Críticas ao Superman são comuns pelo fato do super-herói ser virtualmente invencível, sendo sua única fraqueza a sua fé na humanidade. No caso de um herói como Tony Stark, gênio, bilionário, sedutor e munido de uma armadura extremamente resistente, nem o lado humano pode ser considerada uma fraqueza. As inúmeras facetas de Tony se descascam como seus inúmeros protótipos de robôs, e a própria imagem do Homem de Ferro se apresenta como uma figura completamente destacada da pessoa que a veste ou controla à distância. Para ele seu avatar (ou avatares) são um elemento importante de sua personalidade atual, mais do que ele mesmo. E assim como no filme anterior, Homem de Ferro 2, não Os Vingadores, a jornada de Tony Stark é mais interna que externa. O vilão mais uma vez tem algo a dizer sobre o herói, mas não só ele. Se antes a história do pai era o que movia o drama no segundo filme, aqui essa relação é revista entre o gênio bilionário e um garoto (Ty Simpkins) que se revela o reflexo perfeito de sua própria imaturidade. Nesse sentido a interpretação de Robert Downey Jr. vai no automático, o que não é ruim na maioria dos momentos, mas prejudica a história em momentos-chave onde os sentimentos do personagem são postos à prova. Até onde me lembro, seu romance com Pepper Potts (Gwyneth Paltrow) era o elemento humano que deveria fazer alguma diferença em sua forma de ver a vida. Em sua terceira aventura, todos os elementos já explorados são quase inexistentes, e o que sobre é um Stark robótico até fora da armadura.
Mas divago.
O filme tem início com uma narrativa do próprio Tony Stark lamentando sobre os demônios que criamos no passado (mais um). Dessa forma conhecemos o pesquisador Aldrich Killian (Guy Pearce) que é desprezado pelo bilionário em um passado "sombrio" do futuro herói, mais uma falha grave na interpretação de Downey Jr. ao não ressaltar a mudança de seu personagem. Passa-se uma década e vemos que Aldrich se tornou um empresário que possui um projeto que interfere com o DNA humano em "tempo real", transformando pessoas com alguma deficiência física em seres com poderes especiais (é até saudável que não existam mais explicações). Se dessa vez os ataques terroristas em Boston não causaram o adiamento da estreia de Homem de Ferro 3 como aconteceu com o último Batman (mesmo que seu vilão explore esse tema) não podemos acusar os americanos de banalizarem a violência ou de se tornarem menos sensíveis com o passar do tempo. Talvez o que deva ser questionado aqui é o quão irreais os terroristas do filme são para evitar qualquer comparação com a vida real.
Dado este pequeno interlúdio, a ação de fato começa quando Mandarim (Ben Kingsley inspirado e divertido), um terrorista que no "melhor" estilo de Bin Laden manda mensagens de ódio através de transmissões televisivas, realiza um ataque que fere gravemente o ex-segurança de Stark (Jon Favreau, diretor dos primeiros dois filmes), fazendo com que ele decida se vingar e "coincidentemente" ajudar o governo norte-americano, que tenta localizá-lo. Os eventos posteriores, ainda que impactantes, não fazem parar de pensar por que isso nunca havia acontecido antes. Enfim...
Aqui e ali no meio da história são colocadas referências intrusivas dos Vingadores, como o homem que desceu do céu com um martelo ou a recorrente história dos aliens e o buraco de minhoca em Nova York, e soam mais como um pedido de desculpas pela história ignorar completamente esses acontecimentos na vida do personagem do que brincadeiras como a tradicional aparição de Stan Lee nos filmes. Aliás, seria desonesto ignorar a crise de ansiedade que acomete o herói, possivelmente um trauma do que ocorreu no filme de Joss Whedon, se não soubéssemos que esse é um artifício barato (e descartável) para tentar fragilizar o invulnerável Homem de Ferro.
Igualmente frágeis são os efeitos digitais, mas funcionam moderadamente. Já o confuso 3D, palavras praticamente sinônimas em filmes de ação, se torna mais confuso ainda com os cortes obrigatórios que evitam mostrar sangue ou violência além dos limites, uma controversa, ainda que comum, decisão dos estúdios para evitar barrar a entrada dos jovens aos cinemas, o que possui o perigoso efeito de infantilizar a ação (vide Vingadores) e impedir que nos importemos pela vida das pessoas que correm riscos. Mesmo assim a cena que envolve a queda de várias pessoas do avião é um momento particularmente tenso, mas que se desfaz rapidamente como tantas sequências com efeitos que parecem perigosamente flertar com o exibicionismo e até um certo fetichismo por parte da personalidade de Stark que o diminui como herói.
