e a personalidade (inexistente) dos seus heróis, um dos maiores defeitos do original, e que acabam mais uma vez não explicando nem revelando nada de especial, por mais expositivos que sejam os diálogos (o meu "preferido" é um discurso de um velho, negro, cego, oriental e com seu cajado batendo no chão explicando toda a trama em torno da prima e de toda a família do ninja musculoso, e por algum motivo obscuro ela precisa ser prima do rapaz, e não é pelo sexo, pois nem sangue é possível ver nas lutas, por mais sangrento que seja o combate; e a explicação da caricatura de Sr. Miyagi é obviamente para nós, espectadores, os únicos que não estão sabendo de nada sobre o pano de fundo dessa família do barulho; e, particularmente, preferiria continuar não sabendo).
Nunca conseguindo se firmar como gênero por tempo o suficiente, "G. I. Joe" ao menos parece tentar enxugar bastante a história dos seus personagens, só que mesmo assim parece ter tempo demais na tela. Talvez para que um terceiro filme exista seja necessário enxugar ainda mais caso ele tenha a (fácil) pretensão de se sair melhor que "Retaliação" segundo o mesmo formato. Talvez quinze minutos e tudo já esteja resolvido (e ainda dá tempo para o garoto ir almoçar).
# Vai que dá Certo
Caloni, 2013-04-08 cinema movies [up] [copy]O filme estrelado (e escrito) em partes pelo elenco do ótimo grupo de humoristas de internet Porta dos Fundos consegue ser engraçado em diversos momentos, apesar de seu tom morno durante quase todo o filme. O sucesso do humor é em boa parte devido ao carismático grupo, que naturalmente exibe um timing cômico de fazer inveja às produções da Globo Filmes. Porém, estamos falando de um filme longa metragem, e o que justamente deixa de ser engraçado é a história criada pelos três roteiristas, que se perde depois que do golpe a um carro forte arquitetado por quatro amigos de infância (e de pobreza) e por um primo de um dos integrantes.
Surgindo como elemento unificador das piadas isoladas dos seres unidimensionais que povoam a tela, o filme perde sua singela força logo após a reviravolta principal, e sofre uma morte lenta e dolorosa ao envolver um bandido nada ameaçador e situações cada vez mais impossibilitadas de nos fazer lembrar o que estamos fazendo assistindo esse filme. A sensação é de tentarmos a todo momento descobrir se há de fato uma mensagem para nos guiarmos ou se tudo não passa de uma sequência de quadros de humor televisivo.
Nunca saberemos. Terminando de maneira esquemática, estamos presos eternamente à cornucópia de clichês. Talvez seja esse o grande motivo de dois personagens discutirem a toda hora a respeito de elementos pop do Cinema (assim como os pôsteres de filmes pendurados casualmente nas paredes mais usadas). Tudo não passa de uma brincadeira desproporcional e sem qualquer intenção de se transformar em um filme de verdade.
# Uma História de Amor e Fúria
Caloni, 2013-04-11 cinema movies [up] [copy]Um delírio técnico e estilístico que permite que vejamos nossa história como povo através da lente da dura e cruel realidade dos oprimidos, Uma História de Amor e Fúria estabelece desde o início seu tom fantasioso ao revelar a idade do narrador e protagonista envolvido em uma jornada de cerca de 600 anos através do passado e futuro do Brasil.
Tanto o "amor" quanto a "fúria" do título podem ser sentidos desde a primeira das quatro histórias em que são desenvolvidos os dois personagens principais: um guerreiro imortal da tribo Tupinambá (Selton Mello) e sua amada e sempre belamente reencarnada Janaína (Camila Pitanga). O Rio de Janeiro, palco da história, já nasce de uma luta sanguinária entre franceses e portugueses pelo poder da região. A história apenas se mostra, mas se torna óbvio que aquela sociedade nascida da opressão utiliza a mesma estrutura em qualquer momento de sua evolução tecnológica.
É uma história impactante, intensa e dona de uma triste verdade. Lembra Cabra Marcado Para Morrer pelo seu tema, que centraliza na opressão do governo (e da sociedade dominante) sobre um povo desde o começo miserável, escravo e injustiçado. Assim como "Cabra Marcado...", delineia sua história por várias gerações. Diferente deste, cria um futuro distópico que nos alerta para o que está ocorrendo nesse exato momento com a nossa sociedade (o que faz eco com outra produção recente, O Som ao Redor). Nesse mar de ideias, utiliza maravilhosamente bem a ficção científica ao mostrar um futuro com um povo alienado e sem paixão por nada. A sequência em que uma bola de futebol cai de um arranha-céu gigante para flutuar em uma espécie de bueiro ao céu aberto do lado de um grupo de crianças consegue resumir visualmente todo o sentimento estancado por décadas do nosso processo implacável de injustiça social.
Sem conter pontos específicos de nenhuma das quatro histórias, o filme se revela e se transforma na história do casal apaixonado em uma bela metáfora em busca por essa paixão perdida no tempo, assim como a esperança por dias melhores. Assim como A Viagem (Wachowski/ Tom Tykwer, 2012), a mensagem do filme não poderia ser mais clara e necessária. Por isso o seu clima de urgência.
O que nos leva às suas virtudes técnicas. Cientes da intensidade que precisam passar em uma animação que começa como um estilo quase parado e contemplativo, a edição e mixagem de som mais do que compensam. Compostos pela mesma equipe de Tropa de Elite, os sons todos juntos definem cada atmosfera através das falas e sons que se ouvem ao fundo. Enfatizam o tom emergencial ou apático pelo uso pincelado de sua trilha sonora.