Com uma equipe respeitosamente grande de compositores a trilha sonora cria uma atmosfera quase sempre cativante ao espírito irreverente do herói e ainda consegue nos momentos-chave ensaiar acordes de uma música-tema que não se torna cansativa, ganhando o direito de figurar entre os pontos altos dos filmes de herói ao lado do Batman de Nolan (mas não ao lado do Superman de John Williams). Esse detalhe combina perfeitamente com os excelentes créditos finais que ao estilizar os personagens mereceria estar logo no início, já que acerta em cheio no tom cartunesco da história.
E por falar em créditos, ele contém uma massa gigantesca de pessoas que é a equipe de efeitos digitais, comprovando que as cenas produzidas em sua maioria dentro de computadores já conquistaram sua parcela lucrativa de fãs ainda que estas tornem a experiência nitidamente artificial (ponto para a Marvel, que com seus heróis fantasiosos não precisa se preocupar com isso). O mesmo não se pode dizer da direção de arte, que aposta em soluções muito menos sutis para revelar "surpresas" ou "segredos" trinta segundos antes de serem revelados (como um camarim no meio de uma sala que salta aos olhos do espectador).
Por fim, Tony Stark continuará sendo o mesmo Tony Stark de sempre. Talvez seja a hora, sem trocadilhos, de reciclar o personagem para algo mais ecologicamente correto (e viável): um personagem orgânico.
Obs.: Após os créditos há uma breve, mas espirituosa cena que explica a narrativa da história, e que, sim, mais uma vez remete aos Vingadores.
Um remake e uma revisita ao clássico trash da década de 80 (antes dirigido por Sam Raimi, o mesmo da trilogia Homem-Aranha), o longa de estreia de Fede Alvarez deixa a razão em segundo plano, mas por um motivo dos mais louváveis: tudo acontece tão rápido que se preocupar demais com isso tornaria a experiência intelectual demais. No fundo, queremos acreditar que tudo não passa de alucinações coletivas que logo irão se revelar uma fraude. Na verdade, rezamos por isso, pois a imersão ao horror da história é feito com tal profundidade que em determinados momentos fica difícil focalizar na tela o que está acontecendo.
A introdução rápida e eficaz mostra uma garota queimada pelo próprio pai (que logo em seguida atira em sua cabeça) em torno de pessoas que parecem pertencer a uma seita satânica. Através das palavras da que seria a feiticeira do grupo, no entanto, ficamos sabendo que o que de fato está ocorrendo é um exorcismo dos mais radicais. Esse pequeno prólogo já revela a que veio o filme, sem pudores de mostrar graficamente tudo o que acontece na tela, miolo por miolo.
Como é de praxe no gênero, algum tempo se passa e vemos o mesmo local revisitado pelo encontro de dois irmãos e seus amigos em uma cabana no meio de uma floresta de pinheiros (que é enfocada sugestivamente logo no início de cabeça pra baixo). A história principal gira em torno de Mia (Jane Levy), que resolve mais uma vez tentar se afastar das drogas que quase a levaram deste mundo. Com o apoio dos amigos, incluindo uma enfermeira, e seu até então ausente irmão (Shiloh Fernandez), o grupo tentará evitar ao máximo a saída do local antes do processo de desintoxicação que Mia precisa enfrentar.
O que não poderia ser previsto é que um livro encontrado no porão desperta o mal que até então parecia adormecido pelo ato visto no início do filme. Revemos o que parece ser a menina queimada, em uma sequência que já dá calafrios ao repassar na mente. E o que acontece em seguida merece existir simplesmente na imaginação visual dos espectadores. Ninguém deveria narrar o filme para seus amigos, pois eles deveriam ver (e ouvir) por si mesmos. Irei poupá-los também de maiores descrições.
Uma pequena virtude que torna a narrativa acima da média dos adolescentes descerebrados que não conseguem fugir de uma cabana é a sacada dos jovens tentarem fazer com que a amiga resista à sua abstinência. A partir disso, e entendendo que o que está em jogo também é a longa amizade entre aquelas pessoas, qualquer ato, por mais insano que seja, tenta ser racionalizado. Nós acompanhamos essa tentativa tão desconsolados quanto eles, pois não vemos muito mais do que todos veem. A trilha sonora brinca com o terror em nossa imaginação. Ela participa dessa tentativa de fantasiar, mas sem drama. É leve em muitos momentos tensos. Sem medo de criar algumas cenas escatológicas e outras sobre mutilação e muito sangue, com o risco de impressionar de maneira episódica, sempre somos levados de volta para a questão central: o que fazer nessa situação?
A câmera, sempre esguia e disposta a empregar enquadramentos tortos e movimentos inusitados desde o início (como a floresta invertida já citada), nos força a olhar sempre para os cantos, o que fazemos de maneira inconsciente até mesmo quando sabemos que não veremos nada. Uma técnica batida, sim, mas que funciona extraordinariamente bem aqui, onde o sobrenatural é tateado aos poucos.
Se tornando levemente mais apelativo nos momentos finais, Evil Dead prova sua força ao conduzir-nos em um pós-clímax de maneira incrivelmente eficiente, ainda que para isso force a ação dentro dos lugares mais inusitados possíveis e sob uma forte e inusitada chuva. No entanto, isso é o que torna a experiência fantasiosa mais incrivelmente sedutora. E, caso ainda sobre um sentimento de trapaça, é bom lembrar que se existisse um demônio, seria ingênuo demais pensar que ele seguiria alguma regra.
O filme diverte e é trágico. Diverte pelas sequências absurdas, mas que prendem a atenção. É trágico se pensarmos que essas pessoas estão fazendo o que podem. Não são estúpidas como na maioria dos filmes, e seu pecado menor do grupo talvez seja o ceticismo generalizado, e nem isso é indesculpável (poderia ser explicado pela razão até determinado momento chave onde as coisas fogem completamente do controle).
Talvez seja uma ilusão essa de controle. Ele pode muito bem não existir nunca. Apenas vamos nos tocamos disso aos poucos, dolorosa e lentamente.
Quanto à lógica. Se a única questão em debate seria o livro (que poderia ter sido destruído) ele se resolve sozinho. O resto não merece maiores pensamentos. É uma força oculta e que pode se materializar de diferentes formas.
As interpretações dos atores não é nada demais, mas não prejudica. No entanto, se quiser ter em mente o que assolava tanto o grupo durante todo o tempo, lembre-se da cara de Mia ao retornar da floresta. Essa é a expressão do terror que felizmente ficou do outro lado da tela (espero).
Antes de tudo, a interpretação de Thiago Mendonça é primorosa do começo ao fim ao estabelecer o "Renato" do filme não apenas como a sombra de um ídolo, mas a própria persona se construindo através de suas referências culturais. O uso de sua voz é um dos pontos fortes: usando entonações que vão aos poucos revelando o Renato Russo que os fãs conhecem, é uma surpresa agradável poder observar sua própria evolução como cantor, engrossando a voz aqui e ali, tentando encontrar o seu estilo. Isso nos aparece de forma completamente natural e discreta. A música e poesia das letras do vocalista parecem sair prontas do seu intelecto, e parte dessa experiência é devido ao interessante roteiro de Marcos Berstein (Central do Brasil) com a colaboração de Victor Atherino que vai construindo as situações e expressões de suas poesias no dia-a-dia casual.
O mesmo não pode ser dito da direção: Antonio Carlos da Fontoura (No Meio da Rua) insiste em burocratizar a história com cortes episódicos entre ação e músicas, e evita polemizar demais em torno do temperamento explosivo do protagonista. Até sua sexualidade é meio deixada de lado e prejudica a construção do personagem, ainda mais sendo um tabu na época para apenas ser citado nas entrelinhas. Mesmo assim, é admirável observar sua trajetória em direção à liderança das duas bandas que formou tamanha a naturalidade com que ela se desenvolve. Uma pena que a apresentação dos outros componentes das bandas soe tão artificial e forçadamente prolixo, chegando a usar nome e sobrenome dos que estavam à margem do cantor ("esse é o Marcelo Bonfá").