E não é apenas o som que impressiona, apesar deste ser ponto forte e acertadamente levado em conta. O uso inteligente da fotografia consegue claramente estipular uma evolução, iniciando em cores quentes e naturais da selva ainda virgem, passando pela cinzenta e inebriante fumaça do progresso dos anos 70, e atingindo seu ápice em um azul que incomoda justamente pelo seu tom de sofisticação em torno de uma sociedade onde ironicamente falta água, o elemento mais básico da subsistência humana. E esse recurso sagrado é tratado como negócio e defendido pelas classes superiores assim como hoje se defende os maiores privilégios para uma casta previamente selecionada. (Note que até viagens a Marte já são possíveis, e onde a presença de água já foi comprovada, mas são usadas para o carregamento de minério.)
Dessa forma, se no começo a animação soa estranhamente estilizada, o costume dos nossos olhos e a sua sofisticação crescente a cada história faz o artifício se tornar cada vez mais necessário. Um trabalho de produção digno de nota por harmonizar esforços de tão escassos desenhistas em uma história envolvente pela própria natureza do ser humano de torcer pelo lado mais fraco.
"Meus heróis nunca tiveram uma estátua, mas morreram lutando contra os que tinham", lamenta o nosso protagonista. Não podemos culpá-lo de lutar sempre pelo lado mais fraco, se está claro que ao menos parece o lado certo.
# Um Time Show de Bola
Caloni, 2013-04-12 cinema movies [up] [copy]Um Time Show de Bola possui a grande vantagem de ser dirigido por Campanella, que consegue impregnar uma emoção desproporcionalmente divertida nas cenas "em campo", conseguindo, por ser uma animação, a fluidez completa de suas longas sequências de ação. Por outro lado, acaba sendo uma desvantagem que o controle da produção esteja nas mãos do auto-inflado e "oscarizado" diretor de O Segredo dos Seus Olhos, que adota um roteiro misto que não consegue contar bem uma única história e vira uma miscelânea de sentimentos a respeito de como o futebol atual é mais um jogo de negócios do que da paixão antiga e nostálgica.
A história, ou conto, gira em torno de Amadeo, que desde menino está apaixonado por seu "time" de pebolim e não muda até atingir a idade adulta. Uma richa de infância com um dos meninos do vilarejo onde mora gera uma rivalidade descomunal na figura de Colosso, o mega-craque milionário jogador de futebol profissional que compra a cidade inteira e a ameaça de se transformar no maior estádio do mundo.
O maior problema do filme é criar conflitos onde não existe (se Colosso estava planejando demolir o bar onde foi derrotado e pegar a mesa de pebolim para si, por que precisou mandar seus capangas irem procurá-la no lixão? E o que aquela perua estava fazendo no lixão naquele horário da noite? E... um circo?). A maior virtude é sua paixão pelo esporte-arte (as sequências de ação no campo são de tirar o fôlego) e como a direção de arte se empenha em construir cenários detalhistas e ao mesmo tempo significativos sobre o tema.
Com seus prós e contras, a animação de Campanella diverte moderadamente. Tal como um jogo de cartas marcadas que estamos acostumados a assistir hoje em dia.
# Um Crime de Mestre
Caloni, 2013-04-21 cinema movies [up] [copy]Um Crime de Mestre utiliza seus dois atores principais da melhor maneira. Anthony Hopkins, relembrado pelo título original (Fracture) que remete à mesma brincadeira metafórica do jovem clássico Silêncio dos Inocentes (Silence of the "Lambs"), estabelece um personagem frio e calculista que parece estar sempre se divertindo com seus jogos mentais e é alheio à realidade à sua volta, e ainda que cometa um crime passional logo no início o faz de forma hedionda e determinística. Já Ryan Gosling, que hoje possui em seu currículo o controverso motorista de Drive, é um advogado que se relaciona com as pessoas, mas assim como Hopkins, olha o mundo sempre do ponto de vista como ele pode servi-lo.
Quando ambos os egos se encontram em um embate mais intelectual do que emotivo, as regras do sistema judiciário americano são vitais para a compreensão do que está em jogo: o único suspeito de assassinar sua própria esposa pode sair impune caso as peças não estejam devidamente encaixadas. A impressão que é passada a quase todo momento é que o sistema legal daquele país é tão frágil, ou seus "jogadores" tão ambiciosos, que gerenciar a justiça se torna função de empresas frias e calculistas como o próprio assassino. Nesse sentido, o que o diferencia dos seus advogados?
Aliás, emoção é um tema que nunca é deixado fluir. Utilizando tons noturnos quase sempre azuis e tristes, a película como um todo é uma reflexão nada otimista sobre como a justiça pode se relativizar e consequentemente se desumanizar. Mesmo quando Gosling se apresenta como o adversário passional do jogo que se desenrola, sabemos que sua principal motivação é simplesmente sua auto-afirmação como o promotor que teve 97% de suas causas ganhas. O diretor Gregory Hoblit (As Duas Faces de Um Crime) e o roteirista Daniel Pyne (Sob o Domínio do Mal) não permitem em nenhum momento que a história descambe para o melodrama, o que pode repelir os que esperam um thriller ou algo com mais ação. No entanto, o dia-a-dia da lei não poderia estar melhor retratado que na desesperança de uma vítima que sobrevive apenas formalmente com a ajuda de máquinas.