Já a participação de sua amiga sempre presente Ana (Laila Zaid) funciona para contribuir ao entrarmos mais na mente do poeta e conhecer suas angústias (como a depressão, um tema recorrente em sua discografia), e mesmo que Mendonça já carregue isso em sua expressão pesada e um jeito de andar deslocado e caótico (com a ajuda da câmera que sempre treme e procura pontos de luz que dominam vários dos seus momentos sozinhos), é importante o contraponto entre seu sucesso nos palcos e sua solidão em seu quarto. Para pontuar ainda mais o drama em que vive o multifacetado artista, a trilha sonora organizada por Carlos Trilha (que já trabalhou nos dois solos de Renato) acerta em vários momentos ao aplicar acordes icônicos de grandes sucessos da banda como forma de comentar a atmosfera de Brasília como um reflexo de um país à espera de um amanhã melhor, e o reflexo das preocupações de um vocalista punk é a melhor maneira de centralizar esse sentimento.
Parte dessa atmosfera consegue ser atingida também através da fotografia e direção de arte, que trabalham juntas para estabelecer uma Brasília pré-democracia. Se a definição da época é estabelecida com competência em uma inteligente transição entre um carro de sorvetes de uma marca antiga e um camburão da polícia militar (a despeito do letreiro que denuncia o ano despropositadamente), o resto não consegue ser pontuado facilmente, mas sentido em cada cena, uma virtude invisível da construção cuidadosa dos cenários. A fotografia nos convida aqui e ali a entrar em um mundo de tons pastéis e granulados que evocam um tom saudosista, e é compreensível que isso apenas seja feito em certos momentos, dando lugar em sua maioria a uma qualidade de imagem considerável.
Com pequenas pontes entre o Renato do filme e o Renato pessoa, não deixa de ser irônico, tráfico e catártico ouvir Renato planejar sua vida dividida em períodos de 20 anos voltados para a música, cinema e literatura, pois sabemos que isso nunca irá se concretizar, o que gera um forte sentimento de desperdício de talento com a sua morte.
E essa é a única passagem que nos remete depois do início do sucesso do Legião no primeiro show no Rio, que termina sua aventura sem definir em nenhum momento qual seria o objetivo dessa história. Assim como tem sido em biografias no Cinema Nacional, vemos imagens reais de Renato Russo e Legião Urbana junto aos créditos, que não impressionam com exceção da comparação com Thiago Mendonça, apenas comprovando sua competência em se igualar ao ícone.
Uma pena que o filme seja tão metalinguístico a ponto de terminar em um Aborto Elétrico.
Montador de Trabalhar Cansa (2011, Marco Dutra e Juliana Rojas), uma das mais agradáveis surpresas daquele ano no Cinema Nacional, Caetano Gotardo estreia na direção desse filme quase experimental. Quase, pois as nuances inseridas em suas três historietas trágicas e casuais criam uma dimensão emotiva que não pode ser ignorada. O detalhe mais marcante são as canções entoadas pelos seus próprios atores (não se preocupe quem não gosta de musicais, pois existem apenas três momentos). Nesse sentido, talvez o tempo de experiência na montagem tenha feito uma diferença notável em sua percepção da realidade (aqui a montagem é assinada por outra pessoa, não achei seu nome depois , mas a direção, montagem e até a composição das canções principais são de sua autoria).
Portanto, por mais inconsequentes e despretensiosas que sejam os três episódios, há um crescente emotivo envolvente, ainda que sua primeira história inicial pareça não se esforçar para isso. Podemos dizer que o choque inicial ao final do primeiro episódio seja o estopim necessário para que enxerguemos o que está sendo proposto, e mesmo com seus defeitos (como os diálogos pavorosos, propositais ou não) cumpre bem o que se propõe. Dito isso, ouvir a mãe cantar uma música sem rimas, sem ritmo e sem propósito nenhum a não ser estabelecer o óbvio (explicar o que ocorreu com o filho com a carga dramática de uma mãe embutida) se torna um guia necessário para entendermos o que está acontecendo diante de nós.
Ao ligar os episódios de maneira mais metafísica do que orgânica, a segunda história envolvendo outra família consegue aos poucos subir o degrau de significados. Alguns ocultos, outros parecendo mero artifício "para aparecer" e outros ainda revelando a alma do filme de maneira a fisgar cada vez mais nossa atenção. No entanto, algumas coisas ainda teimam em nos atirar para fora: mais uma vez os diálogos chegando ao embaraço, o acúmulo de cenas desconexas ou desproporcionalmente longas (que quando estão querendo dizer algo, soam óbvias, e quando não estão, soam obscuras).
Mesmo assim o diretor/roteirista insiste em sua temática, o que revela em seu terceiro ato os momentos mais tensos e propositadamente desconcertantes de todo o filme. Boa parte desse efeito pode ser atribuído à revelação do longa, Fernanda Vianna, a atriz que faz a terceira mãe. Ela quase rouba a nossa atenção completa se a situação já não nos forçasse a isso: o primeiro encontro com o filho roubado da maternidade.
Enquanto tentamos juntar as peças derrubadas pela catarse gerada pela evolução de personagens e situações, o que mais fica na mente é o tema proposto, o que há de comum naquelas histórias. Nos esquecemos do resto e, assim como o cisne do primeiro episódio, vemos o tempo passar sem muito o que fazer.
Sokurov parece sempre voltar às relações familiares, especialmente a entre mãe e filho, tão importante na Rússia. Aqui acompanhamos Alexandra, a mãe de um dos oficiais de um grupo de soldados que acampa próximo à fronteira com os eslavos. Não é um filme de guerra, mas sobre a guerra.
Alexandra passeia entre os soldados sem parecer sentir medo ou tensão, que está nos olhos de quem a vê manipular uma arma dentro de um tanque. Desde o início não é possível separar aquela personagem em um cenário tão estranho a ela da figura sempre presente no folclore: a mãe russa, que preza pelos seus filhos, um a um. Há gestos de bondade entre ela, os soldados e os "inimigos", moradores de um vilarejo que, vejam só, dependem do escambo dos próprios soldados. Mas a ironia não é o foco das lentes de Sokurov, e sim a beleza, onde quer que ela apareça. Nesse filme essa beleza se materializa por onde quer que Alexandra caminhe. Mesmo os escombros dos edifícios onde moram os sobreviventes possui sim sua beleza, uma beleza triste. Já acostumados ao lirismo de Mãe e Filho, voltamos a contemplar a beleza dos seus enquadramentos e movimentos elegantes.
Porém, diferente dos trabalhos anteriores do diretor/roteirista que analisam essa eterna relação materna, Alexandra se perde no que quer falar, e utiliza uma trilha sonora solene que, difusa, pouco revela mais do que sua própria elegância em acompanhar os momentos silenciosos, justamente aqueles que nos fazem pensar na vida. Me lembrei da sequência magistral de Felicidade, filme da diretora alemã Doris Dörrie, ainda que a trilha parece ter sido um prenúncio do que veremos em Fausto.
Sokurov encanta por sua simplicidade, embora às vezes apenas isso não baste para nossos olhos ansiosos.
Robin Williams é sempre Robin Williams. Felizmente, esse fato não é o suficiente para estragar um filme que se esforça de maneira tocante ao tentar estabelecer uma conexão entre quem assiste e o drama dos pacientes que, sem se mover por décadas, conseguem experimentar milagrosamente uma janela de normalidade.
Porém, o mais interessante é poder analisar a "normalidade" na rotina de um hospital. O próprio doutor/pesquisador (Williams) precisa abrir uma grade todo dia para vislumbrar um pedaço do sol e das pessoas comuns. A vida comum pode ser vista como uma vantagem se presa cada vez mais à rotina e convenções? Leonard (de Niro), o paciente mais perspicaz, preso por 30 anos em um corpo que envelhecia sem vivenciar, consegue descobrir mais rápido que o introspectivo e desajeitado doutor. A falta de uma vida pode ser um sintoma válido tanto na rua quanto no hospital.
Tocante em muitos momentos ingênuos, mas desnecessariamente forçado em outros, Tempo de Despertar sofre de uma leve esquizofrenia ao não decidir se quer contar um drama filosófico ou um melodrama de hospital. Mesmo assim, um filme delicioso de ver e rever com o passar dos anos. O ser humano, pelo visto, precisa de algumas doenças para se sentir vivo